quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Vera Magalhães: Está em curso o 'resta um' do centro

O Globo

Daqui até o fechamento da chamada janela de troca de partidos, no início de abril, pré-candidatos, dirigentes partidários e parlamentares vão se dedicar de forma intensiva a um jogo de cálculo que, quando terminar, vai definir quem sobra no tabuleiro das candidaturas presidenciais.

No grid atual, quem trabalha mais intensamente nos bastidores para tentar se consolidar e, se possível, interditar o caminho dos oponentes no mesmo campo são Sergio Moro, João Doria e Simone Tebet. Enfrentam, do outro lado, a ampla vantagem do ex-presidente Lula, que também tem feito investidas ousadas para atrair expoentes desse chamado centro com o discurso da necessária reconstrução do Brasil pós-Bolsonaro.

Doria é quem se move de forma mais ativa na tentativa de eliminar adversários. Para isso, conversa com próceres do União Brasil, do Podemos e do MDB para tentar dissuadi-los de lançar candidatos próprios. É uma estratégia que ele usou, com sucesso, nas prévias do PSDB, conseguindo atrair na última hora apoiadores comprometidos com Eduardo Leite.

Descrito como “obstinado” por aliados e adversários, o tucano tenta operar a mágica de ser visto como o mais viável para romper a polarização entre Lula e Jair Bolsonaro mesmo sem dar sinais de subir nas pesquisas.

Elio Gaspari: Lula está um passo à frente

O Globo

O sonho é transformar uma candidatura num movimento

Forte nas pesquisas, acenando com Geraldo Alckmin na Vice, buscando conversas com a dissidência tucana, com Marina Silva e com figuras do agronegócio, Lula está um passo à frente de seus adversários que tentam construir uma alternativa à polarização com Bolsonaro. O ex-presidente acredita ter neutralizado as restrições que sua base fazia à marcha em direção ao centro, e mesmo a “setores da centro-direita”. Aberta essa porta, trará novas surpresas.

Coisa parecida só aconteceu em 1984, quando Tancredo Neves reciclou a frente que pedia eleições diretas, transformando-a num movimento a favor de sua indicação pelo colégio eleitoral. A raposa mineira conseguiu um milagre: pela primeira vez na História do Brasil, a conciliação partiu da oposição.

O quadro de 2022 não é o de 1984, e Lula não é Tancredo. Basta lembrar que combateu sua candidatura: “É uma proposta de transação”. Era, e faltava ao petista a percepção de que o país precisava era de uma transação. Essa manobra havia sido exposta mais de um século antes pelo jornalista Justiniano José da Rocha em seu texto “Ação; reação; transação”. O PT viria a expulsar os três deputados que votaram em Tancredo na reunião do colégio eleitoral, readmitindo-os anos depois. Entre um gesto e outro, Lula conheceu Emílio Odebrecht na casa do tucano Mário Covas.

Paulo Sternick*: Por que ele não será reeleito?

O Globo

A metáfora do gorila invisível — num teste psicológico, o primata cruza de forma ostensiva o meio de um jogo de basquete, mas não é percebido por mais da metade dos que lhe assistiam — ganha novo realce no cenário político brasileiro. Em 2018, Bolsonaro foi eleito no segundo turno com 55,13% dos votos válidos. A maioria dos eleitores também não viu o gorila, não obstante ele bater no peito, guinchar e secretar fúnebres hinos de tortura e louvores à ditadura. Não resta dúvida de que alguns, só por isso, votaram no capitão: são expressão de uma faceta subterrânea e violenta — embora minoritária — da alma brasileira.

Na semântica popular — mas com todo o respeito a supostos ancestrais —, o substantivo gorila, fiel à triste memória da ditadura, passou a definir o militar de extrema direita, que toma o poder pelo golpe ou defende essa via. Por extensão, deu nome a pessoas truculentas e políticos fascistas — os que supõem bastarem jipe e soldado para fechar o STF. Na fauna das analogias para desvendar a oculta — e negada — realidade que nos cerca, há outra: a do rinoceronte cinza, que define um risco não percebido. Embora esteja bem à nossa frente: gorilas, pandemias, mudança climática.

Luiz Carlos Azedo: O bolsonarismo perde seu guru, mas suas ideias têm raízes profundas

Correio Braziliense

Olavo de Carvalho vivia às turras com os militares e criticava duramente a aliança de Bolsonaro com o Centrão, os dois setores responsáveis pela substituição dos ex-ministros Weintraub e Araújo, seus aliados 

O escritor Olavo de Carvalho, guru do bolsonarismo militante, faleceu ontem, vítima de covid-19, em um hospital de Richmond, no estado da Virgínia, nos Estados Unidos, onde morava, oito dias após ser diagnosticado com a doença. Era um dos expoentes do negacionismo e havia se recusado a tomar vacina. O presidente Jair Bolsonaro decretou luto oficial de um dia, ainda que o relacionamento entre ambos andasse estremecido, em razão da saída do governo de alguns de seus principais aliados, como o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub e o ex-chanceler Ernesto Araújo. Bolsonaro lamentou a morte do escritor e prestou solidariedade aos familiares, amigos e alunos dele.

