A Revolução Praieira ocorreu de 1848 a 1850 e foi motivada pelas disputas entre os praieiros e os conservadores. Os principais combates travados nessa revolução aconteceram no interior da província de Pernambuco, embora um grande ataque tenha sido liderado por Pedro Ivo contra Recife. Os praieiros saíram derrotados, e os conservadores permaneceram no poder.
Pernambuco
na década de 1840
A província de Pernambuco
vivia grandes tensões na década de 1840, fruto, sobretudo, dos
diferentes interesses econômicos, das dificuldades impostas à população mais
carente e das disputas pelo poder. Essas questões convergiram de forma a fazer
com que essa província sediasse a última rebelião provincial do Brasil no Segundo Reinado.
Nessa década, a província
de Pernambuco vivia as tensões causadas pela disputa de mão de obra, afinal, a
partir de 1845, com o início do Bill Aberdeen, a obtenção de escravos
tornou-se mais complexa, fazendo com que as próprias elites disputassem entre
si o acesso dessa mão de obra.
Além disso, havia a decadência
da economia açucareira, que afetava a economia pernambucana como um
todo, mas que no povo se refletia em maiores dificuldades, pois o custo de vida
se encarecia. Para agravar a situação, havia uma insatisfação muito forte
porque o comércio a retalho (varejo) estava nas mãos dos
estrangeiros, sobretudo de ingleses e portugueses e, frequentemente, Recife
ficava desabastecido, o que dificultava o acesso à comida.
A insatisfação popular
foi canalizada pelos interesses políticos que estavam em disputa em Pernambuco
e muitas vezes resultou em violência popular. O historiador Marcus de Carvalho
define que as classes populares pernambucanas estavam imprensadas entre o desemprego,
o latifúndio e a escravidão|1|.
Por fim, há a questão
política, o grande motivador da Revolução Praieira e que veremos com mais
detalhes.
Política
em Pernambuco
A política brasileira durante o Segundo Reinado foi uma grande disputa entre liberais e conservadores, dois grupos políticos que tinham a mesma origem social e que muitas vezes mantinham posições parecidas (como na questão da manutenção da escravidão). Os dois grupos diferenciavam-se em poucos aspectos.
Os primeiros anos do
Segundo Reinado ficaram marcados pelo revezamento desses partidos no poder.
Essa disputa acontecia no Parlamento, mas também se dava nas províncias
brasileiras e, no caso pernambucano, foi crucial para que a Revolução Praieira
acontecesse. No contexto da província de Pernambuco, essa disputa se deu entre
o Partido Praieiro e o Partido Conservador.
O Partido Praieiro surgiu
como uma dissidência nascida no interior do Partido Liberal por causa da
influência que a família Cavalcanti tinha entre liberais e conservadores em
Pernambuco. O Partido Praieiro levou esse nome porque os seus membros se
reuniam em um jornal que publicava as ideias deles: o Diário Novo,
localizado em Recife, na Rua da Praia.
Essa disputa dos
praieiros contra os conservadores, sobretudo como oposição aos Cavalcanti,
ganhou um novo contorno a partir de 1845. Nesse ano, o gabinete ministerial
passou para as mãos dos liberais, e os praieiros, aproveitando-se da sua
proximidade com um dos nomes que formavam o gabinete – Aureliano de Souza
Coutinho –, conseguiram a nomeação de Antônio Pinto Chichorro para
a presidência da província.
A partir daí, os
praieiros começaram a realizar uma série de intervenções, que
tinham como objetivo entregar cargos de influência da província para pessoas
que os apoiassem. Assim, diversas pessoas que tinham ligações com os Cavalcanti
e com os conservadores começaram a ser desligadas de seus cargos, e praieiros
foram nomeados no lugar.
A ação dos praieiros para
destituir os aliados dos conservadores resultou na demissão de cerca de
650 pessoas de cargos como os de delegados e outras funções
importantes no interior da Polícia Civil e da Guarda Nacional, por exemplo. Aliados dos
praieiros do campo e das cidades começaram a ocupar esses lugares.
Além disso, os praieiros
começaram a desarmar os aliados dos conservadores. Isso se explica
porque, quando os conservadores estavam à frente da província, seus aliados que
ocupavam cargos na polícia e na Guarda Nacional recebiam armas do governo
pernambucano. Os praieiros se aproveitaram que a força policial estava em suas
mãos agora para desarmar os conservadores.
Assim, autoridades
praieiras começaram a invadir propriedades de conservadores e
aliados dos Cavalcanti para apreender armas do Estado, prender criminosos que
se escondiam nesses locais e capturar escravos que tinham sido furtados de
outros engenhos. Isso começou a gerar pequenos conflitos, uma vez que aqueles
que tinham suas propriedades invadidas começaram a se defender.
Além disso, os
conservadores e aliados dos Cavalcanti começaram a se utilizar de jornais
locais para denunciar a ação dos praieiros, principalmente porque essas
ações só eram realizadas nas propriedades de opositores dos praieiros.
Na questão popular, os
praieiros começaram a organizar eventos públicos com uma retórica mais
popular e que fazia uma grande defesa da nacionalização do comércio a
retalho, isto é, do comércio a varejo. Na época, essa atividade era dominada
por portugueses e ingleses, e a população recifense, insatisfeita com o alto
desemprego e com o encarecimento do custo de vida, viu nessa questão uma
solução imediata para os seus problemas.
