O Globo
A estabilidade macroeconômica é ingrediente
essencial para a ampliação da capacidade produtiva
A indústria de transformação mostra alguma
reação. Registrou crescimento de 2,7% no primeiro semestre em relação ao mesmo
período de 2023. Não é pouco quando se leva em conta o desempenho nos últimos
anos. Mais do que isso, para além do seu peso no PIB, é o setor com mais
impactos indiretos nos demais setores, conforme dados do IBGE, o que aumenta a
importância desse resultado.
Será esse um sinal promissor ou mais um voo
de galinha?
A compreensão do quadro desafiador do setor demanda a análise do histórico recente, com destaque para dois períodos principais.
Primeiro, a crise global de 2008-09 penalizou
particularmente o setor, com a queda de mais de 30% no volume de exportações,
por conta do colapso do crédito ao comércio exterior. Superada a crise, o
Brasil não conseguiu reconquistar os mercados perdidos, provavelmente em função
da baixa competitividade dos nossos produtos — não é coincidência que segmentos
mais competitivos, como a celulose, não foram impactados.
O volume exportado da indústria de
transformação, que representava 24% da produção doméstica em 2007, recuou
rapidamente para 19% na média de 2009. Enquanto isso, o mundo se recuperava.
Desde então, as exportações pouco evoluíram,
estando atualmente em patamar mais de 20% inferior ao pré-crise de 2008. Aqui
outros fatores precisam ser adicionados, o que nos leva ao segundo capítulo: a
recessão causada pela gestão Dilma.
Esse foi um período de efetiva
desindustrialização, com enorme descolamento da produção doméstica, que
encolheu 21% entre o pico (agosto/2013) e o ponto mais baixo (agosto/2016),
ante crescimento de quase 15% na produção mundial no mesmo período.
As políticas de proteção e estímulo à
indústria não trouxeram o esperado aumento do investimento. Pelo contrário,
houve forte queda no período (a produção de bens de capital para a indústria
caiu 21% na média de 2016 em relação a 2012), agravando o quadro de
obsolescência tecnológica do parque industrial, com a consequente perda de
produtividade e competitividade externa.
Eram tempos em que parecia mais vantajoso ir
a Brasília em busca de proteções do que investir no negócio. Os necessários
ajustes da política econômica e as reformas eram negligenciados.
Naquela recessão, mais de 2 milhões de
empregos foram destruídos na indústria geral (inclui a indústria extrativa),
representando um recuo de 15% no número de ocupados, enquanto no restante da
economia o quadro pouco se alterou. A massa salarial caiu e, em um efeito
bumerangue, o consumo de produtos industrializados amargurou queda na casa de
20%.
Ao mesmo tempo, e em parte como resposta à
piora do mercado de trabalho, a queda do crédito ao consumidor agravou
severamente o quadro. O sonho da nova classe média se foi, e a demanda passou a
ser o limitante ao setor: a aquisição de bens de consumo ainda está 10% abaixo
do pico de 2011.
Passada a recessão, em função de correções na
política econômica, a produção ensaiou alguma modesta recuperação, antes e
depois da pandemia. Recuperar as feridas não é fácil, mas a retomada de
reformas estruturais, como as do mercado de trabalho, e a maior estabilidade da
economia trazem alento.
O movimento se mostra disseminado entre
segmentos da indústria e entre regiões do país, refletindo em grande medida o
dinamismo do mercado de trabalho. No entanto, não parece haver, por ora, grande
capacidade de expansão da produção adiante, por conta da já elevada utilização
da capacidade instalada.
A volta do investimento na indústria é
urgente. Sem isso, o aumento da demanda irá se traduzir em aumento da
importação e da inflação, e dos juros também. O governo precisa colaborar. E
não será com sua nova política industrial, com objetivos em excesso, pouco foco
e falta de bons instrumentos — uma receita para não funcionar.
A estabilidade macroeconômica é ingrediente
essencial para a ampliação da capacidade produtiva de um setor particularmente
vulnerável ao ciclo econômico, exatamente por ser mais prejudicado pelo
custo-Brasil — por exemplo, a carga tributária é mais elevada e complexa, há
maior dependência de mão de obra qualificada e menor espaço para a
informalidade.
O empresário precisa de confiança para
investir. Não enfrentar o risco fiscal e criar volatilidade é veneno para a
indústria.
Sim.
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