terça-feira, 15 de março de 2022

Merval Pereira: Partidos buscam saídas

O Globo

Faltando duas semanas para a definição das federações partidárias, e também para a troca de legenda sem sofrer punições da legislação eleitoral, a movimentação nos bastidores está intensa, indicando não apenas a dificuldade de compromissos mais permanentes entre legendas, como coligações que podem interferir no resultado eleitoral.

Para acertar uma federação, é preciso que os partidos nela envolvidos concordem em permanecer fiéis ao mesmo programa nos próximos quatro anos. PSOL e Rede já se acertaram, o que não foi difícil, pois a Rede precisa de um apoio para superar as cláusulas de barreira, e o PSOL é o partido que mais se assemelha a ele. Nasceu de uma dissidência petista, assim como a Rede, mas não rejeita totalmente o PT.

Outro grupo de partidos está se unindo, tentando despertar a terceira via. Em termos de máquina partidária, essa seria uma união ideal de coligação, não de federação, entre União Brasil, MDB e PSDB, que teria uma verba para financiar a campanha estimada em R$ 2 bilhões e representantes em todos os estados brasileiros. São legendas muito fortes, muito grandes para se fechar numa federação, mas uma coligação com vista à chapa para presidente da República teria substancial tempo de televisão, fundo partidário e capilaridade nacional.

Carlos Andreazza: Bolsonaro competitivo

O Globo

Em dois artigos recentes, a 22 de fevereiro e 1º de março, mencionei o que chamo de tripé competitivo por meio do qual, creio, Bolsonaro chegará forte à eleição. Hoje, aprofundarei o exame dessa sustentação.

Antes, uma nota. Embora o ímpeto tenha arrefecido nas últimas semanas, mais torcida que projeção derivada de análise, há ainda quem considere significativa a chance de Lula vencer no primeiro turno; algo que não ocorreu nem quando era presidente e tinha a estrutura do Estado a seu favor.

Com a estrutura do Estado a seu favor, vem — virá — Bolsonaro. Não pode ser subestimado o efeito do novo Bolsa Família, de R$ 400, sobre sua campanha, nem o ritmo como a Caixa — duplo de comitê de campanha bolsonarista e banco para microcrédito — multiplica agências Brasil adentro. Difícil que não cresça. Crescerá articulando o aludido tripé. A primeira das pernas, muito testada, a que nunca lhe faltou; que se expressou, fisicamente, nos eventos golpistas do Sete de Setembro — e que encarna a desestabilização permanente que caracteriza o bolsonarismo.

Míriam Leitão: Cenário econômico piora com a guerra

O Globo

A guerra turvou ainda mais o cenário do último ano do governo Bolsonaro. O país já estava com a inflação alta e a economia estagnada. Mas agora a esse quadro difícil se somam todos os efeitos da guerra da Rússia contra a Ucrânia, o que levará o país a ter mais inflação, menos crescimento, mais juros. O Copom se reúne hoje e amanhã para subir a Selic em mais um ponto percentual. As projeções são de que os juros vão a 13% este ano, uma taxa enorme para um PIB que pode não sair do zero.

Da última reunião do Copom para cá, os indicadores pioraram, e esta guerra terrível estourou afetando todas as projeções. A inflação está em dois dígitos desde setembro, mas os economistas projetam um recuo este ano. Ainda acham que vai ficar abaixo de 10%, mas a cada dia a estimativa é revista para cima. Na última reunião do Copom, a mediana do Focus apontava 5,38%, agora está em 6,45%. O Credit Suisse divulgou ontem um relatório apostando em 7%. É muito difícil saber, mas o viés é de alta para os preços, e a piora das expectativas já atinge os anos de 2023 e 2024, que começam a escapar do centro da meta.

Edu Lyra: Combate à pobreza exige inovação

O Globo

O título de um dos meus livros é “Da favela para o mundo”. Trato nele das barreiras e preconceitos que enfrentei enquanto jovem favelado e da minha tentativa de vencer a pobreza e expandir horizontes. Muito do que aparece no livro como sonho ou projeto virou realidade nos últimos anos: pude visitar outros países, palestrar em centros universitários de renome, conhecer grandes empreendedores e filantropos.

Essa vivência me convence cada vez mais da importância da inovação para as iniciativas de combate à pobreza e à desigualdade. Por isso levo — e continuo levando — minha experiência das periferias brasileiras por onde passo, mas creio que hoje escreveria um livro diferente, chamado “Do mundo para a favela”.

