O Globo
Na semana que completa dez meses, o governo Lula entregou a Caixa ao Centrão e sentiu o peso da crise de segurança do Rio de Janeiro
Aos dez meses do terceiro governo Lula, ele
entregou a Caixa Econômica para o Centrão, deu o primeiro passo para permitir
ocupação política na Petrobras, recebeu respingos de um caso de espionagem
criado no governo Bolsonaro e sente o peso da velha crise de segurança do Rio.
Essa é a hora em que a administração deveria corrigir rotas e fazer escolhas
para garantir o sucesso nos próximos três anos e dois meses deste mandato.
Aceitar a ocupação política das estatais é contratar riscos. Já houve tantos casos, em diversos governos, em que as indicações dos partidos resultaram em escândalos que é difícil imaginar que será diferente. A troca na Caixa teve ainda outro simbolismo. Mais uma demissão de mulher para dar o cargo a um homem. Lula explicou que precisa dos 100 votos deles. Precisa sim, mas é temerário entregar um banco tão simbólico e importante como esse.
Ao Centrão não bastou a presidência da Caixa
Econômica Federal. Quer a vice-presidência, todas as diretorias, quer porteira
fechada. E por quê? Pelos mesmos motivos de sempre, uso da instituição para
atender a interesses particulares e para irrigar os redutos eleitorais. Os
políticos e seus indicados chegam nos cargos protegidos pelo discurso de que o
combate à corrupção é sinônimo de criminalização da política. Os erros
cometidos em nome do combate à corrupção levaram ao outro extremo, o de
estigmatizar as medidas anticorrupção, seja na governança das empresas, seja na
ação dos órgãos de controle. Esse é o sentido do alerta da OCDE, no relatório
da 4ª fase de avaliação sobre o cumprimento pelo Brasil da Convenção contra o
Suborno. Esse definitivamente não é um caminho seguro.
Um evento que dominou parte da semana foi a
revelação de que pessoas públicas foram espionadas pela Abin. O serviço
israelense de monitoramento comprado no governo Temer teve seu uso desvirtuado
por Bolsonaro na perseguição a pessoas identificadas como inimigas do governo.
Isso inclui até um zeloso servidor público, como o chefe de fiscalização do
Ibama, Hugo Loss. No governo anterior, Loss foi punido por ter sido
bem-sucedido em diversas operações de combate ao crime ambiental no Vale do
Javari, e em terras indígenas no Pará. Na época, foi exonerado, impedido por
mais de um ano de trabalhar na Amazônia e, agora se sabe, foi monitorado pelo
programa espião.
Se os crimes foram cometidos no período
Bolsonaro, por que mesmo o governo Lula ficou na berlinda? Pelo erro de
permitir que pessoas da confiança do mandato anterior permanecessem em
postos-chaves. Foi o mesmo problema que levou ao constrangimento vivido pela
leniência do GSI em relação ao governo passado. Depois de receber o poder, em
2003, das mãos do ex-presidente Fernando Henrique, naquela que foi a mais
republicana das transições, o presidente Lula definiu o que recebia como
“herança maldita”. Agora, quando a definição seria perfeita, ele várias vezes
tomou decisões de convivência com pessoas, grupos e métodos que não são
compatíveis com o seu projeto de governo. Radicalizou com quem poderia
conviver, convive com quem deveria radicalizar.
No Rio, o governo Lula vai tateando para
encontrar uma política que produza resultados concretos e que evite os erros
das intervenções e das GLOs. A proposta de asfixia logística e financeira,
adiantada para mim pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, é um bom caminho, mas
exige novas medidas que devem ser anunciadas esta semana. Pelo menos, entendeu
que ignorar o problema, e dizer que é atribuição do governo estadual, não é uma
opção.
Há luzes acesas no painel. Falo de duas. A
política em relação aos indígenas tem óbvios avanços, mas há um impasse numa
das terras indígenas mais atacadas, a Apyterewa, dos Parakanã, em São Félix do
Xingu, Pará. As pressões políticas são muitas. Dino vai receber os indígenas na
próxima terça. Tomara que encontrem uma forma de manter a desintrusão. O
governo não pode ceder às pressões dos políticos grileiros.
O INPE divulgou editais de um concurso para
novos pesquisadores, depois de muitos anos sem contratar. Beleza. O problema é
que não há vaga prevista justamente para a Coordenação Espacial da Amazônia do
instituto. Um sinal constrangedor para um governo que diz que zerar o
desmatamento até 2030 é prioridade. Há vários outros sinais que mostram a
distância entre o que o governo diz que fará, e o que tem feito.
Criticar é mais fácil que fazer,rs.
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