Valor Econômico
Presidente deixa armadilhas difíceis de
superar
Há semanas em que se passam décadas, diz
uma frase atribuída a Lenin, e portanto, na falta de 15 dias para o fim da
administração federal atual, seria a princípio prematuro fazer um balanço do
que representou a passagem de Jair Bolsonaro pelo poder. Os acontecimentos dos
últimos dias, contudo, vão na direção contrária. O governo acabou.
O bolsonarismo e Bolsonaro seguem
politicamente vivos e capazes de interferir no destino brasileiro, percebe-se
nas redes sociais, nas portas dos quartéis e nos autos do inquérito de
atividades antidemocráticas, em relação ao qual a operação deflagrada nesta
quinta-feira por ordem do ministro Alexandre de Moraes foi um marco, mas a
gestão iniciada em 1 de janeiro de 2019 deixou de existir.
O sinal mais evidente nesta direção é a possibilidade de se usar a PEC da Transição para pagar despesas do ano em curso, chancelada pelo Senado. Ou seja, o resíduo do Orçamento deste ano está sendo tratado pelos hierarcas do Congresso com os articuladores do presidente eleito. Lula já pauta o Legislativo, como se pode constatar também pela aprovação das mudanças da Lei de Estatais na Câmara.
Para coroar a sensação de fim antecipado,
um caminhão de mudança entrou ontem no Palácio da Alvorada.
O fato de ser um governo que acabou antes
de terminar, portanto, já é uma das principais peculiaridades da passagem de
Bolsonaro pela Presidência. O presidente foi eleito por ser uma personalidade
antissistema, pela retórica moralista e contra a corrupção e por um conjunto de
valores ultraconservadores e excludentes.
Sai da mesma maneira, em guerra com metade
do país e sem construir nenhuma política pública, depois de desorganizar e
destruir várias. Seu principal legado é a degradação das instituições. Do ponto
de vista da solidez democrática, o Brasil caminhou em direção ao Peru, e não ao
Reino Unido.
“Começou à deriva e consolidou-se como o
presidente do cercadinho”, resumiu Marco Antônio Teixeira, professor de gestão
pública na FGV de São Paulo. Com uma sombra de dúvida se Bolsonaro tem controle
sobre a plateia do cercadinho ou não.
As cenas de pistolagem envolvendo aliados
seus como o dirigente do PTB Roberto Jefferson e a deputada federal Carla
Zambelli, na antessala do segundo turno, deixam margem a incertezas. O
presidente conseguiria parar a baderna que provocou agora? O laconismo do
presidente desde a eleição, possível mistura de medo de cadeia com estratégia,
não permite a resposta.
Bolsonaro aprovou uma reforma da
Previdência expressiva, logo no primeiro ano de seu mandato, tomando o cuidado
de preservar a área militar dos ajustes feitos aos paisanos. É seu maior feito,
mas com certeza não será por isso que ele será lembrado. O presidente deixou
várias bombas para o seu sucessor. Conforme disse o cientista político Fernando
Limongi em conversa com esta coluna, “Bolsonaro não foi capaz de organizar um
golpe, o que não significa que as consequências de seu governo calamitoso sejam
pequenas ou fáceis de serem superadas”.
Uma das destruições é a desestruturação da
máquina do Estado. O governo federal cortou recursos para diversas atividades
essenciais, até mesmo a conclusão do censo demográfico, sendo que ao mesmo
tempo alterou a legislação para criar benefícios sociais em período eleitoral,
quebrando a paridade de armas da campanha. Com esta chancela, criou uma miríade
de benesses a grupos da sociedade. Gerou demandas reprimidas em várias áreas da
administração, cujo atendimento pleno implodirá por completo as âncoras
fiscais.
Outra armadilha para a Nação foi recolocar
no centro do tabuleiro as Forças Armadas, imersas em um clima de salvacionismo
político e agressividade. O presidente criou uma situação em que posicionou os
militares em confronto direto com o Judiciário, primeiro com a gestão da
pandemia de covid-19 e depois com o próprio sistema eleitoral, em uma disputa
da farda com a toga que tornou a possibilidade de um golpe um cenário a ser
considerado.