Luiz Carlos Azedo: Lula confirma Alckmin de vice e teme reeleição de Bolsonaro

Correio Braziliense

O plano da ética deixou de ser uma prioridade para a maioria dos eleitores, mas ainda é uma variável que pode decidir a eleição à Presidência

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) confirmou, ontem, que vai mesmo convidar o ex-governador de São Geraldo Alckmin para ser o vice na sua chapa à Presidência, a despeito das resistências do PT e de partidos de esquerda que o apoiam, como o PSol. Alckmin deve se filiar ao PSB para consolidar a aliança, independentemente da disputa entre o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) e o ex-governador Márcio França (PSB). O lançamento da chapa deve ocorrer em meados de abril. O líder petista tem dito que os descontentes com a aliança devem procurar outro candidato.

Apesar de ser o líder absoluto nas pesquisas de opinião, Lula está preocupado com a resiliência do presidente Jair Bolsonaro, do qual vem mantendo uma distância em torno de 10% das intenções de votos, segundo as pesquisas. Para quem já participou de muitas eleições, perdeu três e ganhou duas, essa diferença é muito pequena para se subestimar o adversário. O “já ganhou” petista não fez a cabeça de Lula. Avalia que Bolsonaro ainda tem a possibilidade de se reeleger, porque sua candidatura parece ter um lugar garantido no segundo turno.

Lula ancora sua candidatura na militância de esquerda, no recall de seu governo (2003-2010) junto às parcelas mais pobres da população e na ojeriza à Bolsonaro de parte da classe média. O presidente da República também tem uma relação consolidada com os mundos rural, que migrou para as cidades do interior; evangélico, com o qual tem identidade do ponto de vista dos costumes; e com os setores reacionários, que idealizam o antigo regime militar e defendem uma espécie de ditadura do Executivo.

Eliane Cantanhêde: “Transição e reconstrução”

O Estado de S. Paulo.

PT moderado quer Lula como ‘centro’, ‘transição’ e ‘reconstrução’

Aposição do ex-presidente Lula na disputa presidencial já foi bem mais confortável, mas o presidente Jair Bolsonaro vem demonstrando capacidade de reação e isso mexe não só com os nervos, mas com as estratégias do PT. O lado moderado aconselha Lula a usar três carimbos para ampliar seu leque de apoio e escapar da bolha exclusivamente de esquerda.

O primeiro carimbo: ele seria o verdadeiro “candidato de centro”. O segundo: será um “presidente de transição” e não disputará um quarto mandato. O terceiro: sua missão é “reconstruir o País”.

É uma estratégia forte, mirando PSDB, Cidadania, MDB, PSD e a própria Rede. Ou seja, para atrair e segurar votos de centro e centro-esquerda que há em todas essas siglas e evitar uma debandada para Bolsonaro no caso de falência da terceira via.

Felipe Salto*: O tripé orçamentário Couri-bijos

O Estado de S. Paulo.

Desde já, vaticino: passa por ele a saída para o nó górdio na gestão do dinheiro público, esta verdadeira crise fiscal

Um dos maiores especialistas do País em contas públicas, Daniel Couri, escreveu sobre a necessária modernização do processo orçamentário a partir de 2023. O artigo, em parceria com Paulo Bijos, integra a coletânea Reconstrução: o Brasil nos anos 20 (Saraiva, 2022), que organizo com Laura Karpuska e João Villaverde.

O processo orçamentário é uma grande confusão. Na Assembleia Nacional Constituinte, o economista e deputado constituinte José Serra comandou os trabalhos que culminaram no capítulo de Finanças Públicas da Constituição. Serra reuniu um grupo de especialistas do calibre de Maílson da Nóbrega, José Roberto Afonso e Andrea Calabi para analisar as ideias que chegavam a toque de caixa. Ali, postulou-se a tese da responsabilidade fiscal. A Constituição federal obrigaria à apresentação de uma lei complementar para regular o uso do dinheiro público.

Hélio Schwartsman: Salvo-conduto para barbarizar

Folha de S. Paulo

Felizmente, a lista desses políticos é reduzida

Aqui se faz, aqui se paga, assevera o ditado popular. Mas nem sempre. Arthur do Val disse absurdos sobre as mulheres ucranianas, suas declarações vazaram e ele agora sofre as consequências. Teve de renunciar à pré-candidatura ao governo paulista e muito provavelmente terá seu mandato de deputado estadual cassado.

Quer você considere esse tipo de cancelamento uma forma de justiça rápida, quer o veja como uma manifestação da tirania da maioria, simplesmente não há como evitar que as pessoas reajam ao que entendem ser uma grave violação moral. Em tempos de redes sociais, esse sentimento pode converter-se instantaneamente numa onda de indignação que leva tudo em seu caminho.

