Folha de S. Paulo
Como todo termômetro, ele não retrata a realidade
em todos os seus aspectos
No dia seguinte à invasão dos
prédios dos três Poderes por extremistas, a Bolsa subiu. Para
essa entidade misteriosa chamada "O Mercado", essa invasão parece não
ter importado muito. O mesmo mercado, contudo, cai quando Lula fala
contra a responsabilidade fiscal e a favor de combater a fome. Afinal, há algo
de profundamente imoral no mercado?
De maneira geral, o mercado é um processo social essencial para a vida em sociedade. Todo mundo que mexe com dinheiro —que trabalha, compra e vende— participa dele. Claro que, quando uma manchete de jornal se refere a "o mercado", não é a esse processo social que envolve todos —do operário ao magnata—, e sim a uma peça dele: o grupo das pessoas que faz decisões de investimento no mercado de capitais: compra e vende ações, moedas, derivativos.
A pergunta que guia suas decisões é: dada a
informação disponível, este ativo me trará um retorno futuro maior (a valor
presente) do que seu preço atual? Se sim, é hora de comprar. Todos estão
buscando multiplicar seu dinheiro —que é o dinheiro de milhões de pessoas que
poupam e esperam, justamente, que seus investimentos rendam.
Essas avaliações são passíveis de crítica.
O mercado é formado por seres humanos. Eles têm suas limitações cognitivas,
suas ideologias, seus vícios. Erram. Pode ser que os investidores tenham
subestimado o risco de um golpe no Brasil ou a magnitude de suas consequências.
O forte do mercado é que, e para lucrar, é necessário justamente identificar
esses erros de avaliação antes da maioria. Com esse incentivo constante a
identificar erros de precificação e explorá-los com vistas ao ganho, está dado
o mecanismo para a autocorreção.
Outro tipo de crítica é moral: ressaltar o
ultraje que é ver o mercado otimista ao mesmo tempo em que, por exemplo,
pessoas passam fome. Esse tipo de crítica, penso, é válida contra aqueles que
reduzem a realidade aos indicadores do mercado. Há uma série de considerações
éticas, humanitárias e sociais mais importantes que o Ibovespa.
Mas é uma crítica equivocada se julga que os próprios indicadores deveriam
mudar para refletir as considerações éticas e humanitárias.
A subida do Ibovespa não apaga o sofrimento
de milhões de pessoas com a fome ou as ameaças à democracia. Mas a queda desse
índice tampouco ajudaria a remediar os problemas.
Num mundo melhor, as pessoas sentiriam
repulsa e se recusariam a investir em negócios ou mesmo governos cujas práticas
são condenáveis ou que nada fizessem para remediar os males da sociedade. Elas
aceitariam inclusive ganhar menos dinheiro para agir dessa forma.
E até existem algumas iniciativas nesse
sentido, como fundos ESG. Mas são iniciativas sempre marcadas por dificuldades.
Basta imaginar: se mesmo para você, leitor ético e comprometido com as causas
sociais, é difícil escolher pagar a mais para ter um produto mais ético, ou
aceitar rendimentos menores de suas aplicações para investir de maneira mais
ética, quanto mais não seria para os milhões de investidores sem o mesmo grau
de conscientização?
Enquanto esse dia não chega, cabe defender
regras que ajudem a alinhar interesses privados e públicos e lembrar sempre que
o mercado não passa de um termômetro. Como todo termômetro, ele mede uma
variável, não retrata a realidade em todos os seus aspectos. Se o paciente está
desnutrido, mas sem febre, o termômetro mostrará saudáveis 36ºC. Não quer dizer
que esteja tudo bem, e nem que você deva se revoltar contra o instrumento.
Pouco correta a metáfora do colunista para o mercado como termômetro! Este é um instrumento INDEPENDENTE do corpo ou local cuja temperatura é medida. O mercado é MUITO MAIS que um termômetro, é PARTE da atividade econômica de quase todos os países, e influencia diretamente nesta atividade!
ResponderExcluirBobagens como esta costumam acontecer quando colunistas se arriscam a escrever fora das suas áreas de conhecimento!
Joel Pinheiro da Fonseca.
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