Folha de S. Paulo
Taxas de curto prazo caem; corte da Selic
pode vir antes do que se previa até semana passada
Além de rumores e temores, aparecerem mais
sinais de que a assim chamada crise de crédito na economia brasileira vai além
dos problemas causados por uma alta forte e duradoura da taxa básica
de juros e do aperto no crédito bancário. A fraude nas Americanas e
sufocos de endividamento de outras grandes empresas secaram o mercado em
fevereiro.
Essas notícias de seca de financiamento e os sinais de resfriado da economia contribuem para derrubar as ainda altíssimas taxas de juros no atacado do mercado de dinheiro. Neste meio de semana, as taxas de mercado passaram a indicar que se acredita em um corte da Selic, a "taxa do BC", antes de setembro. É mudança grande em relação à virada do mês.
Em fevereiro, houve um tombo feio na
quantidade de dinheiro que as empresas levantam no mercado de capitais. Isto é,
de captação de dinheiro por meio de títulos de renda fixa, de venda de novas
ações e "híbridos". Em termos simples, "captações de renda
fixa" significa tomar dinheiro emprestado por meio da venda de títulos.
"Em fevereiro, as captações do mercado
de capitais foram de R$ 13 bilhões, o que corresponde a uma queda de 51,2% em
relação ao mês anterior. O resultado representa o volume mensal mais baixo
desde maio de 2020", diz nota da Anbima (Associação Brasileira das
Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), que faz o levantamento
regular desses mercados. Em relação a fevereiro de 2022, o tombo foi de 73%.
Talvez se queira dourar um pouco essa
pílula dizendo que o valor total de captações é volátil (variam de modo
relativamente grande de mês a mês). Na comparação com períodos mais antigos,
como 2020, pesa o fato de que o mercado de venda de novas ações (IPOs e "follow
ons") está quase parado desde o início de 2022 —não foi por causa da
"crise de crédito". São atenuantes irrisórios. Em fevereiro, pelo
menos, a coisa foi feia.
Considere-se o caso da renda fixa, que é o
grosso do mercado de capitais (em média, 76% do valor total das captações de
2016 a 2022). Em fevereiro, as empresas tomaram R$ 11,2 bilhões de empréstimos
por esse meio, por esse instrumento. Em janeiro, haviam sido R$ 23,4 bilhões.
Em fevereiro do ano passado, R$ 36 bilhões. Na média mensal de 2022, R$ 38
bilhões.
Aconteceu alguma coisa, é fácil perceber.
Mesmo para empresas que têm condições de ir
a mais mercados de dinheiro, a bancos e de capitais, portas se fecharam ou os
preços são proibitivos. Talvez não seja óbvio lembrar que as empresas vão ao
mercado não apenas para levantar recursos para expansão de negócios, mas para
rolar dívidas ou adequar seus prazos e custos. Quem estava com água pelo nariz
pode ter (mais) problemas.
Pode ser que a névoa sobre o futuro da
política econômica do governo Lula
3 tenha contribuído para mais esse aperto financeiro. Mas a
dita incerteza já estava escancarada em novembro ou dezembro.
Em resumo, a fraude das Americanas e outros
pedidos de recuperação
judicial de empresonas acenderam o alerta, um tanto óbvio, de
que taxas de juros altas em uma economia de baixíssimo crescimento dão
problema. E daí?
Estresse em empresa, resfriado econômico à
vista e certa "fé" no pacote fiscal de Fernando Haddad têm derrubado
as taxas de juros de um ano, que nesta
quarta-feira (8) caíram abaixo de 13%. Para prazos de dois anos ou
mais, continuam mais altas do que as registradas no início de novembro, quando
começaram os discursos de Lula contra limite de gastos e juros do BC. Ainda
assim, algo mudou.
Lendo e aprendendo.
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