Por Cristiano Romero / Valor Econômico
Persio Arida e outros cinco economistas
lançaram um conjunto de propostas para o governo que comandará o país a partir
de 2023
A superação da crise econômica exigirá a
primazia da chamada economia política, diz Persio Arida, um dos formuladores do
Plano Real. Além da necessidade de corrigir o legado de “distorções” criadas
pelo atual governo e o Congresso, a próxima gestão terá que propor uma série de
reformas institucionais nas áreas tributária, orçamentária e administrativa,
uma agenda que demandará grande capital político. A tarefa, observa o
economista, será hercúlea e terá que ser tocada em meio a um cenário
internacional difícil.
Em coautoria com cinco economistas, Persio
lançou na sexta-feira um conjunto de propostas para o governo que o país terá a
partir de 2023, intitulado “Contribuições para um Governo Democrático e
Progressista”. No documento, os autores vão além da proposição de medidas e trazem
algo inédito: a combinação de propostas para que o país avance do ponto de
vista institucional com outras que assegurem, durante o período de ajuste, o
apoio da sociedade às reformas. A ideia é instituir “programas especiais de
gastos”, que na área social aumentariam a despesa de 0,4% do PIB para 1% do
PIB.
“O governo precisa de reformas que são absolutamente necessárias para o Brasil retomar o crescimento econômico”, disse ele ao Valor. “É sempre possível que tudo dê certo e não precise de nada e o programa de gastos especiais pode ser anunciado mais para frente”, disse.
“Estamos dando primazia a argumentos de
economia política em relação aos argumentos estritamente econômicos, o que é
uma novidade. Um governo com ímpeto político sustentado apenas pelo carisma do
governante, capaz de encaminhar com sucesso as reformas sem violar o teto de
gastos, traria efeitos imediatos positivos sobre a inflação e o crescimento. E
esses efeitos podem gerar um círculo virtuoso, dando mais credibilidade ao
governo e aumentando sua base de sustentação. A pergunta é: teremos esse
governante? Podemos nos fiar no atingimento do first best?”, questiona ele. A
seguir, os principais trechos da entrevista:
Conjuntura
internacional - Há o desafio de um cenário internacional mais difícil,
que certamente complica as coisas para o Brasil. Os bancos centrais, com
exceção do Brasil, estão muito aquém do que deveriam estar do ponto de vista do
combate à inflação. Talvez não queiram combater a inflação tanto quanto dizem
querer. Principalmente no caso dos Estados Unidos.
Polarização política - É um cenário em
que, além desses desafios, a polarização política não desaparece após as
eleições, como a situação nos Estados Unidos claramente deixa a perceber. Além
disso, uma coisa é corrigir o legado de distorções que vêm do governo
Bolsonaro. A outra coisa é como avançar.
Medidas para avançar -
Basicamente, estamos falando de uma reforma tributária, na linha da adoção de
um imposto sobre valor adicionado com uma alíquota única, com mudanças para
assegurar que a tributação seja neutra; fazer uma abertura comercial com
determinação, se necessário, de forma unilateral, em algumas áreas críticas. A
área tecnológica é um bom exemplo. É preciso mudar a política de imigração e
trabalho do Brasil, que está muito fechado. É preciso facilitar a concessão de
vistos de trabalho para estrangeiros. Outro ponto é fazer uma reforma do Estado
na direção de tornar o governo mais eficiente. É preciso fazer com os gastos
sociais voltem a ter foco. Outra medida é retomar as privatizações. Nem as
estatais criadas pela [ex-presidente] Dilma foram fechadas. A motivação correta
é você reduzir o tamanho do Estado na economia e liberar o capital público que
está nas estatais para as áreas que precisam. O Brasil vai precisar também de
um novo ordenamento fiscal, que envolve não apenas uma nova regra para gastos.
Tem um cipoal de legislação de gasto orçamentário que precisa ser simplificado.
O Brasil precisa passar por um processo de desconstitucionalização não para
mexer em princípios federativos ou em direitos e garantias fundamentais.
Detalhamento de política econômica não pode estar na Constituição.
Teto de gastos - Do ponto de vista
do controle inflacionário, é claro que o ideal é manter o teto de gastos a
ferro e fogo em 2023 e talvez 2024 para assegurar uma política fiscal
contracionista. O que me preocupa, no entanto, é muito mais uma consideração de
economia política do que de economia estritamente falando.
A questão é como assegurar que um governo
comprometido a sério com reformas politicamente difíceis - adoção do IVA,
reequilíbrio de taxação para evitar aumentar desigualdades, reforma
administrativa, abertura comercial, se necessário com redução unilateral de
tarifas, reforma do Estado, reequilíbrio do Orçamento entre o Executivo e o
Legislativo, etc. - pode se sustentar politicamente ao longo do tempo? O ideal
seria um governante comprometido com reformas modernizantes e ao mesmo tempo
carismático o suficiente para ampliar substantivamente a ‘lua de mel’ dos
primeiros meses.
No plano do ideal, esse governante só
anunciaria os programas especiais de gastos quando a redução de despesas
obrigatórias possibilitar abrigar os programas especiais dentro do teto de
gastos. Os programas especiais, de que o Brasil tanto precisa, seriam
anunciados nesse momento.
Programas especiais - Como fazer para assegurar a sustentabilidade política de um governante comprometido com as reformas? Se o ideal não se materializar, temos que pensar em uma solução 'second best' [a melhor alternativa possível]. E o 'second best' são os programas especiais. Dificilmente um novo governante reduzirá o pacote 'emergencial' do Bolsonaro, que corresponde a 0,6% do PIB. Claro que os programas sociais têm que ser melhor focalizados, mas na prática nenhum governante, acho eu, vai reduzir os gastos sociais. Ou seja: os 0,6% do PIB vão se perenizar. Nossos programas [propostos no documento ‘Contribuições para um Governo Democrático e Progressista’], no valor de 1% do PIB, na verdade acrescentam apenas 0,4% ao que prevalece hoje. No texto, deixamos claro que esse 1% tem que corresponder a cortes das despesas obrigatórias e revisão dos gastos (avaliação, metas, etc.) aprovados e cuja materialização acontecerá ao longo do tempo. E mais: teriam uma nova governança, com metas públicas e orçamento transparente, responsabilidades definidas. Seriam a marca política do novo governo. Na essência: entre o ideal preconizado pela teoria e a realidade que nos afigura mais plausível - a de uma lua de mel relativamente curta, de um governo que não preparou os detalhes das reformas durante a eleição, uma polarização que transcende o quadro eleitoral -, há que pensar nos termos da economia política e não da economia 'tout court' [sem mais nada a acrescentar].
Manter teto de gastos e cortar despesas, pra só depois fazer gastos especiais. É a mesma antiga receita do Delfim Netto: crescer primeiro o bolo pra só então distribuir... Só que a distribuição nunca chegava! Nem uma palavra sobre crescimento real do salário mínimo. Estes caras não estão preocupados com a distribuição de renda no país!
ResponderExcluirO Mais importante sempre, é o brasileiro aprender a votar é o povo que faz as mudanças necessárias. Depois de tanto fiascos esse último foi uma lição importantíssima. E o mais importante, ,para a esparrela não acontecer novamente de ter que escolher entre 2 ladroes, um cinico e o outro lelé da cuca.Nesse infortúnio estamos pagando um preço muito alto.
ResponderExcluirMuito bom o artigo.
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