Folha de S. Paulo
CPI da TV Cultura não tem objetivo claro e se
baseia em vagas acusações
O estado de São Paulo tem uma longa história
de políticas públicas inovadoras —no conteúdo, na forma de organizar a gestão e
na entrega de resultados. Isso é especialmente verdadeiro nas áreas de ciência
e cultura. Aí o controle estatal direto nunca traz bons frutos, pois tais
atividades precisam manter profilática distância dos governos e da política
partidária.
Criar organizações públicas não estatais, capazes de sobreviver até às grandes reviravoltas da política, foi ingrediente indispensável da pujança científica e cultural paulista. Basta citar a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, as três universidades paulistas, a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo, a Fundação Butantan e a Fundação Padre Anchieta, que gere a TV Cultura. Cada qual com seu modelo jurídico: fundação pública; autarquias de regime especial; organização da sociedade civil de interesse público; ou fundações privadas de interesse público.
Todas, a seu modo, tiveram de lidar com
governos que, ignorando o espírito da coisa, tentaram influir —quando não
interferir— em suas atividades, reduzindo-lhes a necessária autonomia. Foram
muitos os episódios de assédio político na TV Cultura e na fundação que a
dirige, como bem observou Roberto Muylaert em artigo
publicado nesta Folha,
no domingo (21).
Nova investida está sendo ensaiada pelo atual
governo. A Secretaria da Cultura contingenciou 100% dos recursos para
investimentos. Agora, por iniciativa do deputado Guto Zacarias (União Brasil),
a Assembleia Legislativa aprovou a CPI da Fundação Padre Anchieta (FPA). Vindo
do MBL (Movimento Brasil Livre), Zacarias é parlamentar novato, sem experiência
que se conheça nas áreas da cultura, jornalismo e TV pública. É também
—pasmem!— vice-líder do governo na Assembleia Legislativa.
Sem propósito definido, a CPI se baseia em
vagas acusações de mau uso de recursos públicos, quadro de funcionários balofo,
eleições fraudadas.
Nada disso se sustenta. Quarta colocada em
audiência entre as TVs abertas, a Cultura é reconhecida pela programação
alternativa à das emissoras comerciais. E isso com os recursos públicos que lhe
são destinados por lei representando apenas 60% de seu orçamento —o que só
cobre o pagamento dos 743 funcionários celetistas.
Mas, acima de tudo, com sua existência, a
Fundação Padre Anchieta mostra a possibilidade de manter uma emissora pública
que não pertença ao Estado, não sirva ao governos, nem se limite a oferecer
mais do mesmo ao público; antes, trate de proporcionar o que ele nem sabe que
quer.
Entro em férias por duas semanas.
Bom descanso.
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