segunda-feira, 2 de maio de 2022

Opinião do dia – Rodrigo Pacheco*: manifestações 1º de Maio

“Manifestações populares são expressão da vitalidade da Democracia. Um direito sagrado, que não pode ser frustrado, agrade ou não as instituições. O 1o de maio sempre foi marcado por posições e reivindicações dos trabalhadores brasileiros.

Isso serve ao Congresso, para a sua melhor reflexão e tomada de decisões. Mas manifestações ilegítimas e antidemocráticas, como as de intervenção militar e fechamento do STF, além de pretenderem ofuscar a essência da data, são anomalias graves que não cabem em tempo algum.”

*Rodrigo Pacheco, senador(PSD-MG), presidente do Senado, presidente do Congresso Nacional, ontem, no Twitter.

Paulo Fábio Dantas Neto*: Banho de urna para o Brasil ficar no purgatório

Sei que o título desta coluna, embora fale de urna, não é sedutor, pelo déficit de esperança que aparentemente carrega. De fato, observado o que ocorre e o que pode ocorrer na política brasileira, vejo que o melhor futuro do presente é ser um presente contínuo. Explico: a terra mais firme à vista é uma ilha ameaçada por lavas de vulcão ainda durante um tempo indeterminado. Mas ilha ao menos um pouco mais distante da porta do inferno, onde nos encontramos agora. A expectativa otimista e, ao mesmo tempo, razoável é que haja eleições normais, que o resultado do pleito presidencial se oponha ao de 2018 e que ele prevaleça contra ações golpistas, que já se encontram em fase avançada de testes. A seguir tentarei argumentar que esse pouco não é só mais do mesmo. Portanto, deve nos incitar a agir. Dentro dos estreitos limites em que o Brasil respira, é um horizonte esperançoso, sem ser delirante.

Começo contando como assisti Gilberto Gil, nosso mais recente imortal, apresentar-se, na última sexta-feira, 29, na Concha Acústica do Teatro Castro Alves. Show a ser guardado na memória. Primor de tempestividade política sem pronunciamento que a formalizasse. Escolheu a dedo, para o começo, um repertório que a maioria da plateia ouviu e cantou sentada, o que já foi – tratando-se de Gil, cantando na Bahia – um sinal de que a noite não seria trivial. Quem tem mais de 60 anos, mais perto ou além dos 70, ouviu e viu o artista como se sua voz ainda tivesse a potência exortadora dos seus vinte e poucos anos. Tempo de sombras, então desafiados, agora evocados por Gil, cantando como quem dá um recado. Esse começo durou sete ou oito músicas, o introito acabou e ele subiu ao palco para valer. A comunicação direta com o momento coletivo mostrou aquele senhor artista cheirando a talco compartilhando com o seu público de todas as idades, agora de pé, o desejo de ver o inferno fora daqui! Nesse grito não havia crença nem programa, apenas desejo, necessidade e vontade titânicos de alívio do momento opressivo.

Fernando Gabeira: A liberdade do lobo e a morte do cordeiro

O Globo

‘A liberdade do lobo quase sempre significa a morte do cordeiro.’ Essa frase de Isaiah Berlin volta a circular no momento em que a liberdade de expressão torna-se um debate global. Nos EUA, foi intensificado com a compra do Twitter por Elon Musk. No Brasil, é o pretexto de Bolsonaro para perdoar um deputado.

Acho interessante que o pensamento de Isaiah Berlin sobre liberdade volte a ser estudado. Confesso que, há muitos anos, tinha uma certa resistência aos textos de Berlin. Ele desmontava de uma forma implacável o romantismo revolucionário que existia em mim. Foi muito bombardeado pela esquerda, sobretudo a partir da Rússia, por causa de sua amizade com artistas perseguidos pelo stalinismo, como a poeta Anna Akhmátova.

