Folha de S. Paulo
Moraes fornece ao bolsonarismo narrativa
perfeita ao converter TSE em tentáculo de inquérito
É a mesma novela, em outra versão. Sergio
Moro, o redentor, fundou um partido de juízes e procuradores, violou as tábuas
da lei e, no fim, desmoralizou a maior investigação sobre a corrupção política
no país. Alexandre de Moraes, o vingador, nomeou-se investigador, promotor e
juiz, converteu o TSE em tentáculo de seu inquérito sem fim e, ao final,
desmoraliza o processo sobre a conspiração golpista, fornecendo ao bolsonarismo
uma narrativa perfeita.
Tudo "oficial", "regular", "regimental", proclama Moraes, como alegava Moro –e, como seu inspirador, colhe aplausos corporativos e partidários. Moro apontava aos procuradores os indícios que deveriam procurar, a fim de produzir as provas judiciais de um processo com resultados predeterminados. Moraes ordenava ao TSE a fabricação de relatórios sob medida contra alvos selecionados, transformando-os em provas destinadas a embasar suas próprias decisões. Nos dois casos, o ritual político esculpiu o rito legal.
"Obediência devida" –os juízes
auxiliares não se envergonham de recorrer ao álibi dos militares argentinos. Eu
"cumpria todas as ordens que me eram dadas" e, travessuras da
memória!, "não me recordo de ter cometido qualquer ilegalidade",
declarou um deles. Protegido por garantias, estofado de privilégios, o alto
funcionário público tem o notório hábito de subordinar o dever às ordens
superiores.
A surpresa é privilégio dos distraídos. Tudo
começou, em 2019, com um "inquérito de ofício" pelo qual o juiz
supremo censurou textos legítimos de uma revista, prosseguiu com a abertura em
leque do inquérito de exceção e desaguou numa coleção de atos de censura prévia
contra militantes de redes sociais. No meio do caminho, como holofote a
iluminar uma impostura, um episódio de malcriação no aeroporto de Roma foi
alçado ao estatuto de ameaça à democracia brasileira. (Dica: aquelas gravações
jamais virão a público porque familiares do juiz também não ficam bem na fita).
A lei, ora a lei: se é para combater
"fascistas", vale tudo. O argumento, simétrico ao empregado pelos
bolsonaristas na hora da nudez de Moro, remete ao antigo tema dos meios e fins.
Fins nobres justificam meios ignóbeis? Depende, claro, de quem define o que é
nobre. A ditadura militar prendeu e torturou para salvar-nos do
"comunismo". Maduro frauda e reprime para derrotar o
"fascismo". O ato inaugural das tiranias é, invariavelmente, a
demolição da muralha que separa a lei da política.
Os meios qualificam os fins, esclareceu um
Trotski acuado pela espada do stalinismo. No Estado de Direito, o processo
legal está ancorado precisamente no princípio filosófico exposto pelo
revolucionário russo. Dele decorreu a anulação das condenações de Lula na Lava
Jato –e é ele que, agora, pesa sobre o conjunto das decisões de Moraes no
âmbito de seus abrangentes inquéritos.
Moro salva-nos da praga da corrupção! Moraes
resgata a pátria do abismo golpista! Golpismo, como corrupção, é perigo real,
não lenda. Contudo, a lei tem todos os meios para combatê-lo eficazmente. De
fato, num caso e no outro, a subversão da lei engendra a impunidade para os
culpados e, ao longo do percurso, a punição injusta de inocentes.
Quem fiscaliza o juiz-político? Jogando para
a plateia, o STF ("in Fux we trust") confirmou cada uma das decisões
de Moro – até que a ventania política mudou de lado. Moraes, ao contrário de
Moro, não é um juiz de aldeia, mas um ministro de capa preta. Quanto tempo
precisará o STF para inverter sua rota, restaurando algum simulacro de
obediência ao processo legal?
Até o momento, o "inquérito de ofício" resultou em diversas ordens ilegais de censura e na condenação de dezenas dos vândalos periféricos do 8/1, mas nem tocou no chefão da conspiração, que circula por aí como grão-cabo eleitoral. O tempo costuma impugnar as encenações farsescas.
Não houve qualquer ato formal indevido nos processos da Lava-jato que tenha sido associado a supostos desvios de conduta de juiz ou procuradores. Assim como não houve condenação injusta entre os punidos pela Lava-jato.
ResponderExcluirA discutível anulação das condenações do Lula foi devido à consideração que o seu julgamento em primeira instância não caberia à Vara de Curitiba. A comparação de Moro com o Alexandre de Moraes é falaciosa e desonesta.
A comparação de Moro com Moraes é realmente falaciosa e desonesta! Moro ILEGALMENTE ORIENTAVA seus parceiros/cúmplices do MPF sobre o que investigar ou como encaminhar pedidos que ele aprovaria dentro de processos em que ele era o JUIZ, rompendo CONSTANTEMENTE um dos PRINCÍPIOS fundamentais do Direito de independência entre Acusação e Juízo. Moraes, como comandante de 2 órgãos simultaneamente, apenas ordenava a seus subordinados que produzissem documentos a serem incorporados LEGALMENTE aos inquéritos.
ResponderExcluirDesonesto é trabalhar na Petrobras. MAM
ResponderExcluirTexto perfeito, infelizmente. MAM
ResponderExcluirSão as falsas equivalências,como disse Reinaldo Azevedo.
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