Valor Econômico
Juro de mercado caiu no dia seguinte à
reunião do Copom
O Comitê de Política Monetária (Copom) do
Banco Central deverá reagir com um tom mais duro na sua comunicação de política
monetária nos pronunciamentos oficiais programados para esta semana, depois que
o seu comunicado conservador da semana passada surtiu o efeito inverso do
esperado nos mercados.
O colegiado procurou alertar que o trabalho
para combater o surto inflacionário está longe de estar completo, que será
preciso manter os juros altos por um bom tempo e que não se pode descartar a
hipótese de mais aperto monetário, caso não se confirme o cenário de
convergência da inflação à meta e de reancoragem da expectativas de inflação.
A nota divulgada após a reunião do Copom foi talhada para segurar as apostas do mercado em torno de uma baixa de juros já no começo do ano que vem, que vinham ocorrendo mesmo sem um cenário de queda da inflação para os objetivos estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). Mas o que se viu no mercado, no dia seguinte, foi o oposto: os juros futuros caíram, intensificando a aposta numa distensão monetária prematura. Na sexta, os juros subiram, mas o movimento não teve a ver com o nosso BC, e sim com o aperto monetário feito pelo Federal Reserve (Fed).
Como a comunicação inicial não surtiu os
efeitos desejados, muita gente no mercado espera que o Banco Central aumente o
tom nesta semana. Nesta terça, será divulgada a ata do Copom. Na quinta, será a
vez do Relatório Trimestral de Inflação, acompanhado de entrevista coletiva do
presidente do BC, Roberto Campos Neto, e do diretor de política econômica do
BC, Diogo Guillen.
A dúvida é se o Copom vai conseguir segurar
as apostas de queda de juros apenas com a comunicação verbal. Alguns segmentos
do mercado mais preocupados com o quadro inflacionário dizem que, se o comitê
não aceitou pagar o preço de uma alta de juros de 0,25 ponto percentual em
reunião da semana passada - em vez disso, manteve a taxa em 13,75% ao ano -,
ficará mais difícil acreditar numa ameaça de endurecimento na política de juros
mais adiante.
Na realidade, dois membros do Copom foram
dissidentes na defesa dessa alta de juros na semana passada, os diretores
Fernanda Guardado (Internacional) e Renato Gomes (Regulação). É esperado que a
ata detalhe os argumentos desses dois integrantes do Copom, mostre por que eles
foram vencidos e dê pistas sobre a chance de, mais adiante, haver um
alinhamento de visões dos demais membros.
No entendimento de alguns especialistas
ouvidos pelo Valor,
a comunicação mais dura deverá fazer pouco efeito sem uma correção na retórica
mais geral do colegiado, que atua na direção de reforçar as apostas nos cortes
de juros, em vez de contê-las.
Um dos problemas é o alongamento do
horizonte de política monetária, ou seja, do prazo em que o Copom se propõe a
cumprir a meta de inflação. A sensação é que o Banco Central está adiando para
as calendas o trabalho que tem que ser feito, e que ele nunca vai ser de fato
feito.
Um problema é que, para prazos tão longos,
as projeções de inflação são menos confiáveis. Há cerca de dez dias, o
ex-presidente do Banco da Inglaterra Mervyn King disse num evento do Cato
Institute, um centro de estudos de Washington, que os modelos de projeção têm o
defeito estatístico de fazer a inflação convergir para a meta quando os prazos
são tão longos. Ele considera que esse foi um dos fatores que fizeram os
principais bancos centrais ignorarem a persistência da atual onda inflacionária
que atinge o mundo todo. King disse que, nas reuniões do Banco da Inglaterra,
costumava ver com ceticismo as projeções apresentadas pelos técnicos.
Outro problema que provoca descrença na promessa
do Banco Central de se manter conservador são as suas baixas projeções de
inflação. O Copom estima uma variação do índice de preços de 4,6% em 2023,
enquanto que o consenso do mercado é de 5,01%. Raramente essa diferença de
projeções foi tão grande e, na realidade, é maior do que aparenta. O Banco
Central trabalha com uma alta de 9,3% nos preços administrados, enquanto que o
consenso do mercado é de 5,75%. A diferença se deve ao fato de que o BC não
incorporou no seu cenário a prorrogação nos cortes de impostos de combustíveis
que o governo mandou no projeto de Orçamento. Se o BC usasse as mesmas
premissas do mercado, sua projeção de inflação para 2023 seria provavelmente
menor que 4%.
O BC estima uma inflação de 2,8% em 2024,
abaixo da meta, de 3%, e bem abaixo do consenso de mercado, de 3,5%. Caso a
inflação prevista pela autoridade monetária para 2023 fosse revista para baixo,
incorporando uma estimativa mais realista para os preços administrados, a
previsão de inflação para 2024 certamente cairia também.
Não está totalmente claro porque o Banco
Central vem prevendo, de forma sistemática, inflação mais baixa do que o
mercado. Em mais de uma oportunidade, Campos Neto disse que os cálculos do
mercado subestimam a força dos juros para baixar a inflação. Mas, até agora, o
BC não divulgou nenhum estudo mais aprofundado que apoie a sua tese. O
entendimento de grande parte do mercado é que esse maior poder da política
monetária já foi incorporado ao modelo de projeção do Banco Central, que é
público e já esta sendo replicados pelas casas mais especializadas.
O sinal que o BC transmite com as suas
baixas projeções de inflação é que o cenário para o cumprimento das metas está
mais tranquilo do que o mercado supõe. Isso incentiva uma parcela dos
operadores a reforçar a queda nas projeções para o juro, dentro do pressuposto
de que o Banco Central vai usar essas projeções otimistas para balizar as suas
decisões sobre a taxa básica. De outro lado, o mercado aumenta a inflação
esperada, porque acredita que os cortes prematuros de juros vão fazer com que
os índices de preços se acelerem mais.
Segundo um operador, o mercado não
acredita, exatamente, que o BC deixará de fazer o que tem que ser feito. Apenas
acha que fará com atraso, com maiores custos para cumprir as metas de inflação.
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