O Estado de S. Paulo
O protesto da carta é mais amplo do que a defesa das eleições
Jair Bolsonaro não entendeu a natureza
política mais abrangente da carta em defesa da democracia. Assim como não
entendeu até hoje a natureza da onda disruptiva que o levou – para própria
surpresa – ao Palácio do Planalto.
O PT também não havia entendido a natureza
dos movimentos de protesto de 2013, e pagou por isso um preço alto em 2016. Em
cada uma dessas ocasiões (2013, 2016 e 2018) o solavanco foi causado por
movimentos de elites descontentes talvez consigo mesmas.
É o que está acontecendo agora. A sensação
é a de que o Brasil está se desfazendo em pedaços, sem que as eleições
sinalizem como juntar os cacos. Ao contrário: elas evidenciam o triunfo do
regionalismo. Tanto Bolsonaro como Lula se apresentam como “líderes nacionais”,
mas é só no nome.
Os dirigentes do PT, que no momento possuem uma visão mais abrangente do processo político (e seu horizonte está há tempos em 2023), entenderam que os milhares de assinaturas no texto não são endosso automático da candidatura Lula. Bolsonaro, preso à sua extraordinária limitação cognitiva, acha que se trata de evento apenas contra ele.
Aparentemente, é. O estopim para a
mobilização foi dado pelo próprio Bolsonaro e sua boçalidade autoritária.
Somada à falta de estratégia e seus fantasmas individuais, levou-o ao córner do
ringue político. De onde seu instinto belicoso o faz supor que sairá apenas
golpeando forte, em vários sentidos.
O “basta” que ele ouviu vem de segmentos de
tomada de decisão e formação de opinião cujos cinismo, oportunismo, falta de
visão de longo prazo e incapacidade de articulação ampla são, ao mesmo tempo,
causa e efeito da situação de paralisia do País. Nesse sentido, o Centrão e
suas figuras mais visíveis são sintoma e não a “razão” da nossa estagnação.
Mas a atual insatisfação não se refere
apenas ao atual governo, ainda que tivesse traído esperanças. Refere-se a um
sistema político e de governo que se tornou ainda pior e claramente menos capaz
de fornecer as respostas que a sociedade demanda, enquanto tudo parece mover-se
para ficar no mesmo lugar.
As elites descontentes defendem interesses
antagônicos, têm graus muito díspares de cosmopolitismo e posturas ideológicas
às vezes opostas. Sua principal característica em comum (consenso entre
sociólogos, antropólogos e historiadores) é a defesa de seus interesses
paroquiais, setoriais e regionais, sem ter o País ou o todo como preocupação
central.
O que existe é uma imensa frustração, da
qual a carta em defesa da democracia é uma tradução. E a falta de um caminho de
saída dela.
Vc. é D +
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