Folha de S. Paulo
Melhorar a proteção social requer coragem
para fugir de caminhos fáceis
Não faltam desafios ao governo que se
inicia com o novo ano. O primeiro é traduzir em políticas inovadoras e
financeiramente sustentáveis o compromisso com o eleitorado pobre —ou quase
isso— que lhe deu a apertada vitória. Garantir que receba em janeiro uma Bolsa Família vitaminada será sinal da
intenção de cumprir o prometido.
Em um país com tanta pobreza, programas de transferência de renda —como aquele— são o primeiro andar imprescindível de qualquer sistema de proteção social esperável de governos progressistas. O edifício completo, porém, requer Previdência digna, saúde pública —com um SUS robusto e saneamento universalizado— educação com qualidade aceitável e justiça climática.
A tarefa é desafiadora porque vai além de
reerguer o que o governo da extrema-direita desorganizou; tamanha a obra pela
frente que não bastará repetir as fórmulas bem-sucedidas da primeira década do
século. Até porque tanto nos serviços que entregava quanto no financiamento
destinado a sustentá-los, a política social dos governos petistas já mostrava
sintomas de esgotamento antes do impeachment de Dilma Rousseff e da
calamidade que se lhe seguiu. Sob a gestão do PT, o sistema de proteção social
se universalizou para a grande massa da população.
Permaneceram, entretanto, enormes
desigualdades regionais e entre grupos e, com frequência, precária qualidade do
que era efetivamente ofertado. Sem falar na iniquidade estrutural de nosso
sistema previdenciário.
Na Babel de vozes dos que foram às ruas
protestar em 2013, não poucas gritavam por saúde de qualidade e escolas de
melhor padrão —sinal de inconformismo com a prestação social que vinham
recebendo.
Melhorar a proteção social e torná-la mais
equânime e duradoura requer capacidade de inovar e coragem para fugir de
caminhos fáceis, pois a missão será impossível sem formas estáveis e
sustentáveis de financiamento, alinhadas ao bom senso fiscal. Mais fácil dizer
do que fazer.
Eu estava no último ano do colégio quando
mostrei ao amigo Murilo Felisberto, então jovem repórter desta Folha, um exemplar do "Furacão
sobre Cuba", de Jean Paul Sartre, recém-editado no Brasil. Murilinho, que
era meio de direita, comentou: "Não sei se o livro é bom, mas a capa é uma
foto do genial Janio de Freitas". E me informou que ele editava o
"Jornal do Brasil", cujo caderno de cultura cultuávamos. Desde
então, Janio de Freitas foi para mim uma referência de
jornalismo de excelência, leitura inquietante e obrigatória
*Professora titular aposentada de ciência
política da USP e pesquisadora do Cebrap.
Maria Hermínia Tavares,grande colunista.
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