Folha de S. Paulo
Ex-presidente tenta equilibrar afagos a
ex-auxiliar e sinais para que ele assuma culpa
Jair
Bolsonaro não deve estar dormindo muito bem. A privação de sono talvez
ajude a explicar a atitude desconcertada do ex-presidente quando tenta se
desviar das acusações que recaem sobre o tenente-coronel Mauro
Cid ou explicar a relação com aquele que era seu braço direito no
Palácio do Planalto.
Bolsonaro faz uma caminhada trôpega sobre uma corda bamba. Desde que Cid foi preso por falsificar o cartão de vacinação do chefe, o ex-presidente tenta manter distância dos atos praticados pelo ajudante de ordens. Ao mesmo tempo, faz acenos para evitar que o ex-auxiliar se sinta abandonado e resolva contar o que viu no gabinete presidencial.
O ex-presidente exibiu sinais dessa
vacilação ao longo da semana. Numa
entrevista dada à revista Veja na quarta-feira (18), Bolsonaro praticamente
reconheceu que houve crime ("Ao que tudo indica, alguém fez
besteira") e insinuou que o alvo deve ser apenas Cid ("Não quero
acusá-lo de nada"). Depois, elogiou o ex-auxiliar e disse considerá-lo
"um filho".
O comportamento se manteve no dia
seguinte, numa
passagem de Bolsonaro pelo Congresso. O ex-presidente afagou o subordinado
("Foi um excelente oficial do Exército"), mas também fez questão de
manter o abacaxi no colo de Cid ("Peço a Deus que ele não tenha errado, e
cada um siga sua vida").
Entre a entrevista e a visita de Bolsonaro
ao Congresso, Cid foi à sede da PF para prestar depoimento, mas preferiu
ficar em silêncio. A decisão claramente não tranquilizou o ex-presidente,
já que a expectativa era que o auxiliar assumisse a culpa de uma vez,
descartando a possibilidade de implicar o antigo chefe.
O nervosismo de Bolsonaro é nítido porque Cid guarda os piores segredos do gabinete presidencial. O ex-ajudante de ordens foi personagem do plano golpista do ex-presidente, da tentativa de ficar com as joias sauditas e do uso de dinheiro vivo pela então primeira-dama. Uma generosa (e excessiva) quebra de sigilo autorizada pelo STF já começou a abastecer essas investigações.
A lei do carma é infalível.
ResponderExcluir