Por que, entre tantos liberais, Isaiah Berlin merece ser descoberto? Ele, de uma forma brilhante, compreendeu que as liberdades humanas não formam um todo harmonioso: podem entrar em conflito umas com as outras e, quando o fazem, devemos escolher entre elas. A inspiração de Berlin foi lutar contra o totalitarismo que falha em proteger liberdades específicas, mas também suprime a própria possibilidade de liberdade.

Demétrio Magnoli: STF, Silveira & Sands

O Globo

Bobby Sands, irlandês, católico, militante do IRA, morreu aos 27 anos, em maio de 1981, em consequência de uma greve de fome de 66 dias na prisão de Maze. No 40º dia da greve de fome, foi eleito para a Câmara dos Comuns por um distrito da Irlanda do Norte. O Reino Unido, onde fica o mais antigo Parlamento do mundo, não vetava mandatos parlamentares de prisioneiros que cumpriam sentença. Quando debate as implicações da crise gerada pelo caso Daniel Silveira, o STF precisa estudar o episódio de Sands.

Silveira ocupa a extremidade de um longo fio de crise institucional desenrolado a partir do “petrolão”. No vácuo aberto pela corrupção crônica e pela Operação Lava-Jato, o STF subiu uma escadaria de incêndio e, em meio à desmoralização da elite política, reinventou-se como Poder Moderador. A aventura de concentração de poder conduziu os juízes a romper um limite constitucional sagrado, por meio do sequestro do direito de cassar mandatos parlamentares.

Carlos Pereira*: Presidencialismo multipartidário ficou refém ou é reversível?

O Estado de S. Paulo

Uma boa gerência de coalizão cria condições para a sustentabilidade democrática e inclusão social responsável

Até que ponto o equilíbrio da Constituição de 1988 e do Plano Real, caracterizado pelo tripé inclusão social, responsabilidade macroeconômica e democracia, estaria ameaçado?

Meu colega Marcos Mendes, um dos maiores especialistas em contas públicas, acredita que existem problemas estruturais que estariam colocando em risco tal equilíbrio. Na sua coluna na Folha de S. Paulo (22/04/2022), Marcos vaticinou que, diante do enfraquecimento do Executivo na política orçamentária e do baixo crescimento econômico, as condições de governabilidade estariam se deteriorando e que problemas institucionais se avizinhariam.

Marcos tem razão ao expressar preocupação com a perda de discricionariedade do presidente no orçamento. Hallerberg e Marier já haviam demonstrado que um Executivo forte, via centralização do processo orçamentário, é a chave para reduzir déficit público e gerar políticas públicas universais, especialmente em sistemas eleitorais proporcionais de lista aberta para o Legislativo que estimula paroquialismos, como é o brasileiro.

Bruno Carazza*: O que Janones tem a ensinar sobre a política

Valor Econômico

Políticos tradicionais não conseguem se conectar com o eleitor

Eu tenho um grande amigo que diz que a única dúvida dele sobre as eleições deste ano é se Janones ficará em terceiro ou quarto lugar na disputa pela Presidência. A frase, que poderia soar como ironia, expõe uma dura realidade sobre a política brasileira.

No último Datafolha, o deputado André Janones (Avante-MG) apareceu entre os cinco primeiros candidatos na pesquisa espontânea - bem atrás de Lula e Bolsonaro, mas empatado dentro da margem de erro com Sergio Moro e Ciro Gomes -, o que é um feito notável para um político novato, vinculado a um partido nanico e que há apenas três anos chegou a Brasília para o seu primeiro mandato eletivo.

Na maioria das pesquisas recentes, Janones pontua à frente de políticos muito mais experientes e conhecidos, como os ex-governadores João Doria (PSDB-SP) e Eduardo Leite (PSDB-RS), a senadora Simone Tebet (MDB-MS) e o deputado federal Luciano Bivar (União Brasil-PE).

