domingo, 2 de julho de 2023

Bernardo Mello Franco – Consciência de perverter

O Globo

Ex-presidente prometeu ressurgir como "cabo eleitoral de luxo", mas ainda tem contas a acertar com a Justiça

No voto que selou a inelegibilidade de Jair Bolsonaro, a ministra Cármen Lúcia afirmou que os atos do capitão expuseram uma “consciência de perverter”. A expressão foi cunhada pelo jurista italiano Francesco Carnelutti (1879-1965). Define a conduta de quem sabe não ter razão, mas age como se a tivesse.

Bolsonaro sabia que as urnas eletrônicas eram confiáveis e podiam ser auditadas. Sabia que seu código-fonte estava aberto a partidos e entidades fiscalizadoras. Sabia que a Justiça Eleitoral não tinha lado — e jamais se prestaria a participar de um complô para prejudicá-lo.

Apesar de saber disso tudo, o capitão tentou convencer os eleitores do contrário. De forma consciente, usou a estrutura da Presidência para propagar mentiras e teorias conspiratórias.

As urnas não foram o único alvo das fake news bolsonaristas. Enquanto esteve no poder, o ex-presidente recorreu ao mesmo expediente para fustigar as universidades, desacreditar a imprensa, acuar os defensores dos direitos humanos e do meio ambiente. A cada passo, buscou fabricar um novo inimigo. Assim manteve viva a aura de político antissistema, mesmo depois de subir a rampa e se instalar no centro do poder.

Foi na pandemia que a consciência de perverter produziu seus danos mais nocivos. Na contramão da ciência, o capitão sabotou as medidas de distanciamento, boicotou o uso de máscaras e liderou uma campanha de desinformação contra as vacinas.

Sua irresponsabilidade favoreceu o vírus e produziu milhares de mortes evitáveis. Esses crimes permanecem impunes graças à inércia da Procuradoria-Geral da República, que engavetou provas e se negou a denunciá-lo.

Ao condenar Bolsonaro, o TSE passou a mensagem de que todo poder tem limites. Um presidente que concorre à reeleição larga em vantagem, mas não pode ignorar a lei e achincalhar as instituições para se perpetuar na cadeira. O mandato não é salvo-conduto para desrespeitar as regras do jogo e conspirar contra a democracia.

A inelegibilidade é um castigo modesto para o conjunto da obra de Bolsonaro. Após o julgamento, o ex-presidente anunciou que seguirá na política como “cabo eleitoral de luxo”. Faltou lembrar que ele ainda responde a uma série de investigações criminais. O desfecho dos casos mostrará se o ministro Alexandre de Moraes estava certo quando disse que a Justiça pode ser cega, mas não é tola.

Partido Militar

O TSE absolveu o general Braga Netto, candidato a vice na chapa derrotada em 2022. Ele também estava na cena do crime eleitoral que motivou a condenação do aliado. Agora está livre para disputar as próximas eleições.

Além de Braga Netto, outros quatro generais participaram do comício no Alvorada. Três eram ministros do capitão: Augusto Heleno, Luiz Eduardo Ramos e Paulo Sérgio Nogueira. O quarto, Luis Carlos Gomes Mattos, presidia o Superior Tribunal Militar.

Férias

O colunista ficará ilegível até o fim do mês.

 

2 comentários:

  1. É bom o criminoso Jair se acostumando com as condenações. Os próximos processos vão levar o canalha pra trás das grades! Quem sabe na Papuda, como previu o grande coronel golpista que mentiu recentemente na CPMI.

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