terça-feira, 4 de outubro de 2022

Andrea Jubé - Precisamos falar sobre Valdemar

Valor Econômico

Articulação do PL com Bolsonaro remonta a 2018

Fundado em 1985, em meio ao processo de abertura lenta e gradual, para abrigar quadros do PDS e do PTB, o Partido Liberal (PL) - a nona legenda do presidente Jair Bolsonaro - emergiu das urnas com números espantosos, que lhe garantiram as maiores bancadas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. O partido ainda reelegeu em primeiro turno o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, na base eleitoral da família Bolsonaro

Sob a presidência do ex-deputado Valdemar Costa, o PL conseguiu eleger 98 deputados federais e oito senadores, sendo três ex-auxiliares presidenciais: os ex-ministros Marcos Pontes (SP), e Rogério Marinho (RN), e o ex-secretário da Pesca Jorge Seif (SC). Somados aos outros seis que estão no exercício do mandato, o PL terá uma bancada de 14 senadores, a maior da Casa. Poderá concorrer à presidência do Senado, ameaçando a zona de conforto do presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que já pavimentou o caminho para a reeleição em fevereiro.

Comandar o partido do presidente da República, com chances de reeleição, e que terá as duas maiores bancadas do Congresso em 2023, é um resultado redentor para um dirigente partidário que enfrentou maus bocados na política quando o então todo-poderoso relator do Mensalão, ministro Joaquim Barbosa, o condenou a uma pena de prisão em 2012. Por isso, precisamos falar de Valdemar.

A surpreendente eleição de 98 deputados, mesmo contando com Bolsonaro como principal atração eleitoral, implica o singular faro político atribuído a Valdemar. Desde que transformou o palhaço Tiririca no deputado federal mais votado das eleições de 2010 (1,3 milhão de votos naquele pleito), Valdemar se notabilizou como o cacique partidário mais talentoso para identificar e filiar os chamados “puxadores de votos” para a legenda, uma estratégia para atingir a cláusula de barreira.

Há meses que o líder do PL, deputado Altineu Côrtes (RJ), alertava os interlocutores que o vereador de Belo Horizonte Nikolas Ferreira (PL), um fenômeno das redes sociais - uma espécie de “Janones da direita” - seria um dos mais votados em outubro. Pois ele despontou como o deputado federal mais votado do país, com 1,49 milhão de votos.

Foram duas as apostas de Valdemar para os chamados “puxadores de legenda” no pleito atual: o “influencer” das redes, como Nikolas, e os bolsonaristas, igualmente atuantes nas redes. Além do mineiro, o PL terá entre seus quadros vários campeões das urnas: a deputada reeleita Carla Zambelli, o deputado reeleito Eduardo Bolsonaro, o deputado Ricardo Salles, com mais de 640 mil votos - embora investigado pela Polícia Federal, o ex-ministro do Meio Ambiente foi o quinto mais votado do país; o deputado Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde - e investigado pela gestão desastrosa na pandemia - com mais de 200 mil votos, foi o segundo mais votado no Rio de Janeiro.

Valdemar divide com o presidente do PSD, Gilberto Kassab, a fama na classe política de que sentem de longe o cheiro do poder. Em 2002, ele articulou com o então candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva a filiação do empresário José Alencar ao PL, para concorrer à vice-presidência. O petista acumulava três derrotas presidenciais no currículo, e tinha o PL na chapa quando venceu pela primeira vez.

A consagração nas urnas com o PT, todavia, implicou Valdemar no escândalo do chamado Mensalão. Em 2005, ele renunciou ao mandato de deputado. Para preservar o PL, e garantir a cláusula de desempenho eleitoral, articulou a fusão com o Prona do falecido deputado Enéas, e fundou o Partido da República. Em 2019, o PR voltou a se chamar PL.

Quando Bolsonaro se filiou ao PL, e uma ala dos seguidores criticou a opção do presidente pelo partido comandado por Valdemar, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) foi às redes argumentar que Valdemar havia cumprido sua pena e não devia mais nada à Justiça. Os principais quadros do bolsonarismo seguiram o presidente, filiaram-se ao PL, e entregaram ao partido em retribuição mais de cinco milhões de votos.

O namoro com Bolsonaro vem de 2018, quando ambos ensaiaram uma coligação entre PSL e PL. Mas segundo interlocutores, a articulação não se concretizou porque não houve entendimento sobre as chapas e os controles dos diretórios no Rio de Janeiro, base eleitoral do presidente, e do Distrito Federal. A coligação bolsonarista em 2018 limitou-se a PSL e PRTB.

Três anos depois, Valdemar venceu a queda de braço com o ministro Ciro Nogueira, cacique do Progressistas, e filiou Bolsonaro ao PL em novembro de 2021. Nogueira enfrentou resistência interna na sigla à filiação do presidente e ao ingresso dos bolsonaristas, principalmente dos presidentes dos diretórios do Nordeste. Esse movimento contrário sequer se esboçou internamente no PL, porque Valdemar comanda a sigla com mão de ferro. Não se compra um quilo de açúcar para adoçar o cafezinho sem a assinatura do cacique.

Até o fim de semana, quando alguns institutos de pesquisa não descartavam eventual vitória de Lula no primeiro turno, os petistas comentavam que não haveria dificuldade de dialogar com Valdemar. Ao contrário de Ciro Nogueira, que se expôs em entrevistas e nas redes sociais em defesa de Bolsonaro, e desfiou críticas contra Lula e o PT, Valdemar é um túmulo. Ele não tem redes sociais pessoais, não concede entrevistas, e raramente recebe um jornalista. Não deixa de ser irônico que o principal dirigente do partido do presidente da República, e das duas maiores bancadas do Congresso a partir do ano que vem, seja avesso a uma comunicação aberta e direta com os brasileiros. Alguns aliados defendem que Valdemar repense essa postura.

A referência de Valdemar na política é o pai, Waldemar (com W) Costa Filho, o “seu Waldemar”, empresário do setor de transportes, quatro vezes prefeito de Mogi das Cruzes. Ex-secretário do governo Paulo Maluf, é egresso da Arena, PDS, e finalmente, o PL. Falecido em 2001, era reconhecido como um político habilidoso e carismático, qualidades atribuídas ao filho à quase unanimidade da classe política.

2 comentários:

  1. Não apenas eleitos
    Ricardo Salles, criminoso já condenado, ainda sendo investigado pela PF em novos crimes, quinto deputado mais votado do país...
    Eduardo Pazuello, capacho do genocida, incompetente que nem sabia o que era o SUS quando foi indicado ministro, responsável pela PIOR GESTÃO DA PANDEMIA entre todas as nações, segundo deputado mais votado no RJ.
    Quem são os eleitores destes canalhas?

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  2. Nem todos os canalhas bolsonaristas foram eleitos!
    Abraham Weintraub e seu irmão tiveram votações humilhantes, 4.000 e 1.900 votos respectivamente. Este inesquecível PIOR ex-ministro da Educação de todos os tempos e o ex-assessor do presidente tiveram votações ridículas para deputado federal por SP, insuficientes até pra vereador em cidades médias do Brasil.
    Igualmente as médicas Nise Yamaguchi (para deputada federal em SP) e Mayra Pinheiro (para deputada federal no CE), esta última conhecida como Capitã Cloroquina pela vassalagem ao genocida e pelo empenho na prescrição de remédio comprovadamente ineficaz, ambas denunciadas pela CPI da Covid, não se elegeram, mas tiveram votações razoáveis.

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