Folha de S. Paulo
Livro sustenta que autodomesticação tornou os
humanos mais cooperativos e amigáveis
Numa tentativa de generalizar as ideias de Darwin para a economia e a sociologia, Herbert Spencer cunhou a expressão "survival of the fittest" (sobrevivência dos mais aptos), que se tornou o lema do darwinismo social. Nunca houve muita base científica para esse movimento, mais bem descrito como uma ideologia que buscava legitimar diferenças sociais e raciais. Nos últimos anos, porém, vêm ganhando corpo hipóteses que afirmam o exato oposto do darwinismo social —e elas parecem estar calcadas em ciência de boa cepa. Para essa corrente, foi a cooperação e não a competição que deu o tom da evolução humana (e da canina e da dos bonobos).
"Survival of the Friendliest"
(sobrevivência dos mais amigáveis), de Brian Hare e Vanessa Woods, é um ótimo
livro que tenta demonstrar essa tese. O casal sustenta que o principal
diferencial entre o Homo sapiens e outros hominínios que acabaram
extintos foram a intencionalidade comunicativa e a atenção conjunta. Elas nos
tornaram mais inventivos (melhores armas) e mais cooperativos, permitindo que
vivêssemos em comunidades maiores do que as de algumas dezenas de membros de
uma mesma família, que era provavelmente o tamanho dos grupos de neandertais.
A chave para a melhor comunicação foi,
segundo Hare e Woods, a autodomesticação. É aí que o casal nos guia num
fascinante passeio pela interface entre biologia e dinâmicas sociais em
espécies tão distintas quanto humanos, cães e bonobos, à luz principalmente do
célebre experimento de Dmitri Belyaev, que transformou raposas selvagens em
animais dóceis e cooperativos. O segredo? Selecionar pela docilidade, o que
produz uma cascata de características biológicas, incluindo a intencionalidade
comunicativa e a atenção conjunta.
Ao contrário de outros primatas como o
chimpanzé, humanos conseguimos ler não só as más intenções de nossos
semelhantes mas também as boas. E isso faz toda a diferença.
Sei.
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