Alvaro Costa e Silva: Os bedéis da imbecilidade

Folha de S. Paulo

Câmara vota projeto que proíbe e criminaliza uso da palavra Bíblia fora da religião

Em 1964, Stanislaw Ponte Preta, heterônimo do jornalista Sérgio Porto, publica o livro "Garoto Linha Dura", título que alude ao ambiente pesado do país, sobretudo à perseguição política, censura e deduragem. "Escolhi para título a história do garotinho que se deixou influenciar pelo mais recente método de democratização posto em prática no Brasil", explica o autor.

Pedrinho, o tal garoto linha dura, para fugir do castigo por ter quebrado uma vidraça jogando futebol na rua, entrega um colega e diz ao pai: "Esse menino do vizinho é um subversivo desgraçado. Não pergunta nada a ele não. Quando ele vier atender a porta, o senhor vai logo tacando a mão nele".

Cristina Serra: 'Tire o seu rosário do meu ovário!'

Folha de S. Paulo

As condições que permitem aborto no Brasil não dão conta da nossa realidade

Neste mês em que celebramos conquistas das mulheres, tivemos aqui no Brasil demonstrações ultrajantes do quanto regredimos em respeito às nossas lutas e reivindicações. E aqui peço licença ao leitor para me incluir no texto como sujeito do coletivo maior: mulheres que lutam para ocupar espaços em sociedades ainda marcadamente patriarcais.

O tratamento degradante a nós dirigido vem do mesmo caldo onde fermentam Bolsonaro e outras figuras repulsivas, como o deputado paulista que escarneceu de refugiadas de guerra, na Ucrânia, e o procurador-geral da República. Augusto Aras disse o que entende por liberdade de escolha para as mulheres: nós podemos decidir a cor do esmalte e o sapato que queremos usar.

Joel Pinheiro da Fonseca: O que fazer com o preço combustíveis?

Folha de S. Paulo

Governo deve, acima de tudo, proteger os mais vulneráveis

Com a guerra na Ucrânia, fica em risco a oferta futura de petróleo e gás. Com isso, o preço deles aumenta desde já. E isso impacta diretamente a economia brasileira, que depende de petróleo. Ou seja, o país fica mais pobre.

Esse custo é inevitável. A única questão é quem pagará por ele. O Estado pode —e às vezes deve— redistribuir os custos, mas eles não deixam de existir. Todas as medidas em discussão (inclusive não fazer nada) têm seus ganhadores e seus perdedores. Não há uma solução em que ninguém sofra com o aumento da gasolina no posto sem que alguém pague essa conta.

E quem, acima de tudo, não deveria pagar a conta? Os mais pobres. Toda resposta ao petróleo mais caro deve incluir mecanismos para proteger os mais vulneráveis.

Andrea Jubé: Uma eleição entre o ideal e o pragmático

Valor Econômico

“Cidadão de bem” é consenso entre esquerda e direita

 “Eu não escolho lados, eu escolho oportunidades”. A frase é atribuída ao gângster Meyer Lansky (1902-1983), um imigrante russo, que se tornou um dos criminosos mais perseguidos pela polícia americana (FBI) ao acumular uma fortuna de mais de US$ 300 milhões, fruto de suas escolhas não convencionais. O ator Harvey Keitel, que o interpretou no cinema, concorre ao Oscar 2022 pelo papel.

Vertendo-se a máxima do personagem à realidade política brasileira, vale indagar: na eleição de outubro, o eleitor vai escolher um lado, ou uma oportunidade? Definirá o voto impulsionado por uma determinada ideologia, ou embalado pela perspectiva de melhora de vida?

O Instituto Locomotiva foi a campo investigar se o eleitor brasileiro tem lado na política, ou o que pesa em sua decisão dentro da cabine eleitoral são os dramas cotidianos, como o preço dos alimentos, do gás de cozinha, e, claro, da gasolina ou do diesel. O eleitor brasileiro é um radical ou um pragmático?

Maria Clara R. M. do Prado: Entre o bélico e o planeta, dilema da EU

Valor Econômico

Guerra é ponto de inflexão de um modelo de governo do Estado Social para um padrão que prioriza as despesas militares

Dois anos depois de uma pandemia que continua a matar em algumas regiões do globo, a guerra na Ucrânia veio afundar as expectativas de crescimento econômico e de prosperidade mundial neste fatídico 2022, mas isso está longe de ser tudo.

