Valor Econômico
Referência internacional, Izabella Teixeira
é o melhor nome para negociação climática
Depois de anos afastada de Luiz Inácio Lula
da Silva, Marina Silva (Rede) desempenhou papel relevante na fase final da
campanha do presidente eleito. Ela trabalhou para conquistar o apoio de setores
do ambientalismo antipetistas. Alguém pode alegar que isso não tenha trazido
muitos votos, porém, dado o fato de Lula ter superado Jair Bolsonaro (PL) por
vantagem muito pequena - 2,1 milhões de eleitores, equivalentes a 1,72% dos
votos válidos -, é bom não desprezar nenhum dos apoiadores que se empenharam
pela vitória do petista no domingo.
É possível que isso pese na definição do ministério de Lula. Tão logo se divulgou o resultado da eleição, a ex-ministra Marina Silva foi mencionada pela mídia como “ministeriável” e iniciou-se debate sobre clima - assunto mais quente da área ambiental no planeta - e reestruturação do organograma do novo governo nessa área. Surgiu, por exemplo, a ideia de se criar uma espécie de superautoridade para cuidar das negociações da questão climática.
Quando presidiu o Brasil durante oito anos,
Lula foi extremamente pragmático em áreas como economia, reforma agrária,
agronegócio e meio ambiente. Nomeou Marina, símbolo do ambientalismo, para
comandar o Meio Ambiente e Roberto Rodrigues, ícone do agronegócio, para a
Agricultura. O propósito de Lula, já em 2002, era fazer um governo de
reconciliação nacional - e nos lembremos que a polarização daquela ocasião,
entre PT e PSDB, de tão respeitosa, parecia desentendimento de um casal de
namorados adolescentes.
O pragmatismo de Lula não foi replicado nos
ministérios, onde a disputa de poder se dá de maneira direta e franca porque se
tem uma coisa que a liturgia de Brasília não admite é ministro fraco, aquele
que perde a maioria das batalhas para seus vizinhos na Esplanada dos
ministérios. Ministro da Economia, por exemplo, não só precisa ser forte o
tempo todo, mas também parecer sê-lo. Ministros como Marina Silva e Roberto
Rodrigues, representantes legítimos de setores da vida nacional, permaneceram
em seus cargos enquanto o número de derrotas de suas teses não superaram o das
vitórias.
A vida de Rodrigues, liderança inconteste
do movimento cooperativista, não foi fácil no governo. Desde o início, petistas
atuaram para enfraquecer o ministro. Uma forma de fazer isso foi, na divisão
política dos cargos, apoderar-se da gestão da Embrapa, estatal vinculada à
pasta da Agricultura. Ora, para Rodrigues, não ter a estatal sob sua supervisão
era equivalente ao Ministério da Economia perder o direito de comandar a
Receita ou o Tesouro Nacional.
Nos anos em que serviu ao governo Lula, Marina
teve embates com o substituto de Rodrigues, Reinhold Stephanes, o ministro de
Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, e a chefe da Casa Civil, Dilma
Rousseff, que a pressionava para tornar o Ibama mais célere na análise dos
pedidos de licenciamento ambiental de grandes obras. Para Marina, a gota d’água
foi Lula ter entregue ao professor Mangabeira a elaboração de um plano
estratégico para a Amazônia - esta foi a razão, digamos, oficial, mas, em
Brasília, até os ipês-roxos que florescem em junho e julho sabem que o motivo
da saída de Marina tem nome (Dilma) e sobrenome (Rousseff).
Marina deixou o governo Lula em maio de
2008, depois de atuar por pouco menos de 5,5 anos como ministra do Meio
Ambiente. Com posições muitas vezes apontadas como inflexíveis, desfiliou-se do
PT e fundou o Rede. Na eleição de 2014, como vice de Eduardo Campos (PSB) e,
depois da trágica morte do político pernambucano, como candidata à Presidência,
lançou-se contra a reeleição de Dilma, o nome do PT. No segundo turno, confirmou
seu distanciamento do partido ao apoiar o então candidato do PSDB, Aécio Neves.
Lula volta ao poder 12 anos depois com
forte oposição do agronegócio. O presidente eleito perdeu para Jair Bolsonaro
nos Estados que formam o cinturão do agronegócio - que vai do Rio Grande do Sul
a Rondônia, passando por Goiás e o Distrito Federal. Na capital da República,
onde o funcionalismo, graças ao estatismo e ao corporativismo defendidos por
amplos setores do PT, sempre esteve ao lado da esquerda no plano nacional, Lula
sofreu “goleada” (Bolsonaro ficou, respectivamente, com 16 e 17 pontos
percentuais acima dos votos recebidos pelo petista).
O momento político atual é mais delicado do
que o encontrado por Lula em 2002. O país não vivia naquele momento o grau de
polarização visto agora. Bolsonaro perdeu a eleição, mas sua votação mostra que
o bolsonarismo é uma realidade.
Na área ambiental, se a ideia é radicalizar
ainda mais o clima existente no país, Marina Silva é um ótimo nome. A reedição
da polarização com o ruralismo teria nova e espetacular retomada, afirma
profundo conhecedor da cena ambiental brasileira.
Muita coisa aconteceu entre 2008 e 2022. O
destaque foi o controle do desmatamento empreendido pelo governo Dilma, sob a
liderança da então ministra Izabella Teixeira. Foi uma das poucas áreas em que
a então presidente sucedeu. Outros destaques do período foram a aprovação das
legislações do Código Florestal e do Marco Regulatório do Patrimônio Genético e
Repartição de Benefícios, ambas decorrentes de intensas negociações com vários
setores da sociedade, em especial, os empresários.
Izabella Teixeira tornou-se a maior
referência internacional relacionada às questões climáticas brasileiras e
possui credibilidade única junto ao setor produtivo nacional, justamente pela forma
como conduziu o Ministério do Meio Ambiente entre 2010 e 2016.
É plausível supor que Marina e Izabella têm espaço no novo governo Lula. A nomeação de Izabella para comandar uma Secretaria Extraordinária de Mudança Climática, ligada à Presidência da República, liberando as outras funções para o Ministério do Meio Ambiente, a ser comandado por Marina ou alguém indicado por ela, seria um arranjo que acomodaria bem os acertos políticos empreendidos por Lula na campanha do segundo turno e, o melhor, preservaria os objetivos e as expectativas de sucesso do Brasil na conferência do clima.
O meio ambiente agradece.
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