O Globo
As celebrações do 8 de Janeiro tiveram todos
os ingredientes típicos dos eventos de Brasília:
as enfadonhas nominatas, com os intermináveis registros de presenças e
discursos em louvor da democracia. Faltou uma só peça: a discussão dos fatores
que permitiram a ocorrência das invasões.
Os ônibus convocados trazendo milhares de
pessoas para a “Festa da Selma” chegavam a Brasília desde a véspera.
Candidamente, diversos ministros contaram que, no início da tarde, estavam
almoçando. Nenhum depoimento revelou alguém que, desde o início da manhã,
estivesse organizando qualquer tipo de resistência.
A tentativa de golpe vinha sendo articulada havia semanas. Hoje culpa-se o culpado, e seu nome é Jair Bolsonaro. Contudo, se um sujeito tem uma joalheria, e ela é assaltada, a culpa é do ladrão, mas o dono da loja deveria ter pensado na proteção de seu patrimônio. O que houve em Brasília foi o colapso do sistema de segurança pública, que está bichado em todo o país.
Em São Paulo, o governador diz que câmeras
corporais colocadas nos uniformes dos PMs não protegem os cidadãos. No Rio, o
chefe de uma grande milícia decide se entregar à Polícia Federal. Pudera, Ecko,
irmão de Zinho, morrera baleado quando estava preso, dentro de uma viatura da
PM. (Nada de novo, há mais de 50 anos a poeta americana Elizabeth Bishop contou
a morte do bandido Micuçu numa favela. Na verdade, ele saiu vivo do morro e foi
executado dentro de uma viatura.)
Olhando para o 8 de Janeiro pelo retrovisor,
aprende-se que as forças encarregadas da segurança mal se falam. No Rio,
prenderam-se pessoas que nada mais deviam à Justiça. O erro foi descarregado
sobre o equipamento de reconhecimento facial. Daí, foi repassado a outro
equipamento, que deveria informar a situação dos detidos. Traduzindo, compraram
suas traquitanas de última geração, para nada. Um dos milicianos mais
procurados do Rio deixou a cadeia, com alvará. São diversos os casos de
bandidos libertados por juízes plantonistas. Em sete anos, a Justiça de São
Paulo soltou 30 quadros do Primeiro Comando da Capital. Um desembargador do Rio
que praticava esse tipo de gracinha foi investigado pelo Conselho Nacional de
Justiça e retomou seu cargo. A mulher do chefe de uma organização criminosa
frequentava gabinetes do Ministério da Justiça. Exposto o absurdo, a cavalaria
governista investiu contra uma jornalista.
Com o crescimento do crime organizado e dos
índices de letalidade das polícias, o governo federal fingiu que acordou e
lançou mais um plano. O que aconteceu em Brasília no dia 8 de janeiro de 2023
foi um genérico das PMs amotinadas no Ceará, no Espírito Santo e na Bahia.
Esses motins são, por sua vez, genéricos de polícias que saem matando
“suspeitos”, como ocorreu na Baixada Santista há algumas semanas.
Sabe-se lá quem Lula colocará no Ministério
da Justiça. Até agora, o favorito é o ex-ministro do STF Ricardo
Lewandowski. Seria um ministro tipo exportação. Tem biografia e
currículo, mas nunca prendeu um bandido.
A segurança pública está bichada, e, nos
próximos meses, com as campanhas municipais, o tema reaparecerá. É certo que
será central em 2026. Se o governo começar a trabalhar amanhã, poderá mostrar
resultados. Se acreditar nos próprios planos grandiosos, acordará tarde.
Sei.
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