O Estado de S. Paulo
Vivemos majoritariamente nas cidades, e é nelas que as tragédias climáticas mais nos castigam no momento
Com tantas eleições importantes, o ano de
2024 não será simples. A começar pelos Estados Unidos, onde Donald Trump pode
vencer as eleições, e a promessa chinesa de fortalecer a estratégia de anexar
Taiwan.
No Oriente Médio talvez a guerra não fosse
tão influenciada por uma virada nos EUA. Mas tudo indica que importantes
mudanças virão. Benjamin Netanyahu já foi derrotado em sua lei que controlava a
Justiça e pode ser alvo de uma comissão ainda neste ano. A tradição em Israel é
a de constituir rigorosas comissões para apurar falhas de segurança, e a do 7
de outubro foi gigantesca.
A própria guerra dificilmente vai durar o ano inteiro. Há sinais de cansaço. Um jornal de Israel anunciou que a presença em Gaza vai custar em torno de US$ 20 bilhões nos próximos meses. Parte da tropa começa a ser retirada, principalmente porque não há mais o que destruir na infraestrutura do Hamas e na própria Faixa de Gaza.
Uma virada americana terá fortes repercussões
na guerra na Ucrânia. A vitória de Trump contribui com Vladimir Putin e
enfraquece a aliança atlântica. A resistência ucraniana se fará em condições
muito difíceis.
O Brasil se encaminha para realizar eleições
municipais aparentemente tranquilas. Mas certamente não pode ficar alheio à
turbulência na Argentina. Javier Milei fez um pacote de novas leis, sem
negociar previamente com o Congresso. Muitas delas serão contestadas pelo
peronismo num clima em que Justiça e Parlamento podem desafiar o governo.
Uma vitória de Trump vai repercutir no
Brasil. Mas suas consequências só se farão sentir no ano seguinte, logo,
pertencem a outro grupo de previsões.
A grande tarefa de 2024 será a de pensar as
cidades brasileiras e definir alguns rumos. Não se limita apenas ao ano
eleitoral. Mas a oportunidade das eleições não pode ser perdida.
Um dos grandes problemas a ser incluído na
agenda é o das mudanças climáticas. Até que ponto vereadores e prefeitos vão
aceitar a importância do tema?
O recente terremoto no Japão mostrou como os
japoneses evoluíram de 2011 até agora na sua política de prevenção e resposta a
grandes eventos naturais.
Todos sabem que há muito o que fazer no
Brasil para evitar tantas mortes e destruição. Recentemente houve uma reunião
no Senado para avaliar a preparação nacional não só para as mudanças
climáticas, mas também diante do agravamento conjuntural com o El Niño.
Santa Catarina, entre outros, apresenta uma
certa evolução nesse campo. O Estado se inspirou nos centros japoneses de
operação e procurou se preparar melhor.
Mas sabemos que é preciso muito mais. Os
japoneses investiram na segurança de suas edificações e de suas estradas e
desenvolveram um esforço pedagógico que torna qualquer pessoa consciente do que
fazer na emergência.
O investimento na resiliência é um gargalo no
Brasil. Há muita gente morando em área de risco. Faltam recursos. No entanto,
se as cidades produzirem bons projetos de resiliência, podem apresentá-los como
um trabalho de adaptação às mudanças climáticas. Para isso há algum dinheiro
internacional, não tanto quanto prometem os países mais ricos, mas pelo menos o
suficiente para que sua promessa não seja completamente vazia.
Quanto à preparação da comunidade para os
eventos extremos, é possível também avançar. O senador Esperidião Amin propôs
que fosse instituído um prêmio à cidade que mais se destacasse nesse trabalho
pedagógico. Se o Senado realmente aceitar essa ideia, pode estimular uma sadia
competição.
Quando deputado, cheguei a apresentar um
projeto que instituía o ensina básico de defesa civil nas escolas primárias.
Chegou a ser discutido também na Câmara Municipal de Petrópolis (RJ).
Independentemente de leis, um projeto
pedagógico poderia ser aceito pelas escolas. Não só as crianças mas também os
adultos precisam saber o que fazer nas emergências. As comunidades devem ter
seus lugares de recuo, canoas e barcos devem ser guardados em lugares seguros e
conhecidos, é essencial listar quem tem dificuldade de locomoção e quem depende
de recursos médicos inadiáveis, como, por exemplo, hemodiálise.
Nesta semana, tive a oportunidade de
entrevistar brasileiras que moram no Japão. Elas informaram que fazem todos os
exercícios simulatórios e seguem todas as regras para salvar suas vidas em caso
de acidente. Isso é uma realidade para toda a colônia brasileira no Japão.
Na aparência, é um dado pouco importante. Mas
revela como a influência cultural tem um peso. E mostra que não somos
condenados indefinidamente à indisciplina nas questões que dizem respeito à
sobrevivência.
Quando alguém diz que o Brasil é
despreparado, é inevitável concordar. Mas supor que será assim eternamente, que
isto é um fator imutável de nossa natureza, aí então entramos no terreno do
mito, da resignação preguiçosa.
Se o tema for importante nas eleições e
suscitar boas ideias, o ano não estará de todo perdido por aqui.
Vivemos majoritariamente nas cidades, é nelas
que as tragédias climáticas mais nos castigam no momento, e vivemos nas cidades
litorâneas, as que mais vão sofrer no futuro.
Verdade.
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