O Globo
Lula e Bolsonaro sabem que, numa disputa presidencial no Brasil, vale mais o carisma dos candidatos que programas de governo
Já fizemos duas consultas populares sobre o
melhor sistema de governo para o país, uma em janeiro de 1963, outra em abril
de 1993. Nas duas o presidencialismo venceu o parlamentarismo. Não é à toa,
portanto, que o ex-presidente Jair Bolsonaro esnoba as alternativas que se
colocam no campo da direita, e Lula continua imbatível como grande líder da
esquerda. Os dois sabem que, numa disputa presidencial no Brasil, vale mais o
carisma dos candidatos que programas de governo.
A vitória da centro-direita nas eleições municipais recentes demonstra que os partidos dessa tendência estão mais organizados nacionalmente que a esquerda, e Bolsonaro, mesmo tendo evidentemente saído menor desta eleição, continua sendo a melhor opção eleitoral da direita. Errou em São Paulo, quando ficou tentado a apoiar Pablo Marçal e disse que o prefeito Ricardo Nunes, afinal reeleito, não era o seu candidato ideal. O governador Tarcísio de Freitas bancou o prefeito desde o início, ganhou e cacifou-se como principal alternativa na corrida presidencial.
Se Marçal não fosse uma ameaça a sua própria
liderança, Bolsonaro se sentiria mais à vontade o apoiando. Como tem a
desvantagem de estar inelegível — e acredito que dificilmente terá permissão
para concorrer —, muitos candidatos já se apresentam, especialmente
governadores, como Tarcísio em São Paulo, Ronaldo Caiado em Goiás, Romeu Zema
em Minas, Ratinho Júnior no Paraná, Eduardo Leite no Rio Grande do Sul. Mas
Bolsonaro tem uma vantagem: é o único líder popular da direita que pode se
contrapor a Lula. Nenhum outro governador, entre os que podem se candidatar a
presidente em 2026, tem liderança popular.
Embora a polarização não tenha se efetivado
nesta última eleição, a política corre entre esses dois polos, Lula na
esquerda, Bolsonaro na direita. Nenhum deles tem força para eleger um sucessor.
Mesmo Dilma Rousseff era “a mulher do Lula” na campanha presidencial. Até
porque o presidencialismo é muito pessoal, depende menos de projetos ou
programas e mais da figura patriarcal. Historicamente, no Brasil, os candidatos
populistas se elegeram, fossem Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Jânio
Quadros, Fernando Collor.
Desde a redemocratização, só se elegeram
políticos populistas, com exceção de Fernando Henrique Cardoso, que, sem ser
populista de raiz, no entanto, deve duas eleições seguidas ao Plano Real, que
tocou no bolso do brasileiro e mudou sua vida. Os populistas têm muita força no
Brasil, por isso Bolsonaro desdenha seus supostos concorrentes:
— Colocam quantos no aeroporto quando chegam?
— pergunta.
Mas Bolsonaro não tem força para transferir
votos a outros candidatos, como Lula também não.
Se não for candidato à reeleição, Lula não
terá ninguém para pegar o bastão. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é um
líder moderno dentro do PT, mas não tem a popularidade necessária para uma
campanha presidencial, nem influência política para se impor. Com Bolsonaro
inelegível, será difícil para a direita conseguir um substituto com apelo
popular. Caiado acredita que o eleitorado brasileiro amadureceu nesse período
histórico — ele foi candidato a presidente em 1989 — e procurará não um líder
populista, mas um candidato que seja bom gestor.
Caso cheguemos a 2026 sem que apareça uma
novidade populista — sempre lembrando o perigo que representa Marçal —, podemos
voltar várias casas atrás, repetindo a primeira eleição presidencial direta
depois da ditadura, uma campanha com 22 candidatos. Mesmo naquele caso, os três
populistas foram os primeiros colocados: Collor, Lula e Brizola.
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