domingo, 6 de novembro de 2022

Vinicius Torres Freire - O dinheiro grande e Lula 3

Folha de S. Paulo

Governo pode dar certo até por motivos alheios à vontade do PT, segundo financistas

A finança está otimista com Lula 3. Essa opinião ainda mal aparece na principal pesquisa de intenção de voto dos mercados, que são o preço dos ativos financeiros (juros, dólar, Bolsa etc.). Nem seria razoável que aparecesse: a eleição acabou faz uma semana. Mas a boa vontade, notável no ano eleitoral, continua.

Essa opinião transparece na conversa com meia dúzia de administradores de dinheiro grosso e economistas e executivos de banco. Esse otimismo cauteloso é motivado por cinco restrições ou possibilidades que podem orientar um governo Lula 3.

Para resumir, são eles: 1) "emparedamento"; 2) "fato consumado"; 3) virada externa; 4) potencial do PIB; 5) conjuntura.

O efeito "emparedamento" viria da conjuntura política, do resultado da eleição em particular. Lula seria, em princípio, minoritário no Congresso e teria uma coalizão mais precária, que não vai se sujeitar a petismos mais extremos também na economia. Mais do que acordos no Congresso, Lula teria de fazer alianças sociais e com quadros de centro, de modo a firmar seu governo.

O efeito "fato consumado" dificultaria a reversão de mudanças institucionais, "reformas", que tornaram a economia menos disfuncional.

Além de difícil, seria desperdício de capital político tentar desfazer a reforma trabalhista, ao menos no que diz respeito à redução de custos do trabalho. Do mesmo modo, não vale a pena bulir com a entrada do setor privado em saneamento, no setor elétrico, em óleo e gás, ferrovias, aeroportos etc. A redução progressiva dos juros subsidiados na banca pública, entre outros fatores, ajudou a ampliar o mercado de capitais. Seria melhor deixar tudo isso quieto, aproveitar os ganhos e dedicar esforços a alguma outra intervenção.

A "virada externa" deriva da crença na capacidade de Lula melhorar a imagem do Brasil no exterior, com efeitos muito objetivos também na economia. O governo da era de trevas (2018-22), de isolamento, instabilidade e destruição ambiental, afastou investidores, não apenas os diretamente comprometidos com a causa do clima. Esse dinheiro deve voltar. Há gente animada com o programa de transição verde e digital anunciado por Lula na campanha, o que pode multiplicar o efeito da "virada externa".

O efeito "potencial" diz respeito à revisão da perspectiva de crescimento (aumento do "PIB potencial"). Reformas feitas a partir de 2016 teriam aumentado a capacidade da economia de crescer sem desequilíbrios tais como inflação e déficit externo excessivo.

O assunto está "sub judice", em debate, e o PIB potencial ainda seria de no máximo 2%, medíocre. Mas há certa animação a respeito.

Relacionado ao efeito "potencial", há a conjuntura doméstica mais favorável do que se imaginava em 2021. O PIB deste 2022 deve crescer 2,8%. PIB maior, commodities caras e inflação engordaram a receita de impostos. Tudo isso conteve o tamanho relativo da dívida pública. Juros altos, saldo comercial grande e investimento externo contribuíram para valorizar o real neste ano e deram perspectiva mais benigna para a inflação, situação rara no mundo.

Sim, a taxa de juros será horrível até fins de 2023. Sem solução para o problema fiscal (gasto e dívida), pode até aumentar, um prenúncio de desastre. Sem reformas adicionais, o potencial de crescimento não aumenta.

Mas, apesar de uma década de ruína, as condições de sair da lama melhoraram um tico; a conjuntura social e política pode levar Lula a agir "corretamente", na visão da finança.

Esse cenário não é unânime, tem buracos, é sujeito a trovoadas e tem um tanto de pensamento desejante. Mas, para variar, por hoje vamos ficar no otimismo.

 

2 comentários:

  1. "O governo da era de trevas (2018-22), de isolamento, instabilidade e destruição ambiental, afastou investidores"! O colunista resume bem o DESgoverno do GENOCIDA!

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