quinta-feira, 13 de julho de 2023

Vinicius Torres Freire - Inflação nos EUA e juros no Brasil

Folha de S. Paulo

Evolução de preços e juros americanos podem dizer algo sobre dólar e juros por aqui

Quem quer que preste alguma atenção a notícias de economia deve ter notado a variação grande do dólar. A moeda americana era vendida a R$ 5,40 em 5 de janeiro. Baixou a R$ 4,99 em 2 de fevereiro. Saltou para R$ 5,30 em 15 de março e murchou até R$ 4,91 em 13 de abril. O último suspiro de alta foi no final de maio, a R$ 5,10. Nesta quarta-feira, fechou perto de R$ 4,81.

Os solavancos não têm sido exclusividade do real, embora a moeda brasileira costume ser líder em matéria de exagero. Dúvidas a respeito do que seria feito da dívida pública e da inflação contribuíram para a instabilidade na finança. Mas tem ficado mais claro que as idas e vindas de expectativas de inflação e taxas de juros nos Estados Unidos têm tido influência determinante por aqui, como era de esperar.

E daí? O futuro da inflação americana e, pois, das taxas básicas de juros nos Estados Unidos diz alguma coisa não apenas sobre parte da variação do dólar, mas também sobre as taxas básicas de juros no Brasil.

A diferença entre a taxa de juros americana e a brasileira têm importância para o preço do dólar. As taxas de juros em países similares também importam —são destinos alternativos para as ondas de capital.

As taxas básicas de juros nos Estados Unidos, de resto, indicam uma espécie de piso para as taxas brasileiras. Grosso modo, nossa taxa seria a americana mais um prêmio de risco (de ter reais, de investir no Brasil, de emprestar ao governo do Brasil etc.).

As expectativas sobre o que vai ser da taxa de juros nos Estados Unidos têm quicado muito, a depender de números de inflação, mercado de trabalho e dos humores do Fed, o banco central americano.

Esta quarta-feira foi dia de animação, com a divulgação de um número baixo de inflação, que chegou a 3% ao ano —a meta do Fed é de 2%. No chute do conjunto do mercado, o Fed aumentaria sua taxa básica apenas mais uma vez neste ano, para 5,5%, cortando em 2024.

Quanto menor a taxa de juros por lá, mais os juros podem cair por aqui ("tudo mais constante": se não se modificarem outros fatores relevantes). Quanto maior a diferença de juros entre Brasil e EUA, menor a pressão para a desvalorização do real.

Se a perspectiva é de que a Selic vá cair devagar, dado o nível de atividade econômica ainda resistente, espera-se também, claro, que a diferença de juros caia mais lentamente.

A Selic vai cair, assim como taxas de prazo mais longo. A diferença de taxas vai diminuir. Uma taxa de câmbio mais comportada, com o real menos desvalorizado, tem contribuído para a baixa da inflação.

Além dessas teorias gerais sobre as andanças da taxa de câmbio, qualquer outra especulação sobre o assunto é uma temeridade. Seja como for, uma nova onda de desvalorização do real seria agora um problema.

O real teve grande baixa no início da epidemia, em fevereiro e março de 2020, muito além da que se viu em outras moedas, mesmo as de países similares, "pares". Apesar da recuperação deste ano, ainda está relativamente desvalorizado. Para constar: em janeiro de 2020, consideradas as inflações, esteve em média em R$ 4,63; na média de 2017 a 2019, perto de R$ 4.

Mas isso é apenas aritmética, não é economia. O futuro de déficits e dívida do governo, da taxa de crescimento do PIB ou do investimento externo no Brasil podem ser fatores relevantes. O resumo da ópera é que não é possível pensar o que se passa na economia daqui sem olhar o mundo, como é nosso costume, e que há risco fora do nosso controle. Logo, é preciso ser ainda mais prudente e racional aqui em casa. O ambiente melhorou, mudanças importantes têm sido aprovadas, apesar do resto de retórica política. O assunto "macro" agora vai ser o cumprimento das metas fiscais.

 

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