O Globo
Na manhã da terça-feira, 29 milhões de
brasileiros de todos os estados, com exceção de Roraima, sentiram os efeitos do
desligamento repentino no fornecimento de energia. De uma hora para outra,
celulares pararam de funcionar, metrôs desaceleraram, milhares de geradores
foram acionados, e muita gente não pôde ir trabalhar.
Da última vez que houve um abalo parecido, em 2009, o presidente também era Lula. O então ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, primeiro atribuiu o blecaute a raios e ventos que haviam derrubado três circuitos ligados à Usina de Itaipu na região de Itaberá, em São Paulo, e a investigação do Operador Nacional do Sistema (ONS) demonstrou ainda que houve um curto-circuito numa subestação de Furnas.
Na época, a então ministra da Casa
Civil, Dilma
Rousseff, admitiu que o Brasil não estava livre de blecautes, mas passou
parte da entrevista reforçando que o país viera do racionamento em 2001, na
gestão de Fernando
Henrique Cardoso: “Uma coisa é blecaute. O que nós prometemos é que não
terá nesse país mais racionamento. Racionamento é barbeiragem”.
Desta vez, o bode expiatório foi a
privatização da Eletrobras. A
primeira-dama, Janja, puxou o cordão:
“A Eletrobras foi privatizada em 2022. Era
só esse o tuíte”, postou.
Deputados e senadores da base governista
foram na mesma toada, sugerindo que o “crime” da privatização levou à queda nos
investimentos da companhia — e que essa era a causa do apagão.
No final do dia, o ministro de Minas e
Energia, Alexandre
Silveira, deu uma entrevista de mais de uma hora em que passou a maior
parte do tempo criticando a privatização da Eletrobras, ainda que a pergunta
fosse noutra direção.
Mesmo afirmando que o sistema elétrico era
robusto e bem planejado, Silveira disse que o fato de a Eletrobras ser privada
gerava “instabilidade” no sistema, afirmou que a privatização fez muito mal ao
país e se queixou de falta de “sinergia” entre a empresa e o governo.
Como exemplo dessa falta de sinergia, citou
o fato de a troca do presidente da companhia, na noite anterior, não ter sido
comunicada previamente a ele.
Depois de dizer que havia convocado a PF e
a Abin para investigar o caso, embolou numa explicação confusa para a suspeita
de sabotagem fatores que iam dos ataques às torres de energia que precederam o
8 de Janeiro à importância estratégica do sistema para o Brasil — passando,
claro, pela privatização.
Enquanto isso, nos corredores dos
ministérios, circulava aos cochichos uma teoria da conspiração bem ao estilo
bolsonarista, segundo a qual o CEO demissionário da Eletrobras poderia ter arquitetado,
como vingança, um golpe para derrubar o sistema.
Ao final, o ministro ainda disse que não
seria “leviano de afirmar que a causa foi a privatização”. Mas foi exatamente
esse o recado na entrevista que teve de tudo, menos uma explicação consistente
para o apagão em si. Espera-se que ela venha nesta quinta-feira, num relatório
elaborado pelos técnicos do Operador Nacional do Sistema (ONS).
Já está bem claro, e o próprio Silveira
admitiu na entrevista, que falhas numa única linha de transmissão, seja da
Eletrobras ou de qualquer outra empresa, não tinham como derrubar parte tão
grande do sistema elétrico nacional. Pode-se até abominar a privatização, mas o
próprio governo informa que não há, por ora, nenhuma relação entre ela e o
apagão.
Na mesma manhã do blecaute, a Petrobras promoveu
o primeiro aumento no preço dos combustíveis deste governo Lula — de 16,3% na
gasolina, que voltou aos patamares da gestão Bolsonaro, e de 25,8% no diesel.
A Petrobras é controlada pelo governo, mas
sobre isso ninguém fez perguntas na entrevista, nem o ministro Silveira fez
questão de dizer palavra. Nenhum petista relevante foi às redes sociais
protestar contra o aumento, e na agenda do presidente Lula o dia passou como se
nada estivesse acontecendo nas bombas dos postos de abastecimento.
A estratégia de criar cortinas de fumaça
para empurrar a adversários a responsabilidade por problemas com grande
potencial de dano político é manjada. Mas o truque não dura para sempre.
Eventuais aumentos no preço dos combustíveis continuarão desafiando a retórica
governista e tendo impacto na inflação.
A Eletrobras, pelo menos por ora,
continuará privada. O blecaute ainda precisará ser esclarecido. E já deveríamos
ter aprendido com a experiência recente que teorias da conspiração não costumam
levar a um final feliz.
RA, hoje petralha,sempre disse: O petralha não aprende e não esquece.
ResponderExcluirMAM
Carácoles!
ResponderExcluir