Folha de S. Paulo
Em live lacrimosa, ex-presidente em
atividade tenta se desvincular de extremistas que insuflou
Para quem esperava um Götterdämmerung, um
crepúsculo dos deuses wagneriano, o ocaso da Presidência
de Jair Bolsonaro (PL) chegou ao fim formal nesta sexta (30) com um
sussurro algo vazio antes
de embarcar rumo ao reino de Donald Trump.
Na
forma de uma lacrimosa live, Bolsonaro encerrou dois meses de mutismo para
entregar um pacote de platitudes e lamentos. Não chegou a questionar as urnas
como de costume, moderando sua agressividade talvez em vista dos dois dias de
foro privilegiado que tem pela frente.
Nem tampouco admitiu a derrota para Luiz Inácio Lula da Silva (PT), embora o tenha feito de forma tácita ao admitir que o sol nascerá no dia 1º como sempre. Titubeante, não apagou o efeito que sua reclusão final no Palácio da Alvorada potencialmente causou no movimento que o levou ao poder no pleito de 2018.
Segundo um político que o visitou na
clausura na semana retrasada, Bolsonaro parecia um personagem de tragédia
farsesca: na
penumbra, quase catatônico, murmurando sem parar que "vamos
vencer".
Emulava, diz esse interlocutor, as ideias
que os generais palacianos remanescentes lhe sopravam desde que perdeu a
eleição. Sim, continua o relato, a ilusão de que as Forças Armadas iriam aderir
a um levante popular bolsonarista foi mantida como hipótese de trabalho desse
grupo.
Daí
o silêncio cúmplice da escalada terrorista dos antes folclóricos
personagens acampados em frente a quartéis pelo Brasil. Novamente, talvez de
olho nos riscos judiciais, decidiu condenar na live a tentativa
de atentado em Brasília quase duas semanas após o ocorrido.
De forma inédita na República, Bolsonaro
optou por ser um ex-presidente em atividade nos dois meses
remanescentes de seu mandato. Com efeito, a
transição lulista tratou de negociar limites orçamentários com o
Congresso e Flávio Dino age como ministro da Justiça que de fato só será a
partir da semana que vem.
Desde que o capitão italiano Francesco
Schettino abandonou
o navio Costa Concordia em 2012 não se via algo parecido, com a
diferença de que não houve quem gritasse "Vada a bordo, cazzo!". Na
live, tentou jogar a culpa na imprensa: teria ficado quieto porque se falasse
algo, "seria um escândalo". E, diz, "trabalhei".
Deu as caras publicamente em palanques
militares e junto a seguidores no Alvorada. Ensaiou
alguma articulação, participando de um jantar do PL, mas só. Nem
sequer comunicou ao vice, o senador eleito Hamilton Mourão (Republicanos-RS),
que quer deixar a faixa presidencial em alguma gaveta para Lula achar.
A opção pelo mutismo, uma forma de se
desvincular da violência eventual que irromper em seu nome reforçada pela live
final, e a fuga para
o refúgio do ídolo Trump na Flórida, contudo deverá apresentar sua conta.
Em
frente do Comando Militar do Sudeste, na nobre região do Ibirapuera em
São Paulo, manifestantes há mais de 50 dias frequentando a "alameda do
golpe", como um feliz vendedor de churrasquinho instalado nas proximidades
apelidou, dão a chave da questão.
Um deles, um senhor de cerca de 70 anos que
mora na vizinhança e se identifica como Pedro, diz que passa lá todos os dias
"porque as Forças Armadas irão salvar o Brasil de Lula". Como?
"Impedindo a posse, claro". E qual a indicação disso? "Eu
sei."
A origem de sua crença é um dos
grupos de WhatsApp em que recebe notícias, por assim dizer, do
desenvolvimento da situação política. Mas Pedro está irritado. "Aqui
[aponta para o celular] diz que o Bolsonaro vai comandar a resistência dos
Estados Unidos, mas acho que ele tinha de ter feito algo aqui. Longe, vai
perder", afirma.
Pedro não está sozinho como apoiador.
Segundo o Datafolha, nada menos que 25% dos eleitores brasileiros se
definem hoje como bolsonaristas. E há o contingente adicional que leva
aos 49,1% de eleitores de Bolsonaro em 30 de outubro, muitos por simples
ojeriza a Lula.
Mesmo depurando esse grupo amplo, é muita
gente. Somando
aos 25% aqueles que disseram ao Datafolha estarem mais próximos do
bolsonarismo do que do centro ou do petismo, 7% dos ouvidos, chega-se a um
respeitável terço do eleitorado que parece disposto a seguir nessa faixa de
frequência.
Sem governar, manteve a aprovação
no nível que havia chegado, recorde para seu mandato, na campanha. O
Datafolha a aferiu em 39%, enquanto 37% o reprovam. É o pior índice para um
presidente de primeira viagem, mas melhor do que qualquer outro número que
obteve em seus quatro anos.
É uma aposta na nostalgia sebastianista,
mas o espaço que deixa abre caminho para a ascensão
de novas lideranças que capturem não só suas viúvas, mas também aquela
fatia de descontentes com a chegada de Lula ao poder que não se veem como radicais
de extrema direita.
Os nomes estão decantados, o novo
governador paulista Tarcísio de Freitas (Republicanos) à frente. Pela gravidade
do cargo, ele estreia na grande política já presidenciável, com
um articulador político de peso por trás, Gilberto Kassab (PSD).
Não é por acaso que ele já se diz alguém
próximo do presidente, mas não bolsonarista. Resta, por óbvio, saber se dará
conta do recado, mas a casa arrumada nas contas deixadas pelos tucanos e a
carteira de obras para inaugurar nos próximos dois anos facilitarão
sua vida. Se isso será suficiente para abocanhar o eleitorado do ex-chefe, é
uma questão em aberto.
Assim, salvo a materialização do golpe
militar esperado pelo senhor Pedro sob a garoa no Ibirapuera, Bolsonaro fez
questão de usar a porta dos fundos em sua despedida.
O que o nosso presidente está fazendo agora nos EUA? Foi ter algum último (e primeiro) encontro com Biden? Foi discutir questões externas de interesse do nosso país? Quantos milhares de dólares está custando esta viagem oficial do nosso mandatário pros EUA?? O que de tão importante o canalha foi fazer nos EUA nos últimos dias do seu mandato?
ResponderExcluirTarcísio dizer que não é bolsonarista queima o filme para os fanáticos.
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