Sergio Lamucci: Economia mostra melhora, mas situação segue delicada

Valor Econômico

Cenário é difícil, em especial devido à inflação elevada

O desempenho da economia brasileira no primeiro terço do ano aponta para um cenário um pouco mais positivo em 2022 do que se projetava no fim de 2021. A atividade econômica teve um crescimento um tanto mais forte nos primeiros meses deste ano, com um resultado melhor do que se esperava no mercado de trabalho. A situação, porém, segue delicada, principalmente devido à persistência e disseminação das pressões inflacionárias, o que corrói o poder de compra da população e deverá exigir juros mais altos por mais tempo. Taxas mais elevadas obviamente afetarão a atividade, em especial a partir do segundo semestre, dado o efeito defasado de mudanças na Selic.

Além disso, o cenário externo está longe de ser tranquilo. A guerra entre Rússia e Ucrânia elevou o risco na economia global e encareceu as commodities, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) se prepara para acelerar o ritmo de alta dos juros e a China adota medidas rigorosas de restrição à mobilidade social para tentar deter o avanço da covid-19, com impacto óbvio sobre o ritmo de expansão da economia local - e por tabela, da mundial.

Celso Rocha de Barros*: Jair quer criar o Exércentrão

Folha de S. Paulo

Militares aceitam ser arma do latrocínio que Bolsonaro comete diariamente?

Daniel Silveira é o novo vice-presidente da comissão de Segurança da Câmara. Ganhou o cargo como recompensa porque ameaçou de morte os ministros do STF, foi condenado à cadeia e perdoado pelo presidente da República.

O que entusiasmou seus colegas de Parlamento foi o precedente jurídico que o caso Silveira estabeleceu: de agora em diante, está decidido que presidentes podem soltar aliados condenados pela Justiça.

STF não reagiu à provocação do presidente da República porque teme que as Forças Armadas deem um golpe de Estado em apoio a Bolsonaro. Ninguém tem medo do Jair. O medo é do Exército. Como se viu no último 7 de Setembro, quando o Exército não aparece para brigar por ele, Jair se senta no chuveiro e chora.

Marcus André Melo*: A imunidade parlamentar gera corrupção e abuso?

Folha de S. Paulo

Sonho paraguaio de imunidade vitalícia é o canto das sereias de aspirantes a autocrata

É intuitiva a noção de que as imunidades são precondição para o exercício da atividade política nas democracias. Como podemos concebê-la se há espaço para retaliação política pelos governantes? Ou ainda sem plena liberdade de expressão? Mas é inegável que ela cria incentivos para o arbítrio e a corrupção.

Chafetz mostrou que duas tradições informaram os dispositivos legais para as imunidades nos EUA e no Reino Unido. A primeira delas, a versão forte do princípio que a soberania parlamentar deve prevalecer em relação a qualquer agente externo, inclusive tribunais, predominou até o século 19; na segunda, a soberania é exercida contra o monarca mas também sobre parlamentares. O Judiciário é visto aqui como potencial agente do povo.

Ana Cristina Rosa: A que ponto chegamos

Folha de S. Paulo

Mesmo com inflação e desemprego, a distopia tem demonstrado concretude perturbadora

No Dia do Trabalhador, um país forjado sobre os pilares da escravização e que desde a década de 1990 reconhece oficialmente perante a comunidade internacional a existência de trabalho forçado em seu território deveria ir às ruas para exigir respeito e geração de trabalho decente para a população.

Mesmo diante da maior prévia da inflação mensal em 27 anos, da queda no salário médio e de uma multidão de desempregados estabilizada na casa dos 12 milhões, no Brasil a realidade parece ter decidido competir com a ficção dada a quantidade e a proporção de despautérios. E a distopia tem demonstrado uma concretude perturbadora.

Ruy Castro: Em dias mais felizes

Folha de S. Paulo

Bom saber que o Brasil é craque em aviõezinhos de papel

Há duas semanas, o Museu do Amanhã, aqui no Rio, abrigou a decisão da etapa brasileira do Campeonato Mundial de Aviãozinho de Papel. Não ria. Os vencedores foram Pedro Capriotti e Isaac Queiroz, paranaenses. Pedro foi o campeão na modalidade tempo no ar, com 7s61, e Isaac, na de distância percorrida, com 40,3 metros. Eles derrotaram 600 concorrentes em eliminatórias disputadas durante meses pelo país. Os dois partem agora para representar o Brasil na grande final em Salzburgo, Áustria, contra 60 países.