Olavo Luiz Pimentel de Carvalho, seu nome completo, dava aulas de filosofia e fez a cabeça de uma legião de empresários, executivos e intelectuais conservadores, por meio de cursos, palestras, vídeos e livros. Um deles, intitulado O mínimo que você precisa saber para não se tornar um idiota (Record), uma coletânea de textos organizado por Felipe Moura Brasil, virou um best-seller, que rivalizou com livros de autoajuda. Carvalho nunca foi reconhecido como filósofo pela academia. Foi astrólogo e integrante de uma seita muçulmana sufista. Por meio das redes sociais, conseguiu difundir suas teses conservadoras com muito sucesso. Seu perfil no Facebook tem mais de 587 mil seguidores. Mantinha um seminário virtual cuja mensalidade custava 60 reais. Se autointitulava “líder supremo do anticomunismo latino-americano” e dizia que “ideologia de gênero, abortismo e gayzismo” são parte de uma “revolução cultural” coordenada por comunistas.

Nilson Teixeira: Lula e o presidencialismo de conciliação

Valor Econômico

O presidencialismo de coalizão não é mais suficiente para garantir o apoio recorrente dos parlamentares

A crescente fragmentação política explica, em parte, o aumento da dificuldade de formação de uma coalizão robusta no Congresso. No início do 1º governo FHC, havia 17 partidos políticos com representação na Câmara dos Deputados, sendo que os cinco maiores tinham 394 cadeiras (77% do total). Atualmente, 24 partidos têm pelo menos um deputado federal, enquanto os cinco maiores alcançam apenas 228 cadeiras (42% do total) e só dois têm mais de 10% dos deputados.

Para alcançar a maioria de 308 votos, bastava o governo FHC obter apoio de 90% dos deputados dos quatro maiores partidos. Por outro lado, o presidente Bolsonaro só consegue esses votos se conquistar uma base de 90% dos deputados de todos os partidos com exceção de PT, PSDB, PSB, PDT, PSOL, PCdoB, PV e Rede (137 deputados). Esse número demonstra o quão difícil é a obtenção de apoio para medidas como as que cortam benefícios ou as que elevam a tributação.

A base de apoio no Congresso tem sido construída com barganhas entre o governo - empenhado na obtenção de apoio - e os parlamentares - interessados no atendimento dos seus eleitores. Na maioria das vezes, o objetivo dos políticos é o de ampliar benefícios e obter verbas para sua base eleitoral, sendo poucos os eleitos por conta de suas posições sobre temas nacionais. A aprovação de reformas atrai, portanto, pouca atenção, exigindo empenho do Executivo para convencer os congressistas sobre sua relevância.

Fernando Exman: A estratégia é definir o terreno da batalha

Valor Econômico

Bolsonaro subverte o conceito de domicílio eleitoral

Emerge, a poucos meses das eleições, mais um aspecto da tormentosa relação que Jair Bolsonaro mantém com a política.

Pois agora, além de estruturar sua própria campanha para permanecer no cargo, o presidente da República está dedicado a eleger aliados nos Estados, tanto para os governos locais como para as 27 cadeiras que ficarão vagas no Senado. O mesmo foi feito por seus antecessores. A diferença é que Bolsonaro passou a falar - sem pudor - em como pretende distribuir as peças no tabuleiro, mesmo que essa estratégia represente mandar um ministro carioca disputar o governo de São Paulo ou uma auxiliar paranaense concorrer ao Senado por um Estado do Norte ou Sudeste.

Isso é subverter o conceito de “domicílio eleitoral”, um dos pilares da legislação.

Do ponto de vista de quem vota, a prática pode gerar uma grande confusão. Não foram poucos os que pelo menos uma vez acharam que o ex-presidente José Sarney fora eleito para o Senado pelo seu Estado natal. O emedebista nascido e criado no Maranhão era, contudo, um legítimo representante do Amapá.

Daniel Rittner: Por que é essencial entender o olavismo

Valor Econômico

O antibolsonarismo precisa conhecer seus rivais para derrotá-los

A mídia apoia os gays para promover o controle populacional? Há livros ensinando crianças a fazer sexo oral com elefantes? O general Geisel era comunista? Nazismo e FMI são de esquerda? Bill Clinton era um agente de Pequim? A internet foi criada para combater o ateísmo?

