O Globo
O cerco cada vez mais se fecha sobre a área
que ainda consegue respirar alguma liberdade na cidade
Às vezes, acordo com o barulho de tiros no
morro. Sento-me na cama e me pergunto: tiros ou fogos de artifício? Tiros.
Volto a deitar seguro: a configuração arquitetônica torna improvável uma bala
perdida na minha cama.
Na última semana, a Defensoria Pública do Rio
fez um amplo relatório da ação da polícia nas favelas, destinado ao STF.
Os dados foram colhidos das câmeras dos soldados.
Foram muitas as abordagens violentas. Instado a comentar o tema, pensei em falar na educação e no equipamento dos policiais. Dei-me conta de que apenas acionava o piloto automático. Com os mesmos recursos, os policiais não repetem sua atuação truculenta nos bairros mais ricos da cidade.
Tudo isso me reforça a sensação de que
vivemos numa área protegida do caos urbano no Rio Janeiro, ameaçada apenas por
pequenos furtos e alguns assaltos. Grande parte do Rio, talvez mais da metade,
está sob controle de grupos armados, milícia ou tráfico. A chegada do poder
público simbolizada pela polícia traz mais apreensão e confrontos violentos.
O jovem advogado Rodrigo Crespo foi
assassinado no Centro do Rio. Dos três suspeitos, um era da PM, e dois
trabalhavam na Assembleia Legislativa. Isso é mais uma demonstração do quadro
de coração das trevas: crime, polícia e políticos entrelaçados. Já no passado,
o escritório do crime que funcionou no Rio revelou também que um de seus
líderes trabalhava num gabinete parlamentar. Tudo indica que o crime organizado
no Rio não se limita a produzir recursos por meio da venda de segurança, gás,
do transporte em vans e construções irregulares. Emprega também alguns dos seus
atores no próprio Parlamento estadual.
O cerco cada vez mais se fecha sobre a área
que ainda consegue respirar alguma liberdade no Rio. Em breve teremos eleições,
o que me parece mais uma insanidade, no sentido dado à palavra por Einstein:
fazer as mesmas coisas e esperar resultados diferentes.
O Rio continua ocupado por milícias e
tráfico, apesar da queda do grupo de Santa Cruz na
semana que passou. Mesmo as quedas não conseguem resolver esse problema, pois
um novo grupo ocupa o espaço vazio. Não há esperança de que as eleições
resolvam o problema, sobretudo num estado com tantos governadores que já foram
presos. A possibilidade maior é que voltem à cena políticos que passaram pela
penitenciária.
É provável que, no futuro próximo, a área que
ainda respira se veja diante de um dilema: resistir coletivamente ou deixar a
cidade. Claro que resta ainda a alternativa de nada fazer esperando que o tempo
conserte as coisas. Nesse caso, o tempo funciona como uma dimensão mítica que
modifica o destino das pessoas sem a interferência delas.
Outras cidades do mundo passaram por esse
momento dramático e o superaram. Nova York já pareceu um lugar sem futuro,
Medellín, na Colômbia,
era tida como território perdido para o tráfico de drogas e assassinos a soldo,
os sicários. Com todo o respeito a esses lugares (Medellín conheci depois da
morte de Pablo Escobar), nenhum deles tem o perfil paradisíaco da natureza do
Rio. A cidade merece uma energia extra para resgatá-la da decadência.
O governo federal chegou a esboçar um projeto
de trabalho conjunto com o Rio. Mudou o ministro da Justiça, não se sabe como
ficará o projeto. O interessante é colocar na mesa do próprio Haddad e
convencê-lo de que a insegurança pública inibe novos investimentos e expulsa os
existentes. Creio que esse enfoque, facilmente demonstrável, poderia acionar o
poder público, embora a tarefa transcenda a governos. É um esforço que depende
também da própria sociedade.
■ " Não há esperança de que as eleições resolvam o problema, sobretudo num estado com tantos governadores que já foram presos.
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..................Fernando Gabeira.
=》Eleições têm que adiantar, sim:: se não acreditarmos em eleições vamos acreditar em quê?
Há todo tipo de cínico:: "Mas fulano é muito pior", "em relação a fulano é incomparávelmente melhor", falam para justificar o mal. Não:: o mal, maior ou menor que outro, ainda assim é o mal.
Temos que acreditar em eleições, mas temos que ter partidos e nomes. Cadê um partido para representar a democracia, por exemplo? É inacreditável que no Brasil não exista um partido sequer que em nenhum grau transija com corrupção ou antidemocracia.
■Temos que pressionar para que líderes adequados construam um partido político para representar a democracia, o apreço ao conhecimento político apartado de ideologismos e a aplicação técnica como boa política, usando a política acima da técnica apenas em casos específicos em que for necessário o arbitramento de perdas.
ExcluirEm toda a história brasileira só experimentamos a racionalidade, a democracia e a decência no curto período Fernando Henrique. Mas delinquentes políticos organizados no PT destruíram aquela representação como força política com o uso de mentiras, agressões, narrativas e distorções, e desmontaram parte das boas politicas que surgiram dali ou as mantiveram para usá-las no interesse particular e pessoal, sem dar-lhes sustentabilidade.
Mesmo os pressupostos do Plano Real e a sustentabilidade do Projeto Bolsa, roubados estes projetos com a mesma facilidade com que roubam $Bilhões, não há garantia de que possam ser sustentados por muito tempo neste país tomado por populistas.
Precisamos voltar a ter na política um canal de racionalidade e decência!
É absolutamente urgente recuperar a política de educação, a política de segurança, a política fiscal, a política externa, a política ambiental e a política indígena.
Sem a recuperação urgente destas políticas em breve não mais teremos um país.
Verdade.
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