O Globo
Os herdeiros do rinoceronte Cacareco ganharam
só espaço
Desde 1959, quando o rinoceronte Cacareco
teve 100 mil votos para uma cadeira de vereador na eleição municipal de São Paulo, os
candidatos pitorescos ganharam um espaço inédito. Só na noite de 6 de outubro
se saberá se ganharam peso político. As pesquisas de outros estados mostram o
contrário. Na vida real, a baixaria é alimentada por dois candidatos, só em São
Paulo. No Rio, Recife, Porto Alegre e Belo Horizonte e nas outras capitais a
campanha vai bem, obrigado.
Depois de Cacareco, vieram fenômenos como Enéas Carneiro e o comediante Tiririca. Enéas disputou três vezes a Presidência da República e chegou a conseguir 1,4 milhão de votos. Em 2002, elegeu-se deputado federal por São Paulo, com a maior votação da época, mais de 1,5 milhão de votos. Reelegeu-se em 2006 e morreu no ano seguinte. Tiririca elegeu-se deputado federal por São Paulo em 2010, também como o mais votado (1,3 milhão de votos), e está até hoje na Câmara.
Cacareco morreu no Zoológico em 1962. O
quadrúpede passou pela vida pública sem deixar vestígios. Seus similares
também. Ganha um archote para produzir uma queimada quem souber das
contribuições de Enéas e Tiririca para a vida do país. Representaram um desconforto
dos eleitores, nada mais que isso. Ninguém votou em Cacareco, Enéas ou Tiririca
esperando alguma coisa. Afinal, o voto é obrigatório. Se não fosse, esse
eleitor ficaria em casa.
Um cidadão que acompanhou por dez anos a
Operação Lava-Jato e viu seu funeral melancólico tem razões para não acreditar
em coisa nenhuma. Outra coisa é entregar a administração de sua cidade ao
produto de uma vaia. Os candidatos pitorescos vestem-se com mantos radicais
para nada. Fanáticos sem causa, são asteriscos que acabam esquecidos.
Tudo isso pode fazer sentido, mas falta
incluir no quadro o fenômeno Jair
Bolsonaro, saído da avalanche eleitoral de 2018. Seu filho Eduardo
quebrou o recorde de Enéas, elegendo-se para a Câmara com 1,8 milhão de votos.
Quatro anos depois, quando o pai disputava a reeleição, teve menos da metade de
eleitores.
A eleição de 2018 foi única e ainda
reverbera. Lula,
o principal candidato, estava na cadeia, trancado por decisão do Supremo
Tribunal Federal, soprada pelo comandante do Exército. Poucos países passaram
por experiências semelhantes.
A maré conservadora e antipetista elegeu os
Bolsonaros. No Rio, o anônimo juiz Wilson Witzel capturou
o governo do estado e foi deposto em 2021. O Supremo soltou Lula, os generais
voltaram aos quartéis, e, no Rio, o candidato de Bolsonaro, sem a plumagem dos
pitorescos, patina.
As pesquisas dos próximos dias dirão qual foi
o efeito da cadeirada de domingo no debate da TV Cultura, e na noite de 6 de
outubro virá o juízo final. O candidato Pablo Marçal é qualificado como
“influenciador”. Trata-se de um vago anglicismo. Na mesma noite, se saberá se
existe bolsonarismo ou se ele é um vagão atrelado a uma locomotiva
conservadora.
O protesto encarnado por Cacareco era muito
mais inteligente. O rinoceronte nunca disse besteira nem foi a debates. Para
quem está a fim de jogar o voto fora, limitando-se a mostrar seu desconforto,
aqui vão duas sugestões de candidaturas, de animais que alegram o Zoológico de
São Paulo:
1 — Pepe é um chimpanzé, maior de idade.
2 — Sininho é uma fêmea de hipopótamo, filha
da falecida Teteia, a decana do pedaço.
Enéas,apesar de folclórico,era um homem preparado.
ResponderExcluir"Enéas disputou três vezes a Presidência da República e chegou a conseguir 1,4 milhão de votos."
ResponderExcluirO colunista não consultou a wikipedia: na segunda eleição presidencial em que participou, Enéas ficou em terceiro lugar, atrás apenas de FHC e Lula, e à frente de Brizola, Quércia e todos os demais! Obteve ali mais de 4,6 milhões de votos!!
https://pt.wikipedia.org/wiki/Enéas_Carneiro