O Globo
País pode estar no grupo de quem desenvolve
tecnologia adjacente
Talvez não esteja muito claro, mas a gente tem tempo de entrar na era da inteligência artificial. Não seremos, os brasileiros, desenvolvedores da tecnologia. Esse bonde já partiu. Mas o número de países nesse primeiro nível será muito pequeno. Estados Unidos e China, certamente, mais uns dois ou três. Se tanto. Mas há um segundo nível nessa corrida: é quem desenvolve tecnologia adjacente. O Brasil pode perfeitamente entrar nesse jogo. Quem fará as melhores IAs para uso em agricultura? Para exploração de petróleo ou mineração? Ou para preservação de florestas, controle de queimadas? São muitas as áreas em que podemos ser líderes mundiais. A alternativa é sermos meros consumidores. Então, o que é preciso fazer?
O primeiro passo é que precisamos de um
governo ágil. A tecnologia vem sendo desenvolvida muito rápido, não dá para
esperar por 2026. É o governo Lula que
precisa começar a atuar agora. Começa pelo investimento em cérebros. Todo
mestrando em matemática, ciência da computação, engenharia ou disciplinas
correlatas que for aprovado para um doutorado em IA deveria ganhar bolsa
completa financiada pelo Estado brasileiro. Mais incentivos deveriam ser postos
no jogo para que nossas melhores cabeças sejam aprovadas pelas melhores
escolas, a começar pelas universidades de Toronto, Stanford ou MIT. É trabalho
para fazer campanha mesmo. Botar pilha para a rapaziada estudar e retornar para
cá.
O Brasil deveria também abrir suas
fronteiras. Já fomos um país de imigrantes. Seria ótimo se tivéssemos a coragem
de voltar a ser. Trazer gente de fora areja o pensamento, traz novos pontos de
vista, muda a cultura. Abre o panorama. A China é uma ditadura, por certo tem
gente bem formada que gostaria de deixar o país. A Índia é outro canto
do mundo que forma multidões com qualidade. Um programa de vistos permanentes
com emprego nas melhores universidades brasileiras para quem tiver conhecimento
em IA é outro jeito de aumentar o número de cérebros pensantes por aqui. Não
temos as neuras de americanos e europeus com imigrantes. Se não temos, por que
não trazê-los? É hora. Essas mulheres e esses homens que vierem de fora poderão
criar negócios aqui e lecionar em nossas faculdades. Precisamos de cérebros em
quantidade. Alguma hora precisaremos parar de exportar e começar a importar.
Por que não agora? Por que nunca fizemos isso? Por que somos tão fechados ao
mundo?
Não bastam os cérebros sem
infraestrutura. Microsoft, Google,
Amazon e algumas outras companhias gastarão, nos próximos poucos anos, centenas
de bilhões de dólares em parques de computadores para treinamento de IA. Suas
principais dificuldades envolvem três elementos. O lugar para implantar esses
armazéns de processamento precisa ser seguro — sem terremotos, furacões e
outros riscos naturais. Eles precisam também ser alimentados por energia limpa,
e é necessária muita água para refrigeração. O Brasil tem os três. Raros outros
países têm.
Não é difícil atrair esses negócios — só é
preciso abrir mão de alguns dogmas. É preciso que o maquinário possa entrar no
Brasil sem pagar imposto de importação e que não se façam exigências demais de
ceder tecnologia ao país. Porque não precisa. Essas são instalações caríssimas,
que custam bilhões de dólares. Quem instala uma pretende usá-la muito. E
precisará de mão de obra. Se forem engenheiros vindos de fora ou locais, não
importa. É gente com conhecimento de altíssimo nível. Gente que circulará pelas
cidades vizinhas, frequentará os clubes por ali, manterá seus filhos nas
escolas. Ao redor de uma instalação dessas pipocarão negócios relacionados à
IA. Conhecimento atrai conhecimento, negócios atraem negócios.
O último e necessário passo é desenvolver um
grande modelo de linguagem como GPT ou Gemini, treinado primariamente com
textos em português e espanhol. Isso faz muita diferença. Esses modelos são
capazes de emular pensamento sofisticado. Se forem treinados com nossa língua,
poderão trazer resultados mais surpreendentes do que os que nascem falando
inglês. Para isso, o governo já tem um plano que não é mau, ainda mais se for
permitido que o treinamento seja feito por quem já sabe e tem o equipamento. Se
formos depender de uma IAbras, gastaremos muito dinheiro para não ver resultado
nunca.
O Brasil não precisa ser periferia na nova
revolução tecnológica. Há tempo para nos desenvolvermos. Mas precisamos começar
logo.
Perfeito !
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