quinta-feira, 16 de junho de 2022

Vinicius Torres Freire: Juros: como salvar 2023 e 2024

Folha de S. Paulo

Não se sabe quanta atrocidade econômica ou política Bolsonaro e o centrão ainda podem aprontar com fins eleitorais

Banco Central não vai fazer guerra para levar a inflação de 2023 para 3,25%, o centro da meta —a de 2022 já foi para o vinagre faz tempo. Elevou a taxa básica de juros, a Selic, para 13,25%, que deve subir para 13,5% em agosto, talvez 13,75%, e para por aí. Afora desastres ou milagres, essa discussão é sobre ninharia.

A dúvida maior agora é saber quando a Selic começa a cair. Difícil que seja antes de meados do ano que vem. Quanto mais tarde começar a cair, pior para o crescimento de 2024. O de 2023 vai ser difícil tirar do chão, alta do PIB menor do que 1%.

Como ainda salvar alguma coisa de 2023 e evitar um PIBinho típico dos anos 2017-2019, crescimento de 1,4% ao ano em 2024?

Esqueça-se, por um momento, do risco de acidentes até fins de 2023, riscos nada pequenos.

Talvez seja possível dar uma lustrada no crescimento de curto prazo se a perspectiva de quem assumir o governo em 2023 for de longo prazo. Não é novidade, a não ser que alguém tenha um plano infalível milagroso.

O "milagre do crescimento", como Lula dizia no seu primeiro mandato, não virá tão cedo no próximo governo, seja qual for o eleito. Não se vai virar a chave e ligar imediatamente o motor de um PIB engripado porque, como muita gente imagina, até agora se não fez o óbvio e fácil.

Serão necessárias "reformas" ou reformas: no curto prazo, há soluções apenas ligeiramente diferentes para problemas muito essenciais e enormes. Quando e se o paciente estiver estabilizado, fora de risco iminente, talvez dê para inventar coisas diferentes. Agora, é como faz o pessoal de PS com paciente crítico: estabilizar.

Reformas, com ou sem aspas: estabilizar a dívida pública, consertar o sistema horroroso de impostos, conter o gasto com pessoal, projetar uma abertura comercial, dar um jeito de usar o pouquíssimo dinheiro para investimento público a fim de empurrar ("alavancar") mais investimento privado etc.

Vai ser preciso arrumar algum para reverter o maior nível e aumento de miséria em quase duas décadas, horror que vimos em 2021. Não vai ter muito mais para muito mais, ao menos na estabilização do paciente (até 2024? 2025?).

Em suma, o curto prazo dependerá da qualidade e credibilidade do projeto de longo prazo. No mais tardar, o/a eleito/a tem de dizer o que vai fazer de sério assim que ganhar a eleição.

Quanto ao curtíssimo prazo, quais os riscos? Obviedades. Não se sabe quanta atrocidade econômica ou política Bolsonaro e o poderoso centrão ainda podem aprontar com fins eleitorais (ou ditatoriais, não importa se com sucesso ou não). Por exemplo, parte da inflação que o governo deve esconder neste ano (com menos impostos sobre combustíveis) reaparece em 2023.

Mesmo sábios da economia americana não têm ideia do que vai acontecer por lá ou não são convincentes sobre suas estimativas. Quanto dura a inflação? Vai ter recessão? O aumento mais veloz da taxa de juros vai provocar crise financeira? Tudo isso bate, pelo menos, no preço do dólar. O dólar arrasta boa parte da nossa inflação para cima e para baixo.

A inflação pode cair mais se o preço das commodities e/ou o dólar ficarem mais baratos ou se a desaceleração da economia, que já começa, for maior do que a esperada. Tudo entre o improvável e o ruim.

Quando o preço do petróleo vai cair (aliás, está mais alto do que prevê e previa o BC)? Em um mundo de inflação cronicamente mais alta (ou flutuando em níveis mais altos), é possível que commodities fiquem mais baratas? Se tiver recessão mundial, pode ser. Por falar nisso, a perspectiva é ora de juros mundiais mais altos por um bom tempo.

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