sexta-feira, 6 de outubro de 2023

Maria Cristina Fernandes - Investida do Senado sobre o STF é uma infecção oportunista

Valor Econômico

Cúpula da Casa mira o Supremo, mas o alvo mesmo é o governo federal

A investida do Congresso sobre o Supremo é uma infecção oportunista. A definição é de uma autoridade de Brasília. Infecção oportunista é aquela que se instala num organismo debilitado, por exemplo, por uma cirurgia. É o caso de um governo completamente dependente de seu chefe máximo, em convalescença de uma operação na cabeça do fêmur na semana passada.

A cúpula do Senado, Casa onde tramita a reforma tributária e que também sabatinará os indicados à Procuradoria-Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal, entrou no modo guerrilha. Mira o Supremo Tribunal Federal mas o alvo mesmo é o governo federal. Como não caía muito bem bater em um convalescente de 77 anos, pau no Supremo.

O STF é um alvo mais fácil porque os senadores sabem que contam com um respaldo mais amplo de setores da sociedade que veem extrapolação de poder dos ministros. E assim, fica barato tanto para o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), quanto o presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (União-AP), cabalar votos para a sucessão da Mesa da Casa cativando as cerca de três dezenas de votos da bancada bolsonarista.

Mas ainda falta um ano e meio para a disputa pela mesa diretora. O que tem de imediato é a ocupação de cargos na máquina federal. O Senado passou a disputar palmo a palmo com a Câmara a Caixa Econômica Federal, a Funasa, as diretorias do Banco do Brasil e o controle sobre o mercado de apostas e loterias.

Mas não apenas. Há ainda uma insatisfação grande com o marco temporal das terras indígenas, que o Congresso aprovou mas o STF considerou inconstitucional, e com a indefinição em relação à margem equatorial do pré-sal, principalmente na bancada do Amapá, que tem três senadores influentes, além de Davi Alcolumbre (União), o líder do Congresso, Randolfe Rodrigues (sem partido) e Lucas Barreto (PSD). Alcolumbre e Lira também querem se ombrear com o STF na influência sobre o novo PGR. Tudo isso depende do governo e não do Supremo.

Pode ser que os senadores tenham querido testar o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, em sua estreia. Mas não para em pé a ideia de que aprovaram a PEC que limita os poderes do Supremo para emparedar a pauta de costumes da Corte.

O próprio Barroso garantiu ao presidente, numa pizza que lhe ofereceu um mês antes de sua posse, que não manteria na pauta o projeto de descriminalização do aborto. Pela simples razão de que não valeria a pena abrir guerra entre os Poderes se o tema não dispunha de maioria no tribunal.

Além disso, o projeto sobre o Supremo aprovado na CCJ é esquizofrênico. Se, por um lado, amplia o quórum do pedido de vistas para todo o colegiado, por outro, amplia a validade do instrumento dos atuais 90 dias para seis meses, prorrogáveis por mais três. Ou seja, restringe o poder de manobra da Corte com uma mão e libera com a outra.

Não foi para valer que a CCJ o votou este projeto, mas para dar um susto. Em quem? Não apenas no Supremo, mas também em Lula. A sorte do presidente é que a cúpula do Legislativo viaja neste fim de semana e emenda com o feriado. Mas depois volta.

 

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