O Globo
Roberto Campos Neto tem previsões otimistas
para 2024, seu último ano no cargo, elogia Haddad e fala em “aprendizado” com
as críticas
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, acha que a “a taxa de juros no Brasil é alta”. Diz que no ano que vem, último como presidente do BC, quer juros o mais baixo possível e a inflação na meta. Reclama das agências de rating, avalia que “a nota do Brasil poderia ser melhor”. Elogia o ministro Fernando Haddad que fez “um esforço gigantesco para enquadrar o fiscal”, e admite “é super difícil cortar gastos no Brasil”. Nega incômodo com a pressão política que enfrentou: “Foi um momento de grande aprendizado.” Perguntado sobre as previsões para 2024, Campos Neto alerta que “as análises econômicas têm errado muito”, e prevê que o PIB de 2024 pode ser maior do que o projetado nos documentos do Banco Central.
Fui ao BC entrevistar Roberto Campos Neto
para o meu último programa do ano na Globonews. A gravação foi na sala do
Copom, diante de uma enorme tela de Portinari, o mesmo local onde ele fizera
uma reunião, na véspera, com o ministro Fernando Haddad. Ao longo da entrevista
ficou claro que Roberto Campos Neto concorda mais do que se imagina com Haddad,
e tem boas previsões para o Brasil.
– É difícil falar de 2024 sem, pelo menos,
colocar em perspectiva que as análises econômicas têm errado muito ultimamente.
Têm errado o crescimento, têm errado um pouco a inflação, têm errado muito o
emprego, têm errado os números de crédito — disse, lembrando que esteve em
reuniões em que se falava que o país teria um problema de crédito, e meses
depois o país estava com números surpreendentes.
Campos Neto avalia o ano que vem como um fim
de ciclo:
– Vai ser meu último ano como presidente do
Banco Central. Tenho perspectivas positivas, tem muita coisa que a gente
gostaria de consolidar e é importante entregar a inflação na meta e os juros o
mais baixo possível, para ter a consolidação desse processo. O Banco Central é
um órgão técnico, tem feito muita coisa pela sociedade e vai trabalhar pelo
Brasil.
Perguntei sobre o ano de estresse político,
com críticas pessoais a ele até do presidente da República. A resposta
surpreendeu:
– Acho que os momentos de pressão são os que
você mais aprende. Quando estou relaxado, dentro da zona de conforto, aprendo
menos. Então, olhando em retrospectiva, acho que foi um momento de grande
aprendizado.
Ele diz que, com as variáveis de hoje, o
ritmo da queda de juros, de meio ponto a cada reunião, está bom, mas admite que
os juros são altos no Brasil, mesmo estando em queda:
– A taxa de juros no Brasil é alta. Nós
também achamos, trabalhamos para o equilíbrio e a possibilidade de cair o
máximo possível.
Campos Neto diz que a taxa de juros caiu em
relação aos outros países e sustenta que houve queda até em termos reais,
quando se compara a projeção de inflação com a da taxa de juros. A queda foi
resultado da melhora do quadro econômico brasileiro. Perguntei sobre a reunião
com Haddad e ele contou que durante o encontro, o ministro recebeu várias vezes
telefonemas para negociar reformas.
– Ele fez um esforço gigantesco para
enquadrar o fiscal. É super difícil cortar gastos nesse país. Temos trabalhado
juntos. A proximidade aumentou bastante nos últimos tempos.
Sobre o crescimento do ano que vem, o BC
prevê 1,7%, mas ele diz que tem o viés otimista e, olhando em volta, o que se
vê é que o Brasil está muito melhor do que os vizinhos. Por todos esses
indicadores Roberto Campos Neto afirma que o Brasil tem nota de crédito mais
baixa do que merece.
– A nota podia ser um pouco melhor. Você não
encontra um país tão reformista nos últimos tempos como o Brasil, e num período
de tanta dificuldade.
Saindo da política econômica, Campos Neto
afirma que a questão ambiental brasileira “melhorou bastante”, tema que é uma
preocupação importante dos investidores internacionais. “Eu alertei bastante o
governo anterior” sobre isso.
É impossível não se emocionar na sala do
Copom. Não pelos áridos debates sobre taxas de juros que ali ocorrem, mas pelo
magnífico painel “Descobrimento do Brasil”, de Cândido Portinari, de quase
cinco metros de altura por quatro metros de largura, que cobre a parede de alto
a baixo. O Brasil está ali pintado pela mão do mestre em seu momento inicial,
com a caravela aportando para o desembarque. Dos muitos personagens estão, em
primeiro plano, os trabalhadores. Das muitas cores, predominam os tons terra e
verde.
Muito bom o artigo.
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