O Globo
O STF não pode fazer pactos, pois
provavelmente será chamado a julgar casos que envolvam os dois outros Poderes
da República
Sempre que o Supremo Tribunal Federal (STF)
faz parte de pactos políticos, como já aconteceu algumas vezes nos últimos
anos, é sinal de que algo vai mal no nosso arcabouço institucional. Nos
“pactos” anteriores, o tema central era sempre “a favor da democracia”. Agora,
são as emendas parlamentares, uma intromissão direta em questões de outros
Poderes, não apenas conceitual.
O STF não pode fazer pactos, pois
provavelmente será chamado a julgar casos que envolvam os dois outros Poderes
da República. Por isso não toma iniciativas sobre os temas a analisar, só atua
quando solicitado por integrantes de outros Poderes ou pelas poucas
instituições autorizadas a fazê-lo.
A reunião sobre as emendas parlamentares
ocorrida na sede do STF em Brasília, portanto, é uma dessas anomalias a que nos
acostumamos. O Supremo, por meio do ministro Flávio Dino, cuja decisão foi
aprovada por unanimidade no plenário, entrou na disputa sobre as emendas
instado por partidos políticos e as suspendeu enquanto não cumprirem as
exigências constitucionais de transparência, impessoalidade e rastreabilidade.
Sua tarefa deveria ter se encerrado naquele momento. Legislativo e Executivo deveriam ter se sentado para negociar entre si, para atender às exigências do STF. No entanto estavam na mesa os 11 ministros do Supremo, o que fez com que o presidente da Câmara, Arthur Lira, dissesse que lá estavam dois Poderes contra o Legislativo, reforçando a desconfiança de que Judiciário e Executivo se uniam para retirar do Congresso o poder sobre as emendas e dando caráter político à decisão de Dino, ex-ministro de Lula.
No acordo entre Congresso, governo e
Judiciário que saiu do encontro sobre emendas parlamentares, alguns pontos
foram bons, outros nem tanto. A verba das emendas não foi reduzida. Deveria ter
sido, pois é absurdo o que o Legislativo tem de parte do Orçamento, a mesma
quantia deixada para o governo central fazer seu planejamento.
Ao mesmo tempo, a exigência de transparência
e rastreabilidade fará com que muitas emendas não sejam usadas, ou pelo menos
sejam usadas em coisas mais palpáveis e necessárias. O mais importante é que o
Executivo passou a ter lugar de fala quando se tratar de emendas que não sejam
individuais, mas de comissão ou bancada. Umas terão de ter caráter de interesse
nacional ou regional, outras serão para projetos “estruturantes”. Dessa
maneira, o Executivo passará a ter de volta parte do dinheiro hoje investido da
maneira e onde os parlamentares querem, sem que tenham de dar satisfação sobre
seus atos.
Várias investigações em órgãos
fiscalizadores, como o Tribunal de Contas da União (TCU), já estão em
andamento, provocadas por denúncias de políticos prejudicados ou anônimos
cidadãos. Pode-se, a partir de agora, fazer uma combinação com o governo para financiar
obras necessárias, pois, se o deputado tiver de explicar para onde foi o
dinheiro, boa parte não terá explicação. Foi um avanço. Não é o que seria
ideal, mas permite que o governo continue governando.
Porque a brigalhada toda de STF contra
Legislativo, de Legislativo contra Executivo, pedindo ajuda ao Judiciário para
protegê-lo, era qualquer coisa, menos um governo republicano. Veremos como
conseguem agora montar o caminho para o equilíbrio voltar. Ficará mais difícil
explicar razões de obras apenas para favorecer amigos. Sentar junto para
negociar já mostra uma convivência saudavelmente democrática
Verdade.
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