segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Lygia Maria - O fantasma do antissemitismo

Folha de S. Paulo

Ataque terrorista do Hamas desperta preconceito adormecido contra judeus entranhado na história europeia

No dia 30 de dezembro de 1066, uma turba de muçulmanos invadiu o Palácio Real de Granada, na Espanha, e crucificou um vizir judeu. Em apenas um dia, milhares de judeus foram assassinados. Daí ao Holocausto nos anos 1940, foram vários os massacres e perseguições sofridos por esse grupo étnico-religioso.

O regime de Hitler foi a manifestação mais grotesca de um fantasma que assombra a Europa há séculos: o fantasma do antissemitismo.

Após as câmaras de gás, que chocaram o mundo, supunha-se que esse fantasma havia sido exorcizado, mas o ataque do Hamas a Israel mostrou que ele estava apenas adormecido.

Nos oito dias após o massacre, que ceifou mais de mil almas, foram registrados 202 episódios contra judeus na Alemanha —aumento de 240% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo a ONG Rias.

Costuma-se relacionar o ódio aos judeus apenas a Alemanha, devido ao nazismo, mas esse preconceito está entranhado na cultura europeia. De 7 de outubro até o último dia 5, o Ministério do Interior da França contabilizou 1.040 ocorrências que levaram à prisão de 486 pessoas. Casos também foram verificados na Itália, Áustria, Espanha e Inglaterra.

O antissemitismo tem origens que envolvem religião, economia e política. Ao longo da história, judeus foram culpados pelo assassinato de Jesus, tachados de capitalistas opressores ou de subversivos comunistas. Eram tantos os motivos e em tantos países que, segundo Bernard Wasserstein, em 1939, havia mais judeus em campos de prisioneiros fora da Alemanha do que dentro dela.

Na onda atual, a motivação política contra o Estado de Israel, em prol da causa palestina, despertou o vírus incubado do antissemitismo que ora contamina o Velho Mundo.

Como se rechaçar a barbárie cometida pelo Hamas ou defender a existência de um Estado judeu fosse o mesmo que apoiar a infração aos direitos humanos dos palestinos. É o efeito nefasto da polarização política, que torna o preconceito aceitável e a sensatez impossível.

 

Um comentário: