Valor Econômico
Papéis atrelados à Selic na dívida ganham
espaço
Para fontes oficiais da área econômica, a
aprovação da PEC da Transição, também conhecida como PEC da Gastança, autoriza
o governo eleito a gastar até R$ 145 bilhões acima do teto mais cerca de R$
24,6 bilhões de recursos esquecidos, pelos trabalhadores, nas contas do
PIS/Pasep que poderão ser utilizados. Perfazendo, portanto, uma licença para
aumentar a despesa pública em até R$ 169 bilhões em 2023.
O valor adicional do gasto que a PEC autoriza representa um aumento do endividamento público, que sairia dos 73,7% estimados para este ano para algo como 81,8% do PIB, segundo uma simulação feita pelos técnicos do Tesouro Nacional considerando que a elevação do teto em R$ 145 bilhões será mantida nos anos de 2025 e 2026. Já a partir de 2024 se espera que esteja em vigor uma nova âncora fiscal, que venha a substituir a lei do teto do gasto público.
Em um cenário traçado com base nas
premissas macroeconômicas da pesquisa Focus, do Banco Central, a evolução da
dívida bruta do governo geral é bem pior. Ela apresentaria trajetória
ascendente em todo o período, atingindo 90,4% do PIB em 2031.
A PEC estabeleceu, ainda, que até agosto do
próximo ano o governo terá que enviar um projeto de lei complementar para o
Congresso com o redesenho de uma regra fiscal que institua um novo regime no
lugar do teto.
Trata-se, portanto, de um aumento
considerável da dívida bruta do governo geral, de algo como 7,8 pontos
percentuais do PIB, dado que parte de quase 74% do PIB para 81,8% do PIB de
2022 para 2026. Isso coloca o Brasil completamente fora dos padrões de
endividamento dos países emergentes, cuja média está em 64,4%.
O projeto de lei complementar terá que ser
acompanhado, segundo consta do Relatório de Projeções Fiscais recém-editado e
divulgado pelo Tesouro, de medidas de redução de despesa ou de aumento de
receita que sejam capazes de melhorar a trajetória do resultado primário já no
curto prazo e “trazer a dívida para níveis sustentáveis”.
O adiamento de decisões nesse sentido vai
resultar em uma conta mais salgada de juros pagos pela União, o aumento do
risco-país com reflexos negativos para o crescimento e para a inflação.
Do lado da despesa primária, tendo em vista
as incertezas atuais quanto à política fiscal do futuro, dado o novo arcabouço
que deverá estar construído no ano que vem, os técnicos do Tesouro projetaram
um aumento de R$ 100 bilhões no limite de despesa do Poder Executivo em 2023,
montante que seria carregado nos anos seguintes. Esse valor seria mais do que
suficiente para cobrir o gasto maior com o Auxílio Brasil, ficando as demais
despesas obrigatórias inalteradas.
A evolução do gasto obrigatório depende da
trajetória dos seus componentes, O maior peso é com o Regime Geral da
Previdência Social (RGPS), que sai de 8,5% do PIB para 7,6% do PIB entre os
anos de 2021 e 2031, mas cresce 2,2 pontos percentuais ao ano a partir de 2028,
devido ao envelhecimento populacional.
Assumindo que não haverá reajustes
salariais para o funcionalismo, o que é muito difícil, a tendência é essa
segunda maior despesa cair como proporção do PIB. O restante dos gastos
obrigatórios se manteria constante em 5,1% do PIB, mas com mudanças na sua
composição. As despesas com sentenças judiciais de custeio e capital dobram,
passando de 0,2% do PIB em 2021 para 0,4% do PIB em 2031, com pico em 2027,
quando triplicam e alcançam 0,6% do PIB. Esse aumento decorre do pagamento do
passivo decorrente do limite imposto pela Emenda Constitucional dos Precatórios
(EC 114) entre 2022 e 2026.
A projeção do Auxílio Brasil representa um
aumento do gasto de 0,3% do PIB em 2021 para 1,2% do PIB em 2031. Estão
incorporados nessa conta a elevação do benefício para R$ 600 e um adicional de
R$ 150 por criança até os seis anos de idade.
À medida que se deterioram os números
fiscais, piora também a composição da dívida mobiliária federal. E isso pode
ser identificado nos dados a partir de 2015, quando o déficit primário se
consolida e o mercado começa a demandar títulos da dívida selicados (ver
gráfico acima).
São as Letras Financeiras do Tesouro
Nacional, as LFTs, consideradas a “Geni” dos títulos da dívida mobiliária. Elas
foram criadas no meio do Plano Cruzado pelo então diretor de Política Monetária
do Banco Central, André Lara Resende, para serem indexadas ao “overnight”.
Tratadas como “Geni”, em que todos jogam
pedras, as LFTs são, também, a salvação dos governos que não se importam com a
situação das contas públicas, e deixam o déficit primário rodar.
São, simultaneamente, uma fonte de certo
alívio para quem tem que rolar a dívida mobiliária em tempos de crise. “Sempre
haverá a LFT”, diz uma fonte do Tesouro, que acrescenta: “enquanto não formos
um país sério”.
Lendo e aprendendo.
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