segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Alex Ribeiro - BC deve reforçar sinal conservador para o juro

Valor Econômico

Juro de mercado caiu no dia seguinte à reunião do Copom

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central deverá reagir com um tom mais duro na sua comunicação de política monetária nos pronunciamentos oficiais programados para esta semana, depois que o seu comunicado conservador da semana passada surtiu o efeito inverso do esperado nos mercados.

O colegiado procurou alertar que o trabalho para combater o surto inflacionário está longe de estar completo, que será preciso manter os juros altos por um bom tempo e que não se pode descartar a hipótese de mais aperto monetário, caso não se confirme o cenário de convergência da inflação à meta e de reancoragem da expectativas de inflação.

A nota divulgada após a reunião do Copom foi talhada para segurar as apostas do mercado em torno de uma baixa de juros já no começo do ano que vem, que vinham ocorrendo mesmo sem um cenário de queda da inflação para os objetivos estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Mas o que se viu no mercado, no dia seguinte, foi o oposto: os juros futuros caíram, intensificando a aposta numa distensão monetária prematura. Na sexta, os juros subiram, mas o movimento não teve a ver com o nosso BC, e sim com o aperto monetário feito pelo Federal Reserve (Fed).

Como a comunicação inicial não surtiu os efeitos desejados, muita gente no mercado espera que o Banco Central aumente o tom nesta semana. Nesta terça, será divulgada a ata do Copom. Na quinta, será a vez do Relatório Trimestral de Inflação, acompanhado de entrevista coletiva do presidente do BC, Roberto Campos Neto, e do diretor de política econômica do BC, Diogo Guillen.

A dúvida é se o Copom vai conseguir segurar as apostas de queda de juros apenas com a comunicação verbal. Alguns segmentos do mercado mais preocupados com o quadro inflacionário dizem que, se o comitê não aceitou pagar o preço de uma alta de juros de 0,25 ponto percentual em reunião da semana passada - em vez disso, manteve a taxa em 13,75% ao ano -, ficará mais difícil acreditar numa ameaça de endurecimento na política de juros mais adiante.

Na realidade, dois membros do Copom foram dissidentes na defesa dessa alta de juros na semana passada, os diretores Fernanda Guardado (Internacional) e Renato Gomes (Regulação). É esperado que a ata detalhe os argumentos desses dois integrantes do Copom, mostre por que eles foram vencidos e dê pistas sobre a chance de, mais adiante, haver um alinhamento de visões dos demais membros.

No entendimento de alguns especialistas ouvidos pelo Valor, a comunicação mais dura deverá fazer pouco efeito sem uma correção na retórica mais geral do colegiado, que atua na direção de reforçar as apostas nos cortes de juros, em vez de contê-las.

Um dos problemas é o alongamento do horizonte de política monetária, ou seja, do prazo em que o Copom se propõe a cumprir a meta de inflação. A sensação é que o Banco Central está adiando para as calendas o trabalho que tem que ser feito, e que ele nunca vai ser de fato feito.

Um problema é que, para prazos tão longos, as projeções de inflação são menos confiáveis. Há cerca de dez dias, o ex-presidente do Banco da Inglaterra Mervyn King disse num evento do Cato Institute, um centro de estudos de Washington, que os modelos de projeção têm o defeito estatístico de fazer a inflação convergir para a meta quando os prazos são tão longos. Ele considera que esse foi um dos fatores que fizeram os principais bancos centrais ignorarem a persistência da atual onda inflacionária que atinge o mundo todo. King disse que, nas reuniões do Banco da Inglaterra, costumava ver com ceticismo as projeções apresentadas pelos técnicos.

Outro problema que provoca descrença na promessa do Banco Central de se manter conservador são as suas baixas projeções de inflação. O Copom estima uma variação do índice de preços de 4,6% em 2023, enquanto que o consenso do mercado é de 5,01%. Raramente essa diferença de projeções foi tão grande e, na realidade, é maior do que aparenta. O Banco Central trabalha com uma alta de 9,3% nos preços administrados, enquanto que o consenso do mercado é de 5,75%. A diferença se deve ao fato de que o BC não incorporou no seu cenário a prorrogação nos cortes de impostos de combustíveis que o governo mandou no projeto de Orçamento. Se o BC usasse as mesmas premissas do mercado, sua projeção de inflação para 2023 seria provavelmente menor que 4%.

O BC estima uma inflação de 2,8% em 2024, abaixo da meta, de 3%, e bem abaixo do consenso de mercado, de 3,5%. Caso a inflação prevista pela autoridade monetária para 2023 fosse revista para baixo, incorporando uma estimativa mais realista para os preços administrados, a previsão de inflação para 2024 certamente cairia também.

Não está totalmente claro porque o Banco Central vem prevendo, de forma sistemática, inflação mais baixa do que o mercado. Em mais de uma oportunidade, Campos Neto disse que os cálculos do mercado subestimam a força dos juros para baixar a inflação. Mas, até agora, o BC não divulgou nenhum estudo mais aprofundado que apoie a sua tese. O entendimento de grande parte do mercado é que esse maior poder da política monetária já foi incorporado ao modelo de projeção do Banco Central, que é público e já esta sendo replicados pelas casas mais especializadas.

O sinal que o BC transmite com as suas baixas projeções de inflação é que o cenário para o cumprimento das metas está mais tranquilo do que o mercado supõe. Isso incentiva uma parcela dos operadores a reforçar a queda nas projeções para o juro, dentro do pressuposto de que o Banco Central vai usar essas projeções otimistas para balizar as suas decisões sobre a taxa básica. De outro lado, o mercado aumenta a inflação esperada, porque acredita que os cortes prematuros de juros vão fazer com que os índices de preços se acelerem mais.

Segundo um operador, o mercado não acredita, exatamente, que o BC deixará de fazer o que tem que ser feito. Apenas acha que fará com atraso, com maiores custos para cumprir as metas de inflação.

 

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