Folha de S. Paulo
Desequilíbrio entre os Poderes dificulta
estabilidade e governabilidade
Sérgio
Abranches escreveu "Presidencialismo de Coalizão: o Dilema
Institucional Brasileiro" durante os trabalhos da Assembleia Nacional
Constituinte, apontando o risco de a nova Carta criar
instabilidade similar à vivida sob a Constituição de 1946. Ambas foram escritas
em contexto de retorno à democracia, com ampliação dos poderes do Legislativo.
Assim como em 1946, a Constituinte combinou voto proporcional para a Câmara com presidencialismo. Uma singularidade, visto que países presidencialistas usualmente têm sistemas majoritários nas eleições legislativas.
A opção pelo voto proporcional, segundo
Abranches, visava contemplar a diversidade e a desigualdade do país, em
especial a forte influência dos interesses locais na política nacional.
A alternativa seria o voto majoritário, que
tende a aglutinar as forças políticas em dois partidos, insuficientes para
garantir representatividade em sociedade heterogênea.
O uso de lista aberta e distritos eleitorais
grandes incentiva a individualização das campanhas e privilegia os interesses
locais e de grupos de pressão.
A consequência seria um número maior de
partidos com assentos na Câmara, o que impedia que o partido do presidente
fosse majoritário. Formar coalizões se tornava inevitável.
Elas tinham que ser amplas, para acomodar
interesses regionais e para garantir quórum qualificado, a fim de barrar
emendas constitucionais indesejadas.
A heterogeneidade fragilizava as coalizões.
Quando a popularidade do presidente caía, as chances de crise entre os Poderes
cresciam. Houve instabilidade de Dutra a Goulart.
O vaticínio de Abranches de que "a Nova
República repete a de 1946" não se concretizou de imediato. A nova Carta
havia dado instrumentos ao Executivo para controlar a agenda e negociar com um
Parlamento pulverizado: medidas provisórias (MPs), vetos presidenciais,
iniciativas privativas em algumas leis, orçamento autorizativo e possibilidade
de negociar o pagamento de emendas em troca de votos.
Somando a isso uma distribuição de
ministérios proporcionalmente às bancadas partidárias, obtinham-se
governabilidade e estabilidade.
Porém, ao longo dos últimos 15 anos, esses
instrumentos do Executivo estão sendo gradativamente enfraquecidos: restrições
às MPs, aumento exponencial e obrigatoriedade de pagamento das emendas
parlamentares, facilidade regimental para derrubada de vetos, crescente uso de
emendas constitucionais para evitar o veto presidencial.
Os grandes partidos (PMDB, PFL e PSDB)
fracionaram-se em diversas agremiações médias. A política nacional se
"paroquializou" e o custo fiscal de formalizar coalizões aumentou,
levando a dívida pública a um nível perigoso.
A barganha política com ministérios e emendas
gera má impressão nos eleitores, diminuindo a legitimidade do sistema político.
Nossa ordem constitucional está cada vez mais parecida com a de 1946
Muito bom, comparações interessantes.
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