Valor Econômico
Ação da Polícia Federal atinge o núcleo do governo Bolsonaro
A leitura das 135 páginas da decisão do
ministro Alexandre de Moraes indica que as investigações da tentativa de golpe
de 8 de janeiro vão se concentrar a partir de agora na cúpula militar do
governo Bolsonaro.
A devassa pela Polícia Federal nos celulares do tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens do então presidente da República, revelou três linhas de apuração: i) a disseminação de informações falsas sobre a integridade das urnas eletrônicas brasileiras; ii) o financiamento da mobilização de apoiadores em frente aos quartéis e iii) as articulações para a manutenção de Jair Bolsonaro no poder, com a implementação das medidas traçadas na “minuta do golpe”.
Se com relação à campanha de difamação da
segurança do sistema de votação e do apoio aos acampamentos de bolsonaristas as
digitais dos militares já estavam sendo apuradas pela Polícia Federal, a grande
novidade do despacho de hoje do ministro Alexandre de Moraes diz respeito à
organização do golpe em si.
De acordo com os elementos obtidos desde a
prisão de Mauro Cid, coube a Filipe Martins, ex-assessor internacional de
Bolsonaro, e ao advogado Amauri Assad a autoria de um documento decretando
estado de sítio, determinando a prisão de diversas autoridades (entre elas os
ministros do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, além
do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco) e convocando novas eleições.
Segundo as informações colhidas pela Polícia
Federal, a “minuta de golpe”, que já havia sido encontrada na casa do
ex-ministro da Justiça Anderson Torres, chegou a ser discutida por Jair
Bolsonaro com os comandantes do Exército e da Marinha, além do ministro da
Defesa, em reunião realizada no Palácio do Planalto no dia 07/12/2022.
Paralelamente aos encontros entre as
autoridades militares e o presidente da República no intervalo entre o segundo
turno das eleições e a posse de Lula, as conversas extraídas do celular de
Mauro Cid revelam a existência de um aparato de monitoramento das autoridades
que seriam alvo das ações golpistas (os passos de Alexandre de Moraes estavam
sendo acompanhados de perto).
As mensagens ainda revelam a mobilização de
militares das Forças Especiais do Exército para aderirem ao movimento e uma
intensa pressão exercida por generais da reserva (Braga Netto à frente) para
que os comandantes das Forças Armadas dessem sinal verde para uma ação militar
que impediria a posse de Lula em primeiro de janeiro.
As ordens de busca e apreensão emitidas hoje
pelo ministro Alexandre de Moraes atingem diretamente militares da ativa e da
reserva com papel relevante no governo Bolsonaro, como os generais Braga Netto,
Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira e o almirante Almir Garnier
Santos. Também abrange militares de ativa que ainda ocupam postos estratégicos
na hierarquia das Forças Armadas.
As operações policiais de hoje trarão ainda
mais elementos para a responsabilização de militares e de Jair Bolsonaro pela
tentativa de golpe no 08 de janeiro.
Para além da punição criminal de todos os
envolvidos, precisamos avançar com uma agenda legislativa para coibir o
envolvimento de militares na política. Nesse sentido, merecem aprovação a PEC
nº 42/2023, de autoria do Poder Executivo e que limita a candidatura de
militares para cargos eletivos, e a PEC nº 21/2021, apresentada pela
ex-deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) e que proíbe militares da ativa a
exercerem cargos de natureza civil na administração pública.
Enquanto não fizermos com que os militares voltem aos quartéis, a democracia continuará em risco.
Exatamente.
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