Valor Econômico
Lula está insatisfeito com a forma com que auxiliares têm defendido os resultados obtidos em seu terceiro mandato
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva
atropelou as discussões que vinham sendo conduzidas, com relativa discrição
dentro do governo, para a formatação de um novo discurso sobre o desempenho da
economia. A estratégia estava em gestação, quando Lula avançou o sinal e
acelerou. A imprudência gerou novo acidente no mercado de câmbio, em um momento
em que seria melhor dar algum sinal na política fiscal.
Além de parecer disposto a manter uma permanente rixa com o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, Lula está insatisfeito com a forma com que auxiliares têm defendido os resultados obtidos em seu terceiro mandato. Acha que a percepção do brasileiro sobre a qualidade de vida está impactando negativamente a sua popularidade, a despeito de indicadores positivos observados há meses, e portanto há que contar “uma história melhor” para a população.
Esse não é um desafio exclusivo do petista. O
presidente americano, Joe Biden, enfrenta um semelhante.
Em campanha à reeleição, Biden tem mencionado
o reaquecimento da economia e a criação de milhões de empregos durante seu
mandato. Cita dados públicos, conhecidos e verdadeiros. Mas ainda assim, seu
adversário, o ex-presidente Donald Trump, tem conseguido encontrar espaço para
criticar a forma como ele tem lidado com as questões econômicas.
Recentes pesquisas mostram que parte
considerável do eleitorado americano espera estar melhor financeiramente em um
novo governo do republicano. Lá como cá, a inflação é um tema crucial: o alto
custo de vida tem perturbado eleitores e tornou-se um tema amplamente explorado
pela oposição.
É exatamente este o problema que tem
atormentado Lula. Ele também cita indicadores públicos, conhecidos e
verdadeiros. Mas se questiona como não chega à ponta da população a percepção
de que está melhor viver no Brasil hoje. Decidiu reagir.
Para usar as palavras escritas no mais
recente Relatório de Inflação pelo Banco Central, alvo prioritário do
presidente, depois de crescer 2,9% em 2023 o Produto Interno Bruto (PIB)
surpreendeu no primeiro trimestre de 2024 e apresentou expansão robusta e acima
da esperada. Também ocorreram altas expressivas do consumo da família e dos
investimentos, o que ensejou a revisão do PIB do ano de 1,9% para 2,3%.
O mercado de trabalho está cada vez mais
aquecido. A taxa de desocupação recua, à medida que a geração líquida de
empregos sobe. Os rendimentos reais seguem em uma trajetória de crescimento,
assim como a média salarial de admissão e a dos reajustes salariais coletados
de convenções coletivas de trabalho.
Isso não se traduz, contudo, na percepção do
brasileiro. Afinal, o custo de vida segue alto.
Segundo a mais recente pesquisa do Datafolha,
divulgada no dia 19 de junho, 27% dos entrevistados viram melhora na situação
da economia. Houve piora para 42% e estabilidade para 29%. No levantamento
realizado em março, 28% viam melhora nos meses anteriores, ante 41% que viam
piora e 30% apontando para um quadro estável. Os níveis são similares.
“As expectativas sobre a economia pessoal e
nacional também mudaram pouco desde março. Há 40% que esperam que a situação
econômica brasileira irá melhorar nos próximos meses (em março, 39%), e 28%
preveem piora (eram 27%). Uma parcela de 27% avalia que a conjuntura econômica
do país ficará estável (no último levantamento, 32%), e 5% não têm opinião
sobre o tema (eram 2%)”, apontou o instituto.
Índices de confiança empresarial e do
consumidor também estão estáveis. Como mostrou o Valor PRO, serviço de
informações em tempo real do Valor, a confiança empresarial apurada pelo
Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre)
mostra-se estacionada há três meses, apesar de ter potencial de avançar. Já o
Índice de Confiança do Consumidor (ICC) do FGV Ibre subiu 1,9 ponto em junho,
para 91,1 pontos, após queda mais expressiva no mês anterior. Em médias móveis
trimestrais, o índice estabiliza em 91,2 pontos.
Lula parece acreditar que é capaz de reverter
esse quadro escalando o tom do discurso. O caso mais evidente se deu nessa
terça-feira (2) em uma entrevista à “Rádio Sociedade”, durante visita à Bahia.
Segundo o presidente, o governo tem que fazer alguma coisa sobre essa
“especulação” que tem provocado a alta do dólar. Mas não revelou qual o seu
plano. O problema é que as declarações acabaram elevando a pressão sobre o
mercado de câmbio e ainda aumentaram as expectativas sobre a reunião que ele
conduzirá sobre temas econômicos nesta quarta-feira.
Uma ala do governo esperava essa oportunidade para discutir formas de reduzir despesas, sem ter que dividir as atenções com expectativas sobre possíveis medidas cambiais. É o mesmo grupo que aponta maior urgência na implementação de medidas concretas no âmbito da política fiscal, por saber que o Executivo precisa recuperar a credibilidade no mercado e no Congresso, em vez de desviar o foco para uma estratégia mais voltada a pesquisas de opinião. Lembram que não existe presidente forte com uma equipe econômica fraca.
Verdade..
ResponderExcluir