O Estado de S. Paulo
Um dos aspectos mais peculiares do sistema
multipartidário, seja no parlamentarismo, mas sobretudo no presidencialismo, é
que o chefe do Executivo necessita dispor de moedas de troca para a construção
de maiorias legislativas estáveis e disciplinadas. Quase nunca o programa ou a
ideologia partidária são elementos suficientes para que outros partidos aceitem
fazer parte da coalizão de governo.
Quanto maior e mais diversificada forem as
moedas de troca na “caixa de ferramentas”, maiores as chances de o Executivo
governar por meio de coalizões eficientes. Ou seja, aprovando mais a sua agenda
com menores custos possíveis.
No artigo “Executive Toolbox”, em colaboração com Eric Raile e Tim Power, mostro que cada tipo de moeda de troca (ministérios, emendas parlamentares, cargos na burocracia pública, etc.) no presidencialismo brasileiro tem características próprias que as torna substitutos imperfeitos. A mudança de ministros gera “custos afundados” para o governo e, portanto, proporciona maior eficiência quando implementada para parceiros próximos do presidente; já as emendas orçamentárias são mais flexíveis, permitindo atrair parceiros ideologicamente distantes com um menor impacto nas políticas do governo.
Além disso, a eficiência do uso de moedas
de troca pressupõe a sua distribuição conforme critérios exógenos, isto é, que
levem em consideração a representação de cada parceiro na sociedade, medido
pelo porcentual de cadeiras que ocupa no Legislativo. Seguindo esse critério, o
presidente se protege contra eventuais questionamentos de aliados, tirando a
subjetividade da alocação de recursos. Por outro lado, quanto mais fizer uso de
critérios endógenos aos interesses do presidente e de seu partido, mais
dificuldade terá na gerência de sua coalizão.
Stephen Ansolabehere e seus coautores vão
além. Para eles, o peso real que cada partido traz à mesa de negociação não se
traduz apenas no número de assentos no Parlamento, mas na capacidade de formar
uma coalizão majoritária com a sociedade. É importante que se leve em consideração
a capacidade de alavancagem de um partido na coalizão a partir de seu
comportamento real nas votações.
Ao contrário do que sugerem os autores que
pesquisam gerência de coalizões, o governo Lula 3, a exemplo dos seus dois
governos anteriores, insiste em usar critérios endógenos e desproporcionais na
alocação de moedas de troca. Diante dessas escolhas, um comportamento
crivelmente disciplinado e duradouro de seus parceiros de coalizão é cada vez
menos provável e mais caro.
*Professor titular FGV Ebape, sênior fellow do Cebri e professor visitante da Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne
Minha cultura política é limitada,nem sempre eu entendo tudo.
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