A terceira cilada é a hipertrofia do poder
Legislativo, consubstanciada no advento do Orçamento Secreto, mas que não se
resume a ele. Bolsonaro elegeu-se por uma sigla nanica, passou dois anos do
mandato sem partido e paulatinamente foi cedendo para blindar-se contra um impeachment.
Exerceu um truque: vetava uma proposição e
assistia placidamente ao Congresso derrubar seus vetos, editava uma medida
provisória e desinteressava-se do destino dela. Deste modo marcava pontos com a
sua arquibancada sem se comprometer com o parlamento. Conforme constatou o
cientista político Humberto Dantas, Bolsonaro foi o presidente que teve o menor
índice de conversão de medidas provisórias em lei, a contar do fim do primeiro
mandato de Lula, época em que as medidas provisórias ganharam seu desenho
atual. No segundo mandato de Lula, 83% das MPs tornaram-se leis. Este
percentual foi de 74% e 76% nas gestões de Dilma Rousseff. No governo Temer o
índice recuou para 58%. Na era Bolsonaro, dados compilados até setembro, caiu
para 54% a parcela das MPs aprovadas. “Ele apanhou do Congresso, do Judiciário,
que tolheu diversas iniciativas dele, e das urnas, com uma derrota inédita.
Em 17 de março de 2019, Bolsonaro jantou em Washington com lideranças conservadoras. Na ocasião, afirmou o seguinte: “O Brasil não é um terreno aberto onde nós pretendemos construir coisas para o nosso povo. Nós temos é que desconstruir muita coisa. Desfazer muita coisa. Para depois nós começarmos a fazer. Que eu sirva para que, pelo menos, possa ser um ponto de inflexão.” Com menos de três meses de governo, Bolsonaro fez uma afirmação que de certo modo sintetizaria sua gestão, se ele terminasse em “desfazer muita coisa”. O presidente gosta muito de citar versículos da Bíblia. Sempre cita João 8:32, “conhecereis a verdade e ela vos libertará”. Há um outro trecho, este do Antigo Testamento, ao qual o seu período no governo remete, que é provérbios 11:29: “Aquele que perturba a sua própria casa herdará o vento”.
"O governo acabou"? A frase está INCOMPLETA! Leia-se:
ResponderExcluirO DESgoverno Bolsonaro acabou com a população brasileira! O GENOCIDA atingiu boa parte do que queria: DESTRUIR, deixar morrer, matar, bagunçar a legislação, espalhar armas e mentiras por todos os cantos e todos os dias! Seus milicianos criminosos ainda estão na frente dos quartéis implorando por um GOLPE...
" O presidente foi eleito por ser uma personalidade antissistema, pela retórica moralista e contra a corrupção e por um conjunto de valores ultraconservadores e excludentes"
ResponderExcluirConseguiu enganar muitos de q era tudo isso. Alguns perceberam o engodo. Outros continuam sendo enganados e são conhecidos como O GADO. Acreditam em ETs, na honestidade do homem dos 100 imóveis, na Bíblia com ouro, q nunca houve rachadinha...
Gado é gado.
"Sai da mesma maneira, em guerra com metade do país e sem construir nenhuma política pública, depois de desorganizar e destruir várias. Seu principal legado é a degradação das instituições"
ResponderExcluirO genocida deixa herança maldita, de fato. Escombros em todo lugar. Torrou o dinheiro pra se reeleger e ... PERDEU!
O palerma é ruim demais.
"Outra armadilha para a Nação foi recolocar no centro do tabuleiro as Forças Armadas, imersas em um clima de salvacionismo político e agressividade."
ResponderExcluirVerdade. Impressiona a facilidade com q as FA foram cooptadas. Foi baratíssimo pro genocida e caríssimo pros milicos. O primeiro ficou com fama de Durão e os segundos, humilhados, ficaram com fama de golpistas e inconfiáveis e incompetentes (o pazzuelo e os 79 mil milicos com auxilio não me deixam mentir).