Independente de quem seja o vencedor do conflito detonado por Putin, a guerra já tomou proporções suficientes para ser o ponto de inflexão de um modelo de governo fundado no Social State (Estado Social) para um padrão que priorize as despesas militares nos orçamentos públicos. Pior ainda, o novo paradigma comprometeria os projetos destinados a substituir as fontes poluentes pela produção de energia limpa, especialmente na Europa.

A iniciativa do governo alemão de dobrar os gastos com defesa este ano e de destinar mais de 2% do seu PIB àquela rubrica (hoje equivale a 1,53% do PIB) até 2024 é emblemática. Também a cúpula da União Europeia (UE) já anunciou que vai ampliar o orçamento destinado à defesa do bloco.

Daniela Chiaretti: Amazônia: decifra-me ou te devoro

Valor Econômico

Agenda ambiental não é preocupação dos eleitores das capitais na Amazônia nem prioridade das Assembleias Legislativas

Embora a floresta amazônica seja o lado do Brasil que mais está sob os holofotes globais nos últimos anos, as Assembleias Legislativas dos nove Estados da Amazônia Legal não priorizam a proteção do território, as estratégias de desenvolvimento sustentável e a agenda ambiental em suas propostas de leis. Os grandes partidos políticos patinam na maioria dos Estados e municípios enquanto a região assiste a uma grande ampliação da direita e do apoio a grêmios políticos nanicos. A questão ambiental não está no horizonte das preocupações dos eleitores das capitais. Eles não demonstram ter identidade amazônica.

“É uma região que tem que ser politicamente entendida. Que morfologia social é esta que torna inóspito o terreno para os partidos tradicionais e a esquerda?” questiona o cientista político Fabiano Guilherme Mendes Santos, hoje um dos pesquisadores que mais mergulham no entendimento do espectro político da maior floresta tropical do mundo, território que é metade do Brasil.

Aylê-Salassié Filgueiras Quintão*:"Pacote do veneno": a economia brasileira precisa ser reinventada

A fragilidade da economia brasileira diante da globalização é tamanha que qualquer conflito fora de suas fronteiras - não importa a distância: no planeta - afeta diretamente o sistema produtivo interno. Os efeitos negativos chegam rápido ao consumidor.  Pois, não é que a guerra entre a Rússia e a Ucrânia vai impactar por aqui a inflação, o consumo de alimentos, inclusive a cesta básica, a política ambiental e tende a tirar a tranquilidade até dos índios.  

Na agenda do Congresso dois projetos de lei prometem ajudar a agitar o cenário: o PL 6299/2022, chamado 'Pacote do Veneno", que amplia a legitimidade do uso de agrotóxicos na agricultura; e o PL 191/2020, flexibilizador das regras para as empresas mineradoras para explorar minério em terras indígenas.   Cerca de 240 áreas   estão na mira do PL.

Como se sabe, com toda riqueza mineral revelada no País há mais de 40 anos, por um projeto que se chamou "Radam" (radametria), as reservas minerais brasileiras passaram a ser referência entre as maiores do mundo.    Mas, em se tratando de compostos minerais para a produção de fertilizantes NPK (nitrogênio, potássio, e fósforo), que dá o impulso à produtividade agrícola e à nossa produção, as reservas brasileiras conhecidas tem possibilidade de suprir apenas até 40 % das demandas atuais da agricultura. 

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

EDITORIAIS

O impacto da educação é inequívoco

O Globo

Até há não muito tempo, o Brasil não fazia ideia do que se passava em suas salas de aulas. Sem medir, não havia diagnóstico possível. Uma das conquistas do país nas últimas três décadas foi a implementação de testes e índices para acompanhar a qualidade das escolas. Esse trabalho crucial acaba de ganhar uma contribuição. Um novo estudo da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (USP) em Ribeirão Preto e do Insper criou um novo indicador, batizado Ideb-Enem, para medir a qualidade da educação do ensino fundamental ao médio. De modo pioneiro, os pesquisadores relacionaram esse índice aos indicadores sociais em nível municipal. O resultado confirma o efeito positivo dos investimentos em educação e demonstra mais uma vez por que se trata da área mais crítica para o futuro do país.

Poesia | Bertold Brecht: As boas ações

Esmagar sempre o próximo

não acaba por cansar?

Invejar provoca um esforço

que inchas as veias da fronte.

A mão que se estende naturalmente

dá e recebe com a mesma facilidade.

Mas a mão que agarra com avidez

rapidamente endurece.

Ah! que delicioso é dar! Ser generoso

que bela tentação!

Uma boa palavra brota suavemente

como um suspiro de felicidade!