Essas perguntas, da forma como estão reproduzidas acima, faziam parte da descrição de comunidade criada em 2004, no finado Orkut, e dedicada ao escritor Olavo de Carvalho. Deve-se à pesquisadora Michele Prado, autora do livro “Tempestade Ideológica”, um relato curioso sobre os primeiros passos e o crescimento do olavismo no país. Seu estudo, lançado no ano passado, merece ser lido com atenção - para quem não tiver tempo ou paciência, dá para se contentar com os capítulos 1 a 3 (os restantes são bem inferiores e muitas vezes se tornam mero glossário sobre movimentos radicais, sobretudo nos EUA, já amplamente conhecidos por quem se interessa pelo tema).

A nova direita, no Brasil e no exterior, leu e se aprofundou sobre estratégias da esquerda e obras de referência no ambiente progressista. O inverso não é verdadeiro. Com frequência, trata-se o ultraconservadorismo com deboche e desprezo. A falta de conhecimento e a indiferença sobre como pensa essa fatia do eleitorado, por radical que seja, impede o desenvolvimento de táticas eficientes para rebater ou neutralizar seus planos de ação.

Bruno Boghossian: A herança eleitoral do olavismo

Folha de S. Paulo

Cartilha do polemista vai formatar comportamento do presidente na disputa pela reeleição

Olavo de Carvalho nunca escondeu sua frustração com o desempenho de Jair Bolsonaro no poder. O escritor atacava a hesitação do presidente em tomar medidas autoritárias e reclamava da timidez de uma guerra contra o que chamava de comunismo. Em dezembro, o polemista escreveu que só votaria de novo no capitão "por falta de alternativas".

A doutrina de Olavo deu instrumentos a Bolsonaro em 2018 para aglutinar grupos que se moviam por sentimentos diversos. A plataforma do autointitulado filósofo uniu setores que se viam ameaçados por transformações sociais, enxergavam uma conspiração mundial liderada pela esquerda e identificavam um país refém de elites políticas.

Bolsonaro se cercou de ex-alunos de Olavo e instrumentalizou essa visão. Investiu numa agenda ultraconservadora, atacou a inclusão de minorias, aderiu ao conceito de guerra cultural contra adversários políticos e abraçou o discurso antissistema. A cartilha rendeu frutos na eleição e foi transportada para o governo.

Hélio Schwartsman: Fim antes da hora

Folha de S. Paulo

O vírus vai permanecer entre nós, mas as pessoas irão retomando suas vidas 'normais'

A epidemia é algo que existe em nossas mentes. Não, não aderi ao negacionismo bolsonarista nem ao idealismo radical de Berkeley. Sigo firme em minhas convicções materialistas. Mas, entre os muitos paradoxos relacionados à Covid-19, está uma assimetria entre começo e fim.

Como eu já destacara numa coluna de 2020, embora a epidemia tenha sido deflagrada por uma causa muito concreta, o Sars-CoV-2, seu término é um fenômeno psicológico: o vírus vai permanecer entre nós, mas as pessoas irão retomando suas vidas "normais" à medida que se sintam seguras para tanto.

Igor Gielow: Quando tudo isso passar

Folha de S. Paulo

O impacto da Covid-19 num país governado por casta de lorpas é objeto para choro real

A emergência da variante ômicron do Sars-CoV-2 trouxe o melhor e o pior em termos de expectativas para uma humanidade cansada após dois anos de perdas humanas, afetivas, cognitivas, econômicas.
Do lado positivo, a expectativa de que, sim, o novo modelo da peste pode indicar o caminho para algum tipo de normalização dada a sua avassaladora transmissibilidade e aparente comedimento em termos de impacto mortífero entre aqueles que estão vacinados.

O problema está no aparente, e falo com o amargor de quem perdeu um ente muito próximo que nem de longe poderia ser qualificado de negacionista. A alta atividade do patógeno leva, evidentemente, a mais casos e à maior probabilidade de oportunidades à Ceifadora.

Infelizmente não temos W.G. Sebald cá nos trópicos para, como fez o maior escritor alemão do pós-Guerra com uma Europa destroçada, descrever a perplexidade e impotência ante o tsunami que nos colheu.
A propósito, Sebald, cuja obra se assenta em quatro obras-primas e foi interrompida por uma morte estúpida aos meros 57 anos, em 2001, ora é escrutinado em uma instigante biografia da britânica Carole Angier, lançada recentemente.

