Correio Braziliense
O que vem sendo prometido nas campanhas
eleitorais há décadas não foi cumprido! É claro que essa situação gera um misto
de revolta, ceticismo e ressentimento que pode levar ao colapso do sistema
democrático
A partir de 1976, o horário eleitoral
gratuito ficou restrito à apresentação de uma foto do candidato com a locução
em off destacando breves relatos de sua trajetória de vida. Essa regra estava
prevista na Lei nº 6.339/76, conhecida como Lei Falcão, em referência ao
Ministro da Justiça da ditadura no período do governo Geisel.
As limitações dessa lei só foram revogadas em
1984, quando se liberou a propaganda eleitoral na televisão. E em 1997, foi
sancionada a Lei nº 9.504, que passou a regular a propaganda eleitoral no
Brasil até os dias atuais. Desde então, passamos por sete eleições gerais e
seis, no âmbito municipal.
No último dia 30, começou o horário eleitoral
gratuito em todo o país para a eleição municipal que ocorrerá em 6 de outubro.
Durante uma semana, resolvi fazer um exercício: zapear os canais de TV para
verificar o que estava sendo veiculado em alguns municípios na disputa pelas
prefeituras e fazer uma comparação com propagandas de eleições realizadas há
algumas décadas disponíveis no YouTube.
Por mais de 30 anos, praticamente todas as candidaturas têm colocado como prioridades os mesmos temas: saúde, educação, segurança, geração de emprego, transporte e, mais recentemente, meio ambiente. Para cada um deles, as narrativas e propostas apresentadas tiveram pouquíssima variação nesse período.
Para a saúde, a prioridade é "acabar com
as filas nos hospitais", "melhorar o atendimento", "saúde
pública de qualidade". Na educação, o foco continua sendo "melhorar a
qualidade do ensino", "valorizar os professores", "resgatar
o projeto de escola em tempo integral, como era o CIEP". Para a área de
segurança, "combater o crime organizado", "priorizar ações de
inteligência", "investir nas guardas municipais", "trabalhar
em parceria com governos estadual e federal".
Quando falam em geração de emprego, o que
ouvimos é "atrair empresas", "investir em qualificação
profissional", "melhorar o ambiente de negócios", "apoiar o
empreendedorismo". Para transporte, "investir na melhoria do sistema
ferroviário", "ampliar linhas de metrô", "construir BRT e
VLT". Em meio ambiente, o discurso é "investir na prevenção de
desastres", "recuperar as áreas degradadas", "criar
projetos de educação ambiental".
Ou seja, o tempo passou, e o que vinha e vem
sendo prometido não foi cumprido! É claro que essa situação gera um misto de
revolta e ceticismo na população, como presenciamos em alguns momentos na
década de 2010. O primeiro e mais marcante foi o movimento que ficou conhecido
como as jornadas de junho de 2013. Naquela ocasião, sem que houvesse lideranças
orgânicas e estruturadas, uma parcela significativa da sociedade foi às ruas
para protestar "contra tudo e contra todos". O cenário era tão caótico
e surpreendente que governos, legislativos e partidos políticos simplesmente
não sabiam o que fazer.
Da mesma forma que surgiu, o movimento
refreou pouco depois, mas o sentimento continuava latente. E reapareceu com
força em 2016, nas manifestações pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff,
seguindo nos dois anos posteriores em torno do apoio entusiasmado à Lava-Jato.
Esse clima permitiu o surgimento de
personagens que, por convicção e/ou oportunismo, se apresentavam como
antissistema, culminando com a eleição, em 2018, de um parlamentar pertencente
ao chamado baixo clero da Câmara Federal para a Presidência do país e que, por
muito pouco, perdeu a disputa em 2022.
Ainda assim, é evidente a permanência desse
sentimento de ceticismo e revolta acompanhado de outro ingrediente: o
ressentimento. Uma mistura perigosa que pode levar ao colapso do sistema
democrático conquistado a partir de 1985.
É possível reverter tal situação? Diversos
analistas apontam que o caminho a ser trilhado tem como premissa a mudança
radical de postura de lideranças comprometidas com a democracia política,
passando a atuar de maneira clara e transparente para enfrentar duas questões
prioritárias: 1) melhorar, de fato, os serviços públicos, combatendo a
incompetência e a corrupção; 2) apresentar propostas que sejam claramente
percebidas pela população como eficazes para reduzir a insegurança pública,
indo além da constatação do problema ou da mera crítica à política do
"tiro, porrada e bomba".
Ou se muda de verdade, ou continuaremos a ver
o crescimento de figuras populistas que, destilando ódio, surfam nessa onda.
Infelizmente, sou obrigado a reconhecer que, olhando os exemplos dados pela
maioria dos representantes eleitos, estamos cada vez mais propensos a sermos
engolidos por essa onda que pode se tornar um tsunami.
Muito bom! Quando se fala em "combater o crime organizado", isto inclui combater os bolsonaristas e suas milícias? Inclui combater os amigos e companheiros de Marçal e do seu partido associado ao PCC? Inclui combater o chefão Lira e seus cúmplices na Câmara?
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