quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Míriam Leitão - Presidente do Banco Central quer juros baixos

O Globo

Roberto Campos Neto tem previsões otimistas para 2024, seu último ano no cargo, elogia Haddad e fala em “aprendizado” com as críticas

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, acha que a “a taxa de juros no Brasil é alta”. Diz que no ano que vem, último como presidente do BC, quer juros o mais baixo possível e a inflação na meta. Reclama das agências de rating, avalia que “a nota do Brasil poderia ser melhor”. Elogia o ministro Fernando Haddad que fez “um esforço gigantesco para enquadrar o fiscal”, e admite “é super difícil cortar gastos no Brasil”. Nega incômodo com a pressão política que enfrentou: “Foi um momento de grande aprendizado.” Perguntado sobre as previsões para 2024, Campos Neto alerta que “as análises econômicas têm errado muito”, e prevê que o PIB de 2024 pode ser maior do que o projetado nos documentos do Banco Central.

Fui ao BC entrevistar Roberto Campos Neto para o meu último programa do ano na Globonews. A gravação foi na sala do Copom, diante de uma enorme tela de Portinari, o mesmo local onde ele fizera uma reunião, na véspera, com o ministro Fernando Haddad. Ao longo da entrevista ficou claro que Roberto Campos Neto concorda mais do que se imagina com Haddad, e tem boas previsões para o Brasil.

– É difícil falar de 2024 sem, pelo menos, colocar em perspectiva que as análises econômicas têm errado muito ultimamente. Têm errado o crescimento, têm errado um pouco a inflação, têm errado muito o emprego, têm errado os números de crédito — disse, lembrando que esteve em reuniões em que se falava que o país teria um problema de crédito, e meses depois o país estava com números surpreendentes.

Campos Neto avalia o ano que vem como um fim de ciclo:

– Vai ser meu último ano como presidente do Banco Central. Tenho perspectivas positivas, tem muita coisa que a gente gostaria de consolidar e é importante entregar a inflação na meta e os juros o mais baixo possível, para ter a consolidação desse processo. O Banco Central é um órgão técnico, tem feito muita coisa pela sociedade e vai trabalhar pelo Brasil.

Perguntei sobre o ano de estresse político, com críticas pessoais a ele até do presidente da República. A resposta surpreendeu:

– Acho que os momentos de pressão são os que você mais aprende. Quando estou relaxado, dentro da zona de conforto, aprendo menos. Então, olhando em retrospectiva, acho que foi um momento de grande aprendizado.

Ele diz que, com as variáveis de hoje, o ritmo da queda de juros, de meio ponto a cada reunião, está bom, mas admite que os juros são altos no Brasil, mesmo estando em queda:

– A taxa de juros no Brasil é alta. Nós também achamos, trabalhamos para o equilíbrio e a possibilidade de cair o máximo possível.

Campos Neto diz que a taxa de juros caiu em relação aos outros países e sustenta que houve queda até em termos reais, quando se compara a projeção de inflação com a da taxa de juros. A queda foi resultado da melhora do quadro econômico brasileiro. Perguntei sobre a reunião com Haddad e ele contou que durante o encontro, o ministro recebeu várias vezes telefonemas para negociar reformas.

– Ele fez um esforço gigantesco para enquadrar o fiscal. É super difícil cortar gastos nesse país. Temos trabalhado juntos. A proximidade aumentou bastante nos últimos tempos.

Sobre o crescimento do ano que vem, o BC prevê 1,7%, mas ele diz que tem o viés otimista e, olhando em volta, o que se vê é que o Brasil está muito melhor do que os vizinhos. Por todos esses indicadores Roberto Campos Neto afirma que o Brasil tem nota de crédito mais baixa do que merece.

– A nota podia ser um pouco melhor. Você não encontra um país tão reformista nos últimos tempos como o Brasil, e num período de tanta dificuldade.

Saindo da política econômica, Campos Neto afirma que a questão ambiental brasileira “melhorou bastante”, tema que é uma preocupação importante dos investidores internacionais. “Eu alertei bastante o governo anterior” sobre isso.

É impossível não se emocionar na sala do Copom. Não pelos áridos debates sobre taxas de juros que ali ocorrem, mas pelo magnífico painel “Descobrimento do Brasil”, de Cândido Portinari, de quase cinco metros de altura por quatro metros de largura, que cobre a parede de alto a baixo. O Brasil está ali pintado pela mão do mestre em seu momento inicial, com a caravela aportando para o desembarque. Dos muitos personagens estão, em primeiro plano, os trabalhadores. Das muitas cores, predominam os tons terra e verde.

 

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