Os praieiros chegaram a
levar essa pauta para a Câmara dos Deputados, e essa questão do comércio a
retalho começou a radicalizar a população recifense contra os
estrangeiros. Tanto que, entre 1845 e 1848, foram comuns ataques da população
contra estrangeiros e suas lojas. Esses ataques receberam o nome de “mata-marinheiros”
e, no mata-marinheiro de julho de 1848, cinco portugueses morreram espancados|2|.
Estopim
da Revolução Praieira
Podemos perceber,
portanto, que havia um cenário explosivo em Pernambuco. As disputas intraoligárquicas
estavam com contornos bastante violentos, e a população urbana de Recife estava
sendo radicalizada por conta de sua insatisfação com o custo de vida e a falta
de empregos (causada em grande parte pelos próprios praieiros). Essa situação
saiu do controle quando uma reviravolta política aconteceu.
No começo de 1848, os
liberais perderam o controle do gabinete ministerial, sendo substituídos pelos
conservadores. Isso fez com que os conservadores recuperassem o poder
na província de Pernambuco e, então, deram
início à sua vingança. Os praieiros que haviam sido nomeados para a
Polícia Civil e a Guarda Nacional de 1845 em diante começaram a ser demitidos.
Os conservadores
realizaram o mesmo que haviam sofrido: demissões de seus opositores, nomeações
de aliados e o desarmamento dos praieiros. Entretanto, os praieiros
começaram a resistir às ações dos conservadores. Marcus de Carvalho
fala que cerca de 40 proprietários rurais ligados aos praieiros não
aceitaram entregar os seus cargos e nem a devolver as suas armas|3|.
Os historiadores
consideram que a Revolução Praieira se iniciou quando um dono de engenhos
chamado Manoel Pereira de Moraes reagiu à tentativa de tropas
dos conservadores de desarmá-lo. Os principais conflitos entre praieiros e
conservadores espalharam-se por toda a província de Pernambuco e estenderam-se
de novembro de 1848 a fevereiro de 1849, embora conflitos localizados tenham
acontecido na província até 1850.
Um dos nomes mais
importantes do Partido Praieiro foi Pedro Ivo, um arrendatário que
esteve à frente de um grupo de populares que moravam no interior de Pernambuco.
Ele liderava 1600 homens e atraiu forças do Exército para o interior e, logo em
seguida, levou os seus homens para a capital, Recife.
Em Recife eles
encontraram a cidade protegida por tropas da Guarda Nacional. Iniciou-se,
então, uma batalha que durou 12 horas e resultou na morte de
200 dos homens que formavam a tropa de Pedro Ivo. Do lado da Guarda Nacional,
houve cerca de 90 mortos|4|. Nessa batalha, um dos nomes mais
expressivos dos praieiros morreu: o deputado Nunes Machado. Esse
ataque aconteceu em 2 de fevereiro de 1849 e a derrota praieira enfraqueceu
severamente o movimento.
Enquanto os combates
ainda aconteciam no interior de Pernambuco, um nome expressivo na província
aderiu à luta dos praieiros. Borges da Fonseca era
um liberal radical que, durante os anos de governo dos praieiros, tinha sido
perseguido e preso, mas com o início do conflito, viu nele uma possibilidade de
realizar uma transformação na província.
Borges da Fonseca
representou o lado nativista e com maior apelo popular da Revolução Praieira.
Esse liberal escreveu um manifesto, que foi apoiado por muitos senhores de
engenho defensores dos praieiros. Esse manifesto ficou conhecido como Manifesto
ao Mundo e trazia algumas reivindicações que ecoavam ideias
manifestadas pelas classes populares europeias e que eram muito influenciadas
pelo socialismo utópico.
O Manifesto de Borges da
Fonseca continha as seguintes exigências:
1. voto livre e
universal;
2. liberdade de imprensa;
3. trabalho como garantia
de vida dos brasileiros;
4. nacionalização do
comércio a retalho;
5. independência dos
poderes;
6. extinção do Poder
Moderador;
7. implantação do
federalismo;
8. reforma do Judiciário;
9. fim do recrutamento
militar;
10. fim da lei de juro
convencional.
Desfecho
Depois que Nunes Machado
morreu, Borges da Fonseca seguiu na liderança do movimento. A luta seguiu no
interior de Pernambuco (na região da Zona da Mata) por meio de uma guerrilha e
só foi contida definitivamente em 1850. Grande parte dos senhores de engenho
que se envolveram na luta recebeu anistia.
A Revolução Praieira foi
a última rebelião de caráter liberal no Nordeste e marcou também a
derrocada dos liberais. Com sua reputação manchada pelo envolvimento na luta em
Pernambuco, esse partido só retomou o poder no Parlamento em 1864.
Notas
|1| CARVALHO, Marcus de.
Insurreição praieira. In.: FIGUEIREDO, Luciano (org.). História do Brasil para
ocupados. Rio de Janeiro: Casa da Palavra, 2013, p. 336.
|2| Idem, p. 337.
|3| CARVALHO, Marcus de.
Os nomes da Revolução: lideranças populares na Insurreição Praieira, Recife,
1848-1849. Para acessar, clique aqui.
|4| CARVALHO, Marcus de. A Insurreição Praieira. Para acessar, clique aqui.
*Daniel Neves, professor de História
A História do Brasil é desconhecida,devia ter mais filmes abordando o tema.
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