Folha de S. Paulo
Marcio Pochmann no IBGE não me entusiasma,
mas calma lá!
Já sou velho o bastante para exigir que
governos façam tudo o que quero, ou, então, porrada! —eventualmente engatando a
máxima de Millôr Fernandes, segundo a qual "imprensa é oposição; o resto é
armazém de secos & molhados". Sem contexto, a divisa é uma tolice.
Quem, por "dever de oposição", atacou a recriação de programas
sociais na gestão Lula comportou-se
como cliente da... vendinha bolsonarista.
Pode? Mesmo no terreno das coisas lícitas (na hipótese de que sejam), "nem
tudo me convém", como escreveu um certo Paulo.
Não sei em que ano Millôr fez tal afirmação, mas é provável que falte um regime militar, ou sua herança, para lhe conferir o sentido original. Se jornalismo for só oposição, então é partido. Imprensa há de ser apego aos fatos, sempre considerando que o viés ideológico é imanente à atividade já na definição da pauta. E o jornalismo fotográfico? Lembro as reflexões de Roland Barthes em "A Câmara Clara", seu último livro. Ele chama a atenção para o "punctum" — o ponto, o pedaço de um todo —, que o fotógrafo não viu e que só ganha sentido pelos olhos do "spectator", do "contemplador". Também no caso de um texto, é impossível saber exatamente o que lê um leitor.
Quando se entra na seara da opinião, as
coisas se complicam. Afinal, o analista parte de um recorte, ditado por seu
conjunto de valores; é dotado de quereres e faz prefigurações. No capítulo das
previsões, pode-se estabelecer alguma medida objetiva: ou aconteceu ou não
aconteceu aquilo que ele anteviu como fatal.
Parece-me que parte dos analistas
econômicos anda a operar com uma margem de erro bastante superior à dos
astrólogos. Como estes atuam na esfera da linguagem simbólica e profetizam no
território das metáforas e dos conceitos consolidados (sabemos como é um
leonino...), é, definitivamente, o "spectator" quem determina o
conteúdo de uma predição astrológica, sempre uma "obra aberta".
Pergunto-me se, na ânsia de fugir do "armazém de secos & molhados" —e Millôr não tem nada com isso—, a objetividade possível não está sendo muitas vezes ignorada em nome de convicções e vocações missionárias, como se a política brasileira devesse ser submetida a uma espécie de expedição civilizatória, ditada pela Razão, a maiúscula, oriunda do Empíreo. Ou do "Manual do Perfeito Idiota Liberal Latino-Americano". Quem perde é a precisão.
Márcia Sensitiva antecipou sobre Lula e seu
governo, no canal "Diva Depressão", no dia 30 de dezembro de 2022:
"Ele estava no ano sete e vai entrar no oito no ano que vem. São os dois
melhores anos da vida dele pra grana, pra sorte, pra tudo. (...) Eu só sei que
ele vai ter de se tratar muito a partir do meio do ano, tá? (...) Depois de
abril, as coisas melhoram para o Brasil. Você imagina o sistema nervoso de um
homem desse, ainda mais que ele é do signo de escorpião (...). No começo, a
gente vai dançar um pouco, mas as coisas entram no eixo". Até aqui,
acertou mais do que algumas Cassandras às avessas, especialistas no próprio método.
Uma análise é sempre parcial, como deixo claro. Mas não pode ser arbitrária.
No meu "De Senectute" particular,
relevo os limites da realidade e justifico sem sofismas, por exemplo, a
eventual entrada do PP e do Republicanos
no governo. Para quê? Fosse para um biltre se livrar do impeachment, este
levaria porrada, como já levou. Se for para aprovar reformas que ficariam pelo
meio do caminho sem o centrão, que se faça. Na lojinha de que sou freguês,
inexiste sonho sem feijão.
Para registro: já critiquei duramente, no
passado, o economista
Marcio Pochmann e não vejo ainda motivos para elogiá-lo. Se e
quando vir, eu o farei. Mas evocar até risco de "argentinização"
porque ele vai assumir a presidência do IBGE e poderia, especula-se, manipular
números da economia é um despropósito. Querem o quê? A impossível prova da
inocência antes mesmo do eventual crime? Ademais, o Brasil dispõe de
instrumentos vários para detectar eventuais distorções. Quem tratou o instituto
aos chutes —o Censo só foi realizado por ordem do STF— foi Paulo Guedes, a
serviço do balcão bolsonarista de quinquilharias. Não se ouviu metade da
gritaria de agora.
Pode? Pode. Mas, mesmo no terreno das coisas lícitas, "nem tudo me convém".
Em sua primeira encarnação Reinaldo criticava tudo que vinha do PT,quem te viu e quem te vê!
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