Folha de S. Paulo
Muita gente deve ficar sem renda do trabalho,
em situação parecida com a da pandemia
O governo federal estuda anunciar um Bolsa Família extra
para parte das pessoas
que foram expulsas de casa pelas enchentes e que já não estejam
recebendo o benefício no Rio Grande do
Sul. Entre desabrigados (em abrigos de emergência) e desalojados (acolhidos
em outras casas), são cerca de 600 mil pessoas.
Em tese, o programa de emergência duraria enquanto as pessoas estivessem sem teto próprio. Além disso, haveria para umas 100 mil pessoas um "Auxílio Recomeço" de talvez R$ 5.000, para gastos em refazimento das casas, que vinha sendo chamado pelo péssimo nome de "voucher". Haverá financiamento extra para o Minha Casa, Minha Vida. Basta? Hum.
Sabe-se que, neste meio mês de calamidade,
muita gente não teve como trabalhar nem terá como reaver boa parte desse
rendimento perdido. Até que as águas baixem e se limpe a lama, vai mais tempo e
vem mais penúria.
No Rio Grande do Sul, 3,5 milhões de pessoas
estão no Cadastro Único (lista de possíveis beneficiários de assistência
social, grosso modo), cerca de um terço da população do estado.
Dessas, 1,62 milhão está em famílias que
recebem o Bolsa Família. Muita gente que está e ficará sem trabalho não consta
dessas listas.
Quem deve sofrer mais e de modo imediato é o
setor de serviços, em especial os menores. Isto é, pequenas oficinas e reparos,
salões de beleza e barbeiros (quase 10% dos MEIs do país trabalham no setor de
beleza).
Estarão em dificuldades pequenos comércios de
rua, bares e restaurantes, entregadores e motoristas de aplicativo, diaristas
de serviços domésticos, terapeutas variados, catadores de rua, serviços de
hospedagem. Quando já vimos listas assim? Na pandemia de Covid.
Não, não é uma situação de pandemia. Mas
certos trabalhos e negócios se tornam impossíveis com a paralisia das cidades,
é óbvio. Na pandemia, em 2020, em média houve 2,67 milhões de beneficiários de
auxílio emergencial no Rio Grande do Sul.
Muitas atividades rurais ficam interrompidas
porque não há transporte para entregar a ração de frangos e porcos, para levar
os animais ao abate, eletricidade para preservar criações. Em alguns casos,
instalações produtivas, galpões, silos, equipamento, plantações e pastos foram
destruídos. Como ficam pescadores artesanais e pequenos agricultores
familiares?
Há problemas com empresas maiores, claro. O
estado é grande produtor de móveis, calçados, máquinas e equipamentos,
químicos. Vai
ficar sem o aeroporto de Porto Alegre até setembro, pelo menos.
Alguns economistas de bancos e consultorias
começam a fazer estimativas sobre o tamanho do colapso da economia gaúcha.
Em maio e junho, seria um tombo semelhante aos dos primeiros meses da
paralisação da pandemia. O problema é que, para fazer essa estimativa, os
economistas usam como referência justamente o efeito do fechamento e do
isolamento para conter o coronavírus. Mas não é improvável que o colapso de
maio seja parecido com o do começo da pandemia.
O ministro Rui Costa (Casa Civil) disse à
GloboNews que o governo vai criar uma autoridade federal para coordenar as
ações de socorro no Rio Grande do Sul. Ok, em tese. Mas:
1) Lula
resolveu nomear um petista, possível aspirante a governar o estado, para o
comando da tal "autoridade". É ideia de jerico em termos políticos,
um insulto ao princípio da colaboração apartidária na catástrofe e desprezo
pela ideia de criar instituições com capacidade técnico-administrativa;
2) mais que uma "autoridade", é
preciso criar uma instituição para trabalhos e projetos de construção e
mitigação do desastre ambiental. Com qual critério será usado o dinheiro da
reconstrução gaúcha? A instituição poderia começar por aí, se organizar no
trabalho de tal projeto. Cadê?
O importante é ajudar,não importa que seja um ''petista''.
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