Se você acha o assunto irrelevante, experimente fazer um aviãozinho de papel —sabe fazer um, não?— e atirá-lo. Aposto que ele subirá meio metro, se tanto, e descerá vergonhosamente de bico contra o chão. Na mão dos campeões, no entanto, a aeronave já parte sabendo a distância a atingir e o tempo a se manter em voo. E, se o vento e a pressão atmosférica forem favoráveis, eles se arriscam até a piruetas. É um esporte, e proponho a sua inclusão nos próximos Jogos Olímpicos.

Marcello Serpa: O vírus e o mundo corporativo

O Globo

Depois de dois anos de pandemia, trabalho remoto e escritórios vazios, não parece coincidência duas séries excelentes retratarem o lado surreal do mundo corporativo.

“Severance”, criada por Dan Erickson e produzida por Ben Stiller, é uma obra-prima distópica tão estranha quanto imperdível. Uma empresa fictícia, Lumon, cria uma tecnologia que permite ao funcionário separar a vida particular do trabalho, literalmente. Um chip implantado na cabeça dos funcionários divide a consciência em duas, eles não lembram nada da vida pessoal enquanto no escritório e, quando fora, não recordam o que aconteceu no trabalho.

Os personagens principais são quatro funcionários trabalhando em cubículos apertados no centro de uma enorme sala vazia. Passam o dia digitando números sem sentido, falando abobrinhas sobre a vida do escritório, ganhando incentivos inúteis ao superar metas invisíveis, supervisionados por um chefe de sorriso branco e frio como uma lâmpada fluorescente numa mistura de terror com a mais fina ironia.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

O papel do Supremo na democracia

O Estado de S. Paulo

STF está sob ataque. Os cidadãos precisam entender o que está em jogo quando isso acontece e por que defender a instituição é o mesmo que defender a liberdade e a paz social

O Supremo Tribunal Federal (STF) está sob ataque. Real e simbólico. Não há outra forma de descrever as ações hostis e o desrespeito a decisões da Corte por parte do presidente Jair Bolsonaro e de parlamentares e lideranças do Congresso. O momento é gravíssimo. O País não assistia a uma afronta tão desabrida à instância máxima do Poder Judiciário desde o conflituoso mandato do presidente Floriano Peixoto (1891-1894). O “Marechal de Ferro” não era um democrata e fazia pouco-caso da tripartição dos Poderes da República e do sistema de freios e contrapesos. Assim como Bolsonaro.

Os cidadãos precisam ter em conta o que está em jogo quando o Supremo é atacado, seja por meio de ameaças explícitas ou veladas a seus ministros, servidores e familiares, depredações de suas dependências físicas ou pelo descumprimento puro e simples de suas decisões. Em outras palavras: é preciso entender qual é o papel de uma Corte Suprema na democracia e por que defender a instituição é o mesmo que defender a manutenção das liberdades civis e da paz social.

A Constituição, em seu artigo 102, delega sua guarda ao Supremo. Do ponto de vista prático, “guardar” a Constituição significa interpretar o seu texto e ter a palavra final diante de conflitos em torno de nosso pacto social. Quando o Supremo é desqualificado como última instância com poder para dirimir esses conflitos e pacificar a sociedade, rui a própria ideia da Justiça como um avanço civilizatório. A partir daí, vale tudo, não há mais limites. Comandos legais correm o risco de perder valor. Em casos extremos, cidadãos podem olhar para esse processo de deslegitimização do Supremo – liderado por altas autoridades da República, que deveriam servir como modelos de cidadania e respeito às leis – como uma espécie de autorização tácita para resolver suas contendas particulares da forma que bem entenderem, inclusive pela imposição da força bruta.