O Globo
Os acordos de Brasília. A gente escuta
sobre o que tratariam e parece difícil de acreditar. Mas todo o “difícil de
acreditar” deve ser relativizado ante a existência — foi notícia — de ministros
do STF em peleja pública para que suas influências políticas prevaleçam. No
caso, para que o indicado de Jair Bolsonaro ao STJ fosse o afilhado de um em
detrimento do de outro.
Fala-se mesmo que um teria ameaçado retirar
o apoio ao presidente da República. Refiro-me a um ministro do Supremo; que
ameaçava não mais apoiar o chefe de Estado caso o escolhido fosse o desafeto
apadrinhado por outro ministro do STF. Temos: ministro de Corte constitucional
que apoia presidente da República; e ameaça lhe retirar apoio.
Afinal, levou o que queria.
Não deixa de ser façanha, ainda que
alcançada via chantagem. Bolsonaro é um traidor contumaz. Mas precisava —
precisa — daquele supremo apoio. Precisa muito mais de confrontos.
Escrevo isso a propósito de uma ideia de acordo ventilada nos últimos dias. A plantação segundo a qual os civis do Planalto, os supostos moderados, trabalhariam para convencer o TSE, a partir da futura presidência de Alexandre de Moraes, a aceitar conjunto de propostas do Ministério da Defesa para as urnas eletrônicas.
É furada. Armadilha. A História ensina.
Vide o episódio, movido a boa-fé, por meio do qual o tribunal convidou os
militares a participar da tal comissão de transparência. Ofereceu espaço, abriu
a casa, e os infiltrados de Bolsonaro, legitimados à mesa, logo subiram na
cama, de coturno, desde onde — desde dentro — aumentaram o volume dos ataques à
credibilidade do sistema eleitoral.
Não pode haver nenhum acordo. Porque, em
termos conceituais, havendo ainda alguma República, juízes não fazem acordos
com agentes políticos. E porque, em termos objetivos, havendo Brasília, já
existem elementos suficientes para saber que em Bolsonaro não se confia.
Não é de hoje que os que fazem acordo com
Bolsonaro servem a um teatro de traição em que — mui bem alimentados — aceitam
o papel de traídos. Arthur Lira nunca foi traído. O Congresso rejeitou,
soberanamente, o projeto para votação impressa. Naquela ocasião, o presidente
garantiu que, derrotada a PEC, desistiria da pregação contra a urna eletrônica.
Não desistiu. De lá para cá, acirrou a agressividade. E o que houve? A
sociedade entre Bolsonaro e Lira, lavrada na forma do orçamento secreto, só se
aperfeiçoou. (Traído foi o Parlamento.)
Não existem moderados a serviço de
Bolsonaro. Nem militares nem civis. Ou se é moderado, ou se tem poder.
Quem faz acordo com Bolsonaro ou é trouxa,
e será emboscado, ou é Lira. (Não há trouxas.) Ou trouxa, ou oportunista
radical. Já escrevi e repito: oportunistas radicais se adaptam. Sob o
bolsonarismo, para o amplo exercício do oportunismo, será preciso radicalizar.
Oportunistas radicais se radicalizam. Ciro Nogueira, por exemplo. Seria o
amortecedor. Hoje — mais poderoso que nunca — aplaude o presidente chamando
ministros do Supremo de “surdos de capa preta” e convocando novo 7 de Setembro.
Virou mola de autocrata. Um oportunista radical que se radicalizou em nome dos
negócios, sócio de Bolsonaro, gestor do orçamento secreto, senhor da Codevasf e
do FNDE.
Não à toa, atenção, a proposta de acordo,
que seria negociada por esses moderados com Moraes, vale-se da projeção do 7 de
Setembro e tem por corpo a chantagem. O TSE cederia, incorporaria as demandas
das Forças Armadas, em troca de os eventos bolsonaristas no Dia da
Independência transcorrerem sem novos ataques ao STF e às instituições
republicanas.
Chantagem.
Outrora dedicado servidor parlamentar de
Dilma Rousseff, a quem chamava de presidenta, o ora radicalizado Fábio Faria,
ministro das Comunicações, deu a letra em entrevista ao GLOBO, em 28 de julho.
Questionado sobre os ataques de Bolsonaro a ministros do Supremo e ao sistema
eleitoral, disse:
— Vai ter uma solução aí no próximo mês.
Referia-se ao acordo. Declarou crer “em uma
solução pacífica”, a ser promovida por “discussão entre o presidente do TSE e o
presidente da República”. Moraes e Bolsonaro. Que tal?
Mais adiante, questionado sobre o
presidente haver convocado apoiadores às ruas pela “última vez”, deu a senha:
— No 7 de Setembro, se tiver tudo
solucionado, o que é que tem as pessoas irem às ruas de verde e amarelo?
Se estiver tudo solucionado. Né? O que
significará, na gramática populista, estar tudo solucionado? E se não estiver?
Sabemos que não estará; ou não existiria bolsonarismo, cuja competitividade
depende do conflito. É convite a armadilha.
Faria desenha:
— O presidente se elegeu pela democracia.
Ele quer mais transparência. Esse assunto está sendo tratado. Não acredito que
vá passar de agosto. Não acredito que a gente vai ter um 7 de Setembro sem isso
resolvido.
É convite transparente a armadilha por meio
de chantagem. Ofereça a mão — e perca a cabeça.
O Caiado, governador de Goiás que o diga, estava alardeando como galinha que acaba de botar um ovo que o Estado estava com superávit, desses que ninguém sabe se é propaganda governamental, ou, de fato. O presidente limpou o cofre com a história do ICM matando a galinha de ouro e ele, coitado, deve ter engolido o sapo, que não era barbudo. Quem mandou ser simplório e bobão.
ResponderExcluirNão tem nada 'a ser resolvido'',é chantagem pura.
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