O Estado de S. Paulo.
A democracia brasileira precisa de parlamentares fiéis e de partidos com atuação consistente
Partidos políticos estão para a democracia
assim como os alicerces, para um prédio. Sem eles, o edifício das instituições
desaba.
Em democracias que pontuam melhor que a
nossa em rankings internacionais, como as da Europa Ocidental, os partidos têm
programas sólidos e seguidores fiéis. A maior parte dos eleitores vota no
centro político, em geral dominado por um partido de centro-direita e um de
centro-esquerda. Há também partidos de nicho, como os que defendem o meio
ambiente ou grupos específicos da sociedade.
Num livro clássico sobre o assunto, os cientistas políticos David Samuels e Cesar Zucco mostram que o Brasil tem uma única sigla com um número significativo de eleitores fiéis ao longo do tempo: o PT, de centro-esquerda. Não surgiu um partido com peso equivalente à direita. Isso deixa o campo liberal e conservador vulnerável a aventureiros.
Para resolver esse problema, o cientista
político Antonio Lavareda tem uma proposta: instituir o voto em lista ordenada,
seguindo o exemplo dos países europeus. Nas eleições legislativas, em vez de
escolher uma pessoa – um deputado ou senador – o eleitor escolheria um partido.
As siglas teriam um número de parlamentares proporcional à sua votação,
ordenados de acordo com uma lista prévia.
“Seria mais fácil para os eleitores
fiscalizarem seus representantes. E seria mais difícil os representantes
mudarem de lado, traindo a confiança de quem votou neles”, diz Lavareda,
entrevistado no minipodcast da semana. Em países como a Alemanha, o voto
ordenado permite ainda que as siglas listem especialistas em várias áreas –
saúde, educação, etc. –, melhorando a qualidade da representação e do debate.
A maior vantagem seria o fortalecimento dos
partidos políticos. “Numa democracia sólida, as siglas refletem as diversas
posições do debate público”, diz Lavareda. “Num sistema como o brasileiro, o
que vemos é um amontoado de empreendedores políticos individuais.”
A democracia brasileira precisa de
parlamentares fiéis, que não traiam seus eleitores em troca de oportunidades de
corrupção. E de partidos com programa e atuação consistentes, capazes de atrair
eleitores que votam neles a vida inteira, como acontece na Europa.
O projeto de Lavareda pode ser um incentivo
para o surgimento de partidos robustos, dos quais os eleitores se orgulham e
com os quais se identificam. A alternativa a isso é uma situação em que
políticos mudam de lado o tempo todo e os eleitores não confiam neles, a ponto
de esquecer em quem votaram para deputado e senador. E assim a democracia
tomba, carcomida a partir de seus alicerces.
*Escritor, professor da Faap e doutorando
em ciência política na Universidade de Lisboa
Verdade.
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