segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Irapuã Santana - Colapso geral

O Globo

Por que não evitaram que isso tudo acontecesse? Quem deixou livremente a organização do grupo violento surgir?

No dia 8 de janeiro, o país ficou atônito ao ver cenas de depredação na capital federal. Pessoas invadiram os prédios dos Três Poderes da República e destruíram tudo o que viam pela frente.

Segundo reportagens, um dia antes, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) havia encaminhado vários avisos a quase todos os órgãos alertando sobre o que ocorreria naquele fatídico domingo.

Foi o dia em que tivemos uma amostra do que é terrorismo doméstico, que, conforme define o FBI (a polícia federal americana), pode se verificar por meio de “atos violentos e criminosos cometidos por indivíduos e/ou grupos para promover objetivos ideológicos decorrentes de influências domésticas, como as de natureza política, religiosa, social, racial ou ambiental”.

Sabendo que havia nos acampamentos muitas mulheres, crianças e até idosos com comorbidades, permanecem muitas perguntas sem respostas sobre como as autoridades distritais e federais deixaram a situação chegar a tal ponto de gravidade.

Por que não evitaram que isso tudo acontecesse? Quem deixou livremente a organização do grupo violento surgir? Como vários ônibus transitaram livremente até chegar ao ponto do quebra-quebra?

As investigações precisam buscar todas as pessoas e autoridades que contribuíram por ação e por omissão para a desordem.

É preciso lembrar da Lei 14.197/2021, que trata dos crimes contra o Estado Democrático de Direito, onde está previsto o crime de “Abolição violenta do Estado Democrático de Direito”, que consiste em “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”. Além dele, há o crime de golpe de Estado, que é configurado ao “tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído”.

Há outra particularidade que precisamos analisar, os chamados atos preparatórios, que antecedem a execução do crime. Segundo as regras do Direito Penal, eles somente são puníveis quando correspondem a um tipo penal autônomo, como adquirir uma arma sem a devida autorização com a finalidade de cometer um roubo.

Entretanto, no caso de terrorismo, há uma exceção, que permite a repressão do Estado. Mas, como nada é simples, o artigo 2º da Lei 13.260/16, que disciplina a matéria, não se encaixa nos fatos de 8 de janeiro, porque a lei menciona que os motivos de “xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião” são imprescindíveis para a sua configuração.

Assim, resta a previsão contida na Lei 12.850/13, que trata das organizações criminosas. No seu artigo 2º, “promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa” é crime, traz uma conduta específica e atendendo a todos os princípios do Direito Penal.

Dessa forma, é perfeitamente possível chamar o ocorrido de terrorismo doméstico, mas sabendo que, dentro da sistemática do Direito brasileiro, não há crime de terrorismo, o que, por sua vez, nunca foi obstáculo para que as autoridades interferissem para evitar todos os danos ocorridos, tendo em vista que não se tratava apenas de atos preparatórios, mas sim de condutas plenamente puníveis dentro do nosso sistema jurídico.

 

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