Folha de S. Paulo
Supremo pode tirar bomba da taxação de
importados do colo de Haddad
A taxação
das compras internacionais até US$ 50 colocou o STF (Supremo Tribunal
Federal) mais uma vez como ator central na decisão de um tema sensível para a
política econômica do governo Lula 3.
Com o movimento das duas maiores
confederações empresariais CNI (indústria) e CNC (comércio) de entrar com uma
ação no STF para acabar com a política de tarifa zero do Imposto de Importação
de bens de pequeno valor que são enviados a pessoas físicas no Brasil, o
ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, saiu do foco de pressão do Planalto, contrário a qualquer tipo de
taxação.
Bom para Haddad, que tira essa bomba de impopularidade do seu colo. Ruim para muitas lideranças do Congresso que seguem incomodadas e críticas à pauta econômica tomando o caminho na direção do prédio ao lado da praça dos Três Poderes, o do Supremo.
A decisão mais recente foi o acordo costurado
com a equipe econômica, que permitiu a regularização
do pagamento de precatórios, despesas com sentenças judiciais
"pedaladas" pelo próprio Legislativo durante o governo Bolsonaro.
A fatura de R$ 93 bilhões, paga
numa única vez no fim de 2023, não só interrompeu uma bola de neve como
garantiu uma injeção de dinheiro novo para impulsionar o consumo neste ano em
que o crescimento da economia brasileira está desacelerando.
Além de precatórios, a forma de tributação de
ICMS para combustíveis, o
voto de qualidade do Carf, o orçamento secreto e tantos outros temas. No
caso do acordo costurado para o Carf entre governo, Supremo e empresários, o
presidente da Câmara, Arthur Lira, cobrou que o Executivo enviasse um novo
projeto, proposta que bem mais tarde acabou sendo aprovada.
A MP 1.185 da subvenção e a extensão da desoneração
da folha de pagamento para 17 setores e prefeituras também correm o
risco de serem decididas pelo STF.
O ingrediente adicional é que a birra dos
congressistas com o Supremo alimentou, nos bastidores de Brasília, a avaliação
de que foi o ministro Haddad e sua equipe que estimularam a CNI e a CNC a
protocolar a ação, deixando para os ministros da Corte a polêmica decisão.
O desconforto só aumentou. Todos lembram que
um dos critérios da Fazenda sobre esse tema era os varejistas locais serem mais
explícitos na defesa da medida.
Ao longo do ano passado, a intenção da equipe
econômica de acabar com a isenção era coibir abusos das grandes plataformas de
ecommerce (como Shein e Shopee e Alibaba) e deu muita dor de cabeça para
Haddad, com trombadas diretas com o Palácio do Planalto.
Por outro lado, o ministro sofreu forte
pressão dos varejistas e dos fabricantes nacionais para que a medida fosse
tomada.
O que aconteceu foi um rol de informações
desencontradas e recuo
da decisão de taxar essas compras, após os alertas
da primeira-dama, Janja, sobre a avalanche de críticas dos consumidores da
classe média que reverberava nas redes sociais.
Na contramão de todo esse ruído, um novo
ponto entrou no radar. O Ministério
da Fazenda identificou uma mudança
no mercado após a criação do Remessa Conforme, o que tem inspirado maior
cautela na decisão de taxar ou não essas mercadorias, como mostra a reportagem
desta sexta-feira (26) da Folha.
O diagnóstico preliminar indica uma queda
consistente tanto no volume quanto no faturamento desses produtos, com
substituição de parte da oferta por artigos de fornecedores nacionais.
A preocupação agora da equipe de Haddad é que
a regularização das plataformas estrangeiras comprometa esse movimento
positivo, que também poderia favorecer empresas locais.
Não é o que pensam, porém, a CNI e CNC, que
cobram a taxação para garantir isonomia de tratamento com as empesas
estrangeiras para fechar a explosão dessas compras internacionais sem imposto
nos últimos anos, com prejuízo para a indústria nacional.
As duas entidades alegam que, entre 2013 e
2022, as importações de pequeno valor saltaram de US$ 800 milhões para US$ 13,1
bilhões (4,4% do total de bens importados).
O assunto voltou quente neste início do ano
porque a taxação é apontada como uma alternativa de compensação de receita para
a desoneração (ou reoneração a depender do desfecho final das negociações) da
folha de pagamentos. A depender da alíquota, pode garantir mais R$ 2,9 bilhões
de arrecadação.
Coincidência ou não, a ação no STF foi
ajuizada quase ao mesmo tempo que as negociações esquentaram entre Haddad e o
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso,
sinalizou que não vai decidir sobre o pedido de liminar durante o recesso do
Judiciário. A relatora do processo, ministra Cármem Lúcia, já arquivou ação
contra a criação do sistema Remessa Conforme.
No Supremo, há quem avalie que as duas ações
têm argumentações muito parecidas. A decisão dos ministros não será fácil. Mas,
se for favorável à taxação, é inegável que tira um peso gigante dos ombros do
ministro Haddad.
Os congressistas que criticam o ativismo do
STF, se não quiserem ficar a reboque, têm com a MP da reoneração a chance de
carimbar a sua posição. Não vão querer comprar essa briga.
Dada a excessiva contaminação política que o
tema ganhou, sendo alvo de disputa entre bolsonaristas e a primeira-dama, faria
sentido o STF assumir o papel de árbitro no tema?
Não sei.
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