sábado, 21 de setembro de 2024

Dora Kramer - A política se degrada

Folha de S. Paulo

A lama da campanha de São Paulo é a parte mais visível de um todo deteriorado

O lamaçal que assola a disputa eleitoral em São Paulo à parte, mas ele incluído como símbolo do fenômeno de que falaremos a seguir, nosso ambiente político sofre acelerado processo de degradação e não é de hoje.

Há pelo menos uns 20 anos o nível dos meios e modos na política vem baixando de modo permanente. Uma maravilha nunca foi, mas havia qualidade em meio a nichos de desqualificação nos partidos e no Congresso.

Tanto que a Constituição que nos rege, lembremos, foi elaborada, votada e aprovada por senadores e deputados há 36 anos. Em legislatura anterior, senadores e deputados rejeitaram o candidato à Presidência da ditadura e, antes disso, fizeram a Lei da Anistia. Imperfeita? Era o possível à época.

A transição do regime autoritário para o Estado de Direito foi fruto da política, atividade sem a qual não se tem um país democrático. Portanto, a navegação em ondas de sentimentos antipolítica corresponde ao embarque no barco do autoritarismo.

Personagens que encarnavam esse figurino faziam sucesso pontual, mas acabavam sendo expelidos ou extintos por inanição. O que temos hoje é um cenário onde a exceção está em via de se tornar quase numa regra de mau espetáculo. Assusta, embora não surpreenda, ver o circo mambembe exibido nos debates da eleição municipal da maior cidade do país. Se essa canoa virou foi porque deixaram ela virar.

E nisso a culpa é coletiva: dos partidos em sua distorção de critérios para escolha de candidatos, do eleitorado em seu apreço pelo baixo entretenimento, dos políticos mais qualificados que se deixam levar e aderem ao deboche, mas também dos organizadores dos encontros em sua busca por audiência.

As cenas de ofensas e agressões se repetem no Parlamento, onde hoje não é mais fato raro reuniões de comissões e até sessões em plenário se transformarem em tablados de vale-tudo enquanto nos bastidores se administram balcões de negócios. Já disse e repito: não foi sempre assim.

Em nome da saúde da democracia urge que a política entre em processo de reabilitação, antes da degradação total.

 

Um comentário: