Valor Econômico
As declarações de Lula oferecem uma chance
para Netanyahu se defender com argumentos que unem seu país, dividido pela
guerra
A despeito das convocações cruzadas
de embaixadores, nem o Brasil nem Israel têm a ganhar
com a escalada da crise gerada pelas declarações do presidente
Luiz Inácio Lula da Silva comparando a matança de palestinos em Gaza ao holocausto.
Até que este perde-perde se esgote, porém, Lula enfrenta mais riscos que
o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
As declarações de Lula oferecem uma chance
para Netanyahu se defender com argumentos que unem seu país, dividido pela
guerra. Trata-se de um fôlego temporário, visto que o exército
israelense está prestes a fazer nova investida em Rafah, na fronteira
com o Egito, e levantar nova leva de indignação internacional, mas é uma
pausa útil.
Já Lula, que é o anfitrião, esta semana, da primeira grande reunião do G20 sob presidência brasileira, a dos chanceleres, perde a oportunidade de galvanizar uma posição sobre o tema. Arrisca, com isso, afetar sua liderança sobre o bloco. Até o momento, o apoio internacional mais eloquente que as declarações de Lula recebeu foi do Hamas, grupo responsável pelo ataque já classificado de terrorista pelo governo brasileiro.
A despeito de não ter conseguido aprovar uma
recomendação de cessar-fogo, o Brasil teve uma passagem bem-sucedida pela
presidência do Conselho de Segurança das Nações Unidas capaz
de aumentar o isolamento de Israel. Deu um passo adiante daqueles países que
havia conseguido agregar no CSNU ao aderir à denúncia de genocídio feita
pela África do Sul.
Poderia ter-se mantido nesta rota para se
desviar da jornalista da Radio França Internacional que perguntou sobre as
restrições democráticas na Venezuela e sobre a promessa de ajuda à
agência das Nações Unidas que cuida de refugiados palestinos. Preferiu
atravessar a rua para cair numa armadilha na outra calçada.
Muitos intelectuais já fizeram a mesma
analogia, mas nenhum chefe de Estado de um país do porte do Brasil ousou tanto.
Revolveu a tentativa de extermínio do povo judeu quando seu alvo era
a condução de uma guerra por seus dirigentes. Ao adquirir o carimbo de “persona
non grata” e submeter seu embaixador em Israel, Frederico Meyer, à reprimenda
pública do chanceler israelense no Museu do Holocausto é ao povo brasileiro que
expõe.
Foi em 1961 que a menção ao holocausto no
contexto da repressão dos palestinos por Israel causou o primeiro grande
estrondo. Naquele ano, o historiador inglês Arnold Toynbee fez esta comparação
durante uma conferência na Universidade McGill, em Montreal.
Foi desafiado pelo então embaixador
israelense no Canadá, Yaacov Herzog, tio do atual presidente de Israel, Isaac
Herzog, para, dali a dois dias, fazer um debate sobre o tema. Um dos mais
eruditos diplomatas de seu país, Herzog desfiou os grandes massacres da
história mundial para questionar por que só Israel merecera o protagonismo na
comparação.
O conflito estava longe do atual patamar. Não
havia ocupação na Cisjordânia e o embaixador se dizia representante
de todos os habitantes de Israel, inclusive dos palestinos. Toynbee se fixou na
perda dos palestinos de suas casas e de sua pátria, desapropriação que não
havia perdurado sobre os povos que, invadidos pelo nazismo, o tinham
vencido.
O embaixador chegou a dizer que tanto Israel
quanto as Nações Unidas haviam se comprometido a reparar essas perdas. Toynbee
foi desafiado a rever seu conceito de “cultura fossilizada” na qual havia
incluído o povo judeu. Ao fim de um debate civilizado, que durou uma hora e
meia e cuja íntegra seria publicada no mundo inteiro, o embaixador, que disse
ter ido ali como pessoa física e não como representante do Estado de Israel,
convidou Toynbee a visitar seu país.
Interessante e informativo!
ResponderExcluirInteressantíssimo, mas com um erro crasso que, por sinal, ninguém dá muita bola. Ela disse que:
ResponderExcluir"Não havia ocupação na Cisjordânia e o embaixador se dizia representante de todos os habitantes de Israel, inclusive dos palestinos."
Como não? Toda a Palestina para árabes estava ocupada pelos árabes. Gaza estava ocupada pelo Egito, enquanto a Cisjordânia estava ocupada pela Jordânia; ambas foram ocupadas pelos árabes durante 20 anos.
Por que os árabes não aproveitaram para fundar a Palestina? Porque, até hoje, o que eles querem é a Grande Síria.
MAM
Suponho que ela tenha querido dizer "Não havia ocupação [israelense] na Cisjordânia...", e tenha deixado isto subentendido pois a frase se refere mais aos israelenses. Ela não está fazendo um histórico completo da questão, mas descrevendo alguns aspectos mais relacionados à presença dos judeus a partir da segunda metade do século XX.
ResponderExcluirOs comentaristas opinando com conhecimento da causa.
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