Ela percorre os caminhos tortuosos da mente do escritor, aponta contradições éticas graves em seu trabalho acadêmico e registra a revolta com que os personagens de seus livros foram decalcados de histórias reais --basicamente, Sebald destruía sua matéria-prima e a remontava de uma forma ficcional crível e bela.

Em ruptura com o “socialismo real”, há 30 anos é criado o PPS

Em 26 de janeiro de 1992 é criado o PPS em defesa da democracia representativa e dos valores humanistas, sociais e reformistas consagrados na nossa Constituição cidadã de 5 de outubro de 1988.

Na década de 80, com a retomada da democracia no Brasil e a consequente legalização do PCB, o seu processo de renovação interna ganha força. A queda do muro de Berlim, em 1989, e a derrocada do "socialismo real" no Leste europeu reforçam essa necessidade. 

Nesse período, o ainda PCB lançou pela primeira vez candidato próprio a presidente da República, nas primeiras eleições diretas após o fim da ditadura militar. Roberto Freire, presidente do partido, percorreu o país numa campanha histórica para os comunistas.

Em 1992 a mudança se concretiza. Freire, então presidente do PCB, convoca o X Congresso que altera o nome e a sigla de Partido Comunista Brasileiro - PCB para Partido Popular Socialista – PPS. O PCB se torna então o primeiro PC no continente a mudar radicalmente sua política, sua estrutura orgânica e sua simbologia.

Manifesto de fundação do PPS

" Aos seres humanos que, por nascimento ou opção, habitam terras brasileiras, o PPS dedica seus 70 anos de lutas, e todas as lutas futuras* "

Há uma crise, no mundo e no Brasil, e todos podemos senti-la. Uma crise que solapa a esperança, que chega ao fundo dos corações, gerando frustrações, descrença e cinismo. Frente aos desafios destes novos tempos, seu compromisso de luta por uma sociedade mais justa e mais humana, o X Congresso do PCB oferece à sociedade brasileira um novo instrumento de luta, o Partido Popular Socialista - PPS.

Um Partido que, desde sua formação, é plural, aberto à participação de todos os que acreditam que é possível, a todos os seres humanos, viverem iguais e livres. Um Partido que, num mundo de mudanças, assume o compromisso central com a vida, entendendo-a como indissociável da natureza e da cultura. Um Partido, que quer contribuir para a construção de uma nova ética, em que o ser humano, sem nenhuma discriminação, seja protagonista e beneficiário das transformações sociais.

O que pensa a mídia: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

Orçamento tem a cara antissocial do governo

Valor Econômico

Bolsonaro ainda acha que um orçamento que atende basicamente a políticos fisiológicos, e não à maioria dos brasileiros, pode reelegê-lo

O orçamento do último ano de mandato do presidente Jair Bolsonaro é um resumo vigoroso de suas prioridades antissociais e corporativistas. É uma lição didática de que a política comanda a distribuição de recursos em última instância - e, no caso de Bolsonaro, em primeira. Depois de furar o teto de gastos, com apoio do ministro Paulo Guedes, hoje peça de decoração liberal do Planalto, o presidente assinou embaixo de todas as demandas dos partidos do Centrão, que mandam no Legislativo, sustentam Bolsonaro e cumprem a missão para a qual foram criados e existem - sugar o dinheiro público para seus fins particulares e de seus redutos eleitorais.

O corte de recursos feito sob o comando do Centrão é inferior ao que precisaria ser feito - R$ 3,18 bilhões. O ponto principal do orçamento são as verbas que são mantidas, R$ 35,6 bilhões de emendas parlamentares, com R$ 16,5 bilhões daquelas que privilegiam os caciques e evitam que o mal maior atinja o presidente, como os do PP e PL. A fatia da cobrança aumentou: em 2021 essas emendas atingiram R$ 33,4 bilhões. Os investimentos, como sempre, e não só com Bolsonaro, continuam caindo fora da peça orçamentária. Este ano serão R$ 42,3 bilhões, a menor quantia desde sempre.

Poesia | Graziela Melo: Ato de pensar

Pensar,
pensar
pensar...

nas trevas
na luz,
no ar...

pensar
em andar
na terra
ou em voar!!!

Pensar
na amargura
ou na doçura
que a gente
não cansa
de procurar!

Pensar
na loucura,
nos tempos
terríveis
da ditadura...

Pensar
na ternura que guardo
na alma

sempre
disposta
a entregar...

entregar
ao mundo,
à vida,
à terra,
ao mar!!!

E pensar,
pensar,
pensar!!!!

idealizar,
filosofar...

brincar,
amar,
querer,

até a hora
de acabar

o carinho,
o afago...

é o momento
amargo

de terminar

o ser,
o ter
e o haver...

é a